19 de outubro de 2024

Lei de 2021 assegura prioridade a autistas, mas aplicação ainda enfrenta falhas

Norma aprovada na ALE-RR determina inserção da fita quebra-cabeça, símbolo mundial de conscientização do TEA nas placas de estabelecimentos públicos e privados em Roraima, entretanto, poucos lugares cumprem legislação Fita quebra-cabeça é símbolo reconhecido para identificar pessoas com TEA
Eduardo Andrade/SupCom ALE-RR
A “fita quebra-cabeça”, símbolo reconhecido para identificar pessoas com o Transtorno do Espectro Autista (TEA), está nas placas de atendimento preferencial de estabelecimentos comerciais como bancos, farmácias, supermercados e restaurantes do Estado desde 2021, com a aprovação da Lei 1.547 pela Assembleia Legislativa de Roraima (ALE-RR) e posterior sanção governamental. Até então, o direito era garantido apenas a idosos, gestantes, pessoas com crianças de colo e àquelas com deficiência ou mobilidade reduzida.
A norma é baseada na lei federal de instituição da política nacional de proteção dos direitos da pessoa com autismo e destaca que a acessibilidade e a inclusão são essenciais para evitar desconforto tanto às pessoas com autismo como para seus acompanhantes.
Em algumas situações, a condição pode gerar desorganização e, por esse motivo, os portadores necessitam dessa diferenciação. “Esta é uma forma de colaborar para a inclusão, combatendo a discriminação e o preconceito”, cita trecho da justificativa.
O presidente da Assembleia Legislativa, deputado Soldado Sampaio, enfatizou que a Casa sempre teve a sensibilidade de pautar e aprovar normas que dispõem sobre o direito à inclusão. Ao longo dos anos, foram mais de 20 leis sancionadas em benefício das pessoas atípicas.
Presidente da Casa Legislativa, deputado Soldado Sampaio
Eduardo Andrade/SupCom ALE-RR
“São leis que vão desde o Dia da Conscientização sobre o Autismo, passando pelo direito do portador e de seu acompanhante a ingresso meia-entrada em cinemas, shows, até a criação de sala de integração sensorial para pessoas com TEA, em locais em que circule grade público. Ou seja, são proposições que visam incluir essa parcela em todos os segmentos da sociedade, como forma de garantir não apenas direitos, mas para fazer com que eles se sintam integrantes da população, e que tenham tratamento igualitário, na medida de suas diferenças”, ponderou Sampaio.
Andréia Melo, servidora da ALE-RR, conhece bem essa realidade. Mãe de um adolescente de 15 anos com autismo, ela detalha que percebe a inquietação do filho quando estão em locais com muitas pessoas. “Eu vejo que ele fica incomodado, não gosta, mas como não possui aquele grau em que fica agressivo, aceita ficar no lugar”, salientou.
Andreia percebeu as especificidades autistas do filho ainda pequeno, “devido à demora de ele realizar algumas atividades que são comuns em bebês naquela idade”.
Para Andréia Melo, mãe de um adolescente de 15 anos com autismo, lei é uma vitória
Nonato Sousa/SupCom ALE-RR
“Ele demorou a andar, a ter equilíbrio na cabeça, não fixava o olhar na gente. Foi crescendo e revelando outras características”, relembra, ao contar que, à época, pouco se falava sobre a condição. “Ele vai fazer 16 anos agora em outubro, então, naquele tempo, era um tabu até. As mães tinham aquele preconceito em aceitar o filho com esse diagnóstico. Eu pesquisava muito a respeito do assunto na internet. Tudo o que eu lia, eu via nele. Desde então, ele faz atendimento e terapias.”
Para ela, o atendimento prioritário é uma vitória para os autistas e seus familiares, pois não só essa como as demais normas fazem com que as pessoas entendam e respeitem que os autistas têm necessidades especiais e diferentes dos demais.
“Eles têm suas características, como não gostar de locais movimentados, com muito barulho, independentemente do grau, ficam incomodados. Quem não tem uma pessoa com autismo na família ou próxima não entende, pensa que é frescura ou birra, e isso é muito ruim, pois as mães acabam se privando de fazer as coisas comuns do dia a dia, para ficarem com seus filhos. A gente espera mais leis que os beneficiem em outras áreas”, expressou.
Os portadores de TEA foram inseridos no rol de pessoas com deficiência em 2012, por meio da Lei 12.764, que institui a política nacional de proteção dos direitos desse público. Apesar da condição não ser aparente fisicamente, a carteirinha do autista e o cordão de girassol ou quebra-cabeça foram criados como forma de identificá-los. Andreia Melo conta que, mesmo assim, já deixou de usufruir dos direitos do filho, por medo de ser constrangida por outras pessoas.
“Já aconteceu, até porque ele não usa muito o colar de identificação do autismo. Então as pessoas olham e me perguntam se eu estou grávida ou qual é o problema. Na verdade, elas ainda são muito ignorantes quanto ao tema. É importante que os estabelecimentos coloquem essas placas e nos estacionamentos também, justamente para começarem a compreender, além de termos políticas públicas e mais publicidade sobre a causa”, concluiu.
Conforme Elson Barbosa, gerente de um supermercado localizado na zona Leste da capital, o estabelecimento sempre busca seguir a legislação. A inserção do símbolo autista nas placas de atendimento prioritário foi feita de acordo com o determinado.
Elson Barbosa, gerente de um supermercado localizado na zona Leste da capital
Nonato Sousa/SupCom ALE-RR
“Hoje, possuímos dois caixas com atendimento preferencial e vagas no estacionamento. Não está pintado o desenho no piso, mas temos três vagas destinadas ao público-alvo, próximo à entrada para facilitar para as pessoas. Temos disponível cadeira de rodas. Alguns clientes que vêm aqui com familiares com dificuldade de locomoção pedem e a gente entrega a eles”, informou, complementando que também há o atendimento preferencial na fila do açougue.
O símbolo
O quebra-cabeça é um símbolo que representa a complexidade do Transtorno de Espectro Autista-TEA
Arquivo SupCom
A “fita quebra-cabeça” foi usada pela primeira vez em 1963 e se tornou popular por meio da entidade norte-americana Autism Speaks, atuante na defesa de pessoas com TEA. A ideia é usar o quebra-cabeça para simbolizar as dificuldades de compreensão enfrentadas por quem vive essa condição.
O transtorno afeta o desenvolvimento neurológico e pode ser percebido nos primeiros anos de vida. Entre as características mais comuns estão o atraso na fala, dificuldade de socialização e comportamentos repetitivos. Dados do Centers for Disease Control and Prevention (CDC), órgão ligado ao governo norte-americano, estimam que exista um caso de autismo em cada 110 pessoas. No Brasil, estima-se que há dois milhões de autistas, o que representa 1% da população.
Programa
A sede do Teamarr está localizada na Avenida Santos Dumont, nº 1193, bairro São Francisco. O horário de funcionamento é das 8h às 18h, de segunda a sexta-feira.
Marley Lima/ SupCom ALE-RR
A Assembleia Legislativa apoia e trabalha em causas em prol de crianças, adolescentes, adultos e familiares de pessoas com autismo, através do Centro de Acolhimento ao Autista, o Teamarr, vinculado ao Programa de Atendimento Comunitário. O centro oferta suporte com atendimentos e encaminhamentos de pessoas, além de capacitação de parentes, profissionais da saúde e interessados no tema.

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