16 de novembro de 2024

MP instaura inquérito para apurar possível interferência política na Vigilância Sanitária em Campinas


Segundo documentos, mudanças na gestão do Devisa teriam sido motivas por suposto descontentamento do secretário de Saúde com apontamento de irregularidades na Policlínica II; pasta nega ingerência e afirma que ‘remanejamentos acontecem em todas as secretarias’. Prefeitura de Campinas
Carlos Bassan/ Prefeitura de Campinas
O Ministério Público de São Paulo (MP-SP) investiga possível interferência política na Vigilância Sanitária em Campinas (SP), após o órgão apontar irregularidades em uma unidade pública de saúde, situação que teria motivado a saída de duas servidoras em cargos de gestão. A Secretaria de Saúde nega ingerência e defende que “remanejamentos internos acontecem em todas secretarias”.
Na portaria que instaurou o inquérito civil, assinada em 7 de novembro, a promotora Cristiane Corrêa de Souza Hillal destaca a necessidade de apurar como está estruturado o departamento, “de forma a se impedir indevida ingerência política ou econômica em prejuízo da sua autonomia”.
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Segundo documento ao qual o g1 teve acesso, as exonerações da então diretora do Departamento de Vigilância em Saúde (Devisa), Andrea Von Zuben, e da coordenadora da Vigilância Sanitária, Cléria Maria Moreno Giraldelo, teriam sido motivadas por suposto descontentamento do secretário de Saúde, Lair Zambon, com uma ação na Policlínica II.
Procurada para comentar o caso, Andrea Von Zuben não quis se manifestar, e o g1 não consegui localizar Cléria.
Já a pasta defendeu que “o Devisa é estruturado conforme legislação municipal” e informou que, “embora até o momento não tenha sido notificada oficialmente pelo MP-SP sobre a abertura do inquérito, está à disposição para prestar todos os esclarecimentos que se fizerem necessários” – leia, ao final da reportagem, o posicionamento na íntegra.
Vigilância na mira
No documento ao qual o g1 teve acesso, Cléria Giradelo relatou que em junho foi informada por Andrea sobre “o descontentamento” do Secretário de Saúde com a condução das ações de Vigilância, sendo a Policlínica II “o último caso”.
Segundo o procedimento do MP, foram apontadas irregularidades sanitárias na Policlínica, mas os problemas não foram detalhados.
Por conta dessa ação, o titular da pasta teria pedido à Andrea a desnomeação de todos os envolvidos no caso, o que foi recusado pela diretora.
Depois, o mesmo secretário teria direcionado o pedido para a desnomeação de Cléria, o que também foi negado pela diretora.
Cléria detalha que também houve cobranças por sua saída do posto após participação no seminário “SUS e os desafios para os próximos 10 anos no município de Campinas”.
Cléria ainda relata que após esses pedidos, “no intuito de dar fim ao impasse”, solicitou sua desnomeação em 27 de junho, “alegando motivo pessoal, em particular, relacionado à sua saúde”.
Após reunião com Zambon em 3 de julho, o secretário teria pedido à Cléria a permanência no cargo até a nomeação de nova diretora do Devisa – em 5 de julho, Andrea Von Zuben foi retirada do posto, sendo nomeada para a chefia do órgão Wanice Silva Quinteiro Port.
Foi somente após conversa com a nova titular do Devisa, que Cléria reiterou o pedido de desnomeação, e teve acertada a mudança após o início de suas férias, em 1º de agosto.
Foto de arquivo de Andrea Von Zuben, então diretora do Devisa, apresentando dados da pandemia da Covid-19 na companhia do secretário municipal de Saúde, Lair Zambon
Carlos Bassan/Prefeitura de Campinas
‘Discordância pela alta direção’
Em outro documento, Andrea Von Zuben informou à promotoria que houve “discordância pela alta direção da Secretaria de Saúde em relação ao procedimento administrativo por um agente sob sua responsabilidade”, e pelo qual havia consentido.
Von Zuben destacou que “sem a possibilidade de entendimento comum, e com discordância com a condução pela autoridade, manifestou a intenção de deixar o cargo de diretora do Devisa”, o que ocorreu em julho.
Ao instaurar o inquérito, Cristiane Hillal também determina que o prefeito reeleito seja oficiado para que tenha ciência do procedimento e apresente proposta para garantir a autonomia do órgão:
“Oficie-se ao Prefeito Municipal reeleito para que tenha ciência deste procedimento e apresente eventual proposta de estruturação do Devisa de forma a garantir, normativamente, e para além de seu mandato, que a gestão do órgão sanitário sempre esteja nas mãos de pessoas com notória competência e experiência compatível com a complexidade das tarefas do órgão, e que elas gozarão de absoluta independência técnica, inclusive em relação ao próprio Prefeito”.
O que diz a Secretaria de Saúde?
Em nota, a Secretaria de Saúde negou ingerência na atuação de profissionais do Devisa, e destacou que as nomeações seguem critérios técnicos e legais, sendo o cargo de direção “de livre provimento e exoneração”, e que “remanejamentos internos de profissionais acontecem em todas as secretarias”.
No posicionamento, a pasta também enfatizou que a nomeação da nova diretora do Devisa “considerou a qualificação técnica e experiência da profissional”, e destacou que Andrea, após deixar o órgão, assumiu cargo ligado à presidência da Rede Mário Gatti.
Veja a nota na íntegra
“A Secretaria de Saúde de Campinas informa que sempre houve reconhecimento da importância do Departamento de Vigilância em Saúde (Devisa) na proteção da saúde pública e em nenhum momento houve ingerência na atuação de profissionais, conforme manifestações feitas diretamente ao Ministério Público do Estado de São Paulo (MP-SP) pelo titular da Pasta, Lair Zambon, durante esclarecimentos iniciais à promotoria de Justiça.
Todas as nomeações são realizadas a partir de critérios técnicos e legais vigentes, com propósito de aprimorar políticas públicas para beneficiar a população. A Pasta ressalta que o cargo de direção é de livre provimento e exoneração, conforme a Lei Complementar 64/2014, em vigor no Município, sobre atribuições de cargos em comissão.
Em 5 de julho, a servidora Wanice Silva Quinteiro Port assumiu a direção do Devisa. Com ampla experiência no SUS, ela foi nomeada, por meio de concurso, médica sanitarista na Prefeitura em agosto de 2012. Wanice fez residência pela Unicamp e tem pós-graduação em Especialização Internacional de Qualidade em Saúde e Segurança do Paciente pela Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz).
O currículo da profissional deixa evidente, portanto, que a Pasta considerou qualificação técnica e experiência para a nomeação.
Já a médica veterinária e epidemiologista Andrea von Zuben, ex-diretora do Devisa de Campinas, assumiu também em 5 de julho a coordenadoria de Informação ligada à presidência da Rede Mário Gatti de Urgência, Emergência e Hospitalar. A autarquia é responsável pela gestão dos hospitais Mário Gatti, Ouro Verde e Mário Gattinho, das unidades de pronto atendimento (UPAs) e do Samu. Portanto, também adota critérios técnicos e legais com objetivo de qualificar os serviços em saúde ofertados à população.
A Secretaria de Saúde esclarece que até este momento não foi notificada oficialmente pelo MP-SP sobre a abertura do inquérito, mas está à disposição para prestar todos os esclarecimentos que se fizerem necessários. Além disso, lembra que a “carta” usada pela promotoria como base para a apuração é uma mensagem apócrifa.
A Pasta destaca, por fim, que remanejamentos internos de profissionais acontecem em todas as secretarias. O Devisa é estruturado conforme legislação municipal.”
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