27 de dezembro de 2024

Após dois anos em reforma, Cinema São Luiz reabre para o público com 15ª edição do Festival Janela de Cinema do Recife


Um dos poucos cinemas de rua da cidade, o São Luiz foi fechado em junho de 2022, e volta a receber os recifenses nesta sexta-feira (1º). Cinema São Luiz reabre após dois anos de reforma
O Cinema São Luiz, no bairro da Boa Vista, reabre oficialmente para o público nesta sexta-feira (1º), com a 15ª edição do Festival Janela Internacional de Cinema do Recife. O espaço, um dos poucos cinemas de rua restantes na cidade, estava fechado desde junho de 2022 para reparos no forro de gesso, nas instalações elétricas e no sistema de refrigeração (veja vídeo acima).
O serviço teve o valor de R$ 1,3 milhão, com recursos da Lei Paulo Gustavo. Apesar da reabertura, ainda está em andamento, porém, a última fase de obras.
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As recuperações incluem as marquises externas, a instalação de um sistema de prevenção e combate a incêndios, a requalificação dos banheiros com acessibilidade e a instalação de um elevador para os quatro pavimentos superiores.
Também será realizada a recuperação de danos em pisos, tetos, portas, luminárias e no icônico letreiro da fachada. De acordo com a Fundação do Patrimônio Histórico e Artístico de Pernambuco (Fundarpe), a previsão é de que tudo esteja finalizado até junho de 2026.
Esta fase última fase está orçada no valor de R$ 1,9 milhão, também com recursos da Lei Paulo Gustavo.
“A gente já iniciou o projeto da obra de restauração do forro policromado, que permitiu a reabertura, mas, durante a execução da obra do forro, também foi elaborado o projeto de requalificação geral desse equipamento cultural. Então, hoje, a gente está reabrindo o cinema nos finais de semana. Durante a semana, a gente vai continuar com as obras de requalificação.”, afirmou Renata Borba, presidente da Fundarpe.
Janela, afeto e história
Cinema São Luiz após reforma que durou dois anos
Reprodução/TV Globo
O São Luiz vai reabrir, nesta sexta, com a 15ª edição do Janela de Cinema do Recife, festival que ocorre até o dia 8 de novembro, com exibição de filmes também nos cinemas da Fundação Joaquim Nabuco (Fundaj) do Derby, no Centro, e de Casa Forte, na Zona Norte.
A programação conta com lançamentos nacionais e internacionais — incluindo “Ainda Estou Aqui”, de Walter Salles, selecionado pelo Brasil para concorrer a uma indicação no Oscar 2025 — além de clássicos restaurados, sessões com música ao vivo e o retorno da premiação de curtas-metragens nacionais.
Durante os oito dias do evento, o Janela exibirá mais de 100 filmes, entre longas e curtas-metragens, distribuídos em cerca de 55 sessões. Os ingressos custam R$ 5 e estão disponíveis na internet.
Antes de cada sessão, também haverá venda nas bilheterias dos cinemas, a depender da lotação das salas.
Kleber Mendonça Filho no Cinema São Luiz
Reprodução/TV Globo
O Janela Internacional de Cinema é realizado pela Cinemascópio e tem direção artística de Kleber Mendonça Filho e Emilie Lesclaux.
“A ideia do Janela sempre foi, desde o início, apresentar ao Recife um panorama do cinema que está sendo feito no mundo. A gente também tem um carinho muito especial por filmes clássicos, filmes de arquivo, filmes que fazem parte da nossa história e que hoje, com a nova tecnologia, e com o São Luiz bem equipado, a gente tem como reapresentar de uma maneira muito impactante com som e imagem perfeitos”, disse Kleber Mendonça Filho.
Diretor de O som ao redor (2012), Aquarius (2016), Bacurau (2019) e Retratos Fantasmas (2023), Kleber Mendonça Filho comemorou a reabertura do cinema, destacando a importância do espaço para a cultura da cidade e relembrando memórias afetivas com o lugar.
“Minha primeira vinda ao São Luiz foi no início dos anos 1970. Eu tinha 4 anos e vim ver o festival Tom & Jerry com a minha mãe, Joselice. O que ocorre é que, ao longo de tantos anos, isso aconteceu com muitos pernambucanos, muito recifenses. Você continua voltando aqui no São Luiz e o que eu acho que acontece é que você vai amadurecendo junto com a história da sala, né? O São Luiz é sempre aquele espaço que sobreviveu. Tantas salas foram embora no Recife, tantas salas fecharam, foram demolidas ou abandonadas, mas o São Luiz, junto com o Teatro do Parque, foram as duas grandes salas que permaneceram, e eu acho que o pernambucano tem uma relação muito forte com esse lugar”, disse o cineasta.
Fachada do Cinema São Luiz, no Centro do Recife
Reprodução/TV Globo
O Cinema São Luiz é também um dos protagonistas do filme Retratos Fantasmas, lançado pelo diretor em 2023. O filme foi escolhido pelo Brasil para entrar na disputa por um Oscar, mas não foi indicado para a premiação.
“Quando eu fiz Retratos Fantasmas, para mim, não era possível fazer aquele filme e não ter o São Luiz como um personagem principal. Em primeiro lugar, o São Luiz tem muita personalidade, e bons personagens têm personalidade. Em segundo lugar, ele é muito fotogênico. A gente passa em muitos lugares do mundo e muita gente vê o filme e diz ‘eu preciso um dia viajar para o Brasil, ao Recife, para conhecer esse lugar'”, contou.
No ano passado, Kleber Mendonça Filho publicou uma carta aberta à governadora Raquel Lyra (PSDB), relatando a demissão de funcionários do cinema e questionando os projetos do governo do estado para a área da cultura.
“Eu acho que o São Luiz é uma espécie de transporte para a cultura e para o passado da própria cidade, então é como se todo mundo entrasse aqui [no cinema], e isso aqui fosse um grande navio. Ao entrar aqui você vai numa viagem que pode durar duas horas, uma hora e meia, e no final você é devolvido exatamente para onde você tava: o Recife. Talvez a sua visão do Recife mude pelo simples fato de você ter vindo aqui ao cinema São Luiz. É um navio. É um Transatlântico.”
Os rostos por trás da tela
De acordo com a Fundarpe, 65 pessoas trabalharam na obra do São Luiz. Viviane Santos, auxiliar de reparo, foi uma delas. Veio da Bahia para trabalhar na revitalização da estrutura do cinema. Disse sonhar com o dia que voltará ao cinema como espectadora.
“Eu fico feliz por ser de outro estado e estar trabalhando aqui. Ainda mais em uma obra como essa, que é tão importante para cá. As pessoas de Pernambuco dão muito valor para este cinema. [Quando eu vir assistir] vai passar um outro filme na minha cabeça, né? Quando eu chegar aqui e ver tudo prontinho. Eu ajeitei aqui. Eu fiz parte dessa história”, contou.
Luciano Mendes, encarregado de obra, participou do restauro do forro principal. Ele contou que se sente orgulhoso pelo trabalho desempenhado.
“Foi o maior desafio da minha vida até agora. Estar aqui hoje vendo todo o Cinema São Luiz restaurado é de um grande orgulho. Eu sou de Ribeirão, a 95 quilômetros daqui. Eu vim para cá para fazer esse restauro. Uma pessoa do interior nunca imaginou estar hoje aqui no São Luiz participando disso”, finalizou.
Amor de gerações
A prova viva da paixão que perpassa o tempo é a família Santos. São três gerações atravessadas pelo cinema.
“Eu lembro que eu vim assistir Amadeus, eu olhava e as filas eram imensas. O que aconteceu é que eu assisti no chão sentadinha com um amigo. O primeiro filme que eu vi aqui eu não eu me lembro, mas o primeiro das minhas filhas, sim. Eu trouxe elas para cá, foi o primeiro cinema que elas vieram.”, disse Dona Geralda Lima, professora aposentada de 65 anos.
“Mexe muito comigo [a reabertura] porque muitas pessoas que passaram pela minha vida vinham aqui, pessoas amadas, pessoas queridas, pessoas da minha convivência. Nem sempre eu podia vir porque eu trabalhava, estudava e tinha três filhas, mas sempre que eu tinha uma oportunidade, eu vinha.”, completou.
Filha de Dona Geralda, Ana Flávia Santos relembra as memórias da infância.
“Todas as férias nós estávamos aqui no São Luiz para ver Xuxa ou algum filme dos Trapalhões, então a gente sempre estava no cinema. Minha vó Nita sempre trazia nós quatro. É a quarta geração agora que que vem e que frequenta.”, relembrou a arquiteta de 45 anos.
“Eu ouvia muito sobre a beleza daqui e principalmente dessa memória afetiva que elas tinham, principalmente a minha mãe. Quando você vem a primeira vez aqui, você comprova tudo que elas diziam.”, finalizou Yasmin Santos, estudante de 23 anos, filha de Ana Flávia e neta de Dona Geralda.
*Estagiário sob supervisão do editor Pedro Alves.
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