22 de setembro de 2024

Wolbachia: bactéria inibe transmissão da dengue e outras doenças ao contaminar Aedes aegypti

Descoberto por pesquisador da Fiocruz, método já foi testado em dois municípios fluminenses e deve estar presente em mais seis cidades brasileiras até o fim de 2024. Imagem da bactéria Wolbachia
World Mosquito Program Brasil
Com o início do período das chuvas e das altas temperaturas, o número de casos de dengue, chikungunya e Zika tende a aumentar no Brasil e em outros países com climas tropicais e subtropicais, principalmente em áreas urbanas e semiurbanas.
Mas antes mesmo dos primeiros casos de chikungunya e Zika aparecerem entre 2014 e 2015, um novo estudo para controle de arboviroses já estava em andamento.
Ele consiste na introdução no ambiente de mosquitos Aedes aegypti contaminados pela Wolbachia, uma bactéria presente em aproximadamente de 60% dos insetos no mundo e inofensiva aos seres humanos.
“É uma bactéria que vive dentro da célula do inseto e uma das hipóteses é que haja uma competição por recursos naturais ali porque o vírus precisa da maquinaria da célula pra poder se replicar, mas como a Wolbachia já está lá, ele não consegue o material para fazer essa replicação”, explica o líder de relações institucionais da World Mosquito Program (WMP) Brasil, Diogo Chalegre.
Em laboratório, a equipe de cientistas conseguiu introduzir a bactéria, que foi retirada da mosca-da-fruta, dentro dos ovos de Aedes aegypti. Assim, foi comprovado que quando ela está presente no mosquito, o vírus da dengue não se desenvolve bem e tem sua transmissão reduzida. Tempo depois, o experimento se mostrou igual para os vírus da chikungunya e Zika.
Agente realiza soltura de mosquitos com Wolbachia em Niterói (RJ)
Fábio Maciel
De acordo com Diogo, a bactéria está presente também em borboletas, formigas e abelhas. Borbojos ou carunchos, aqueles bichinhos que aparecem no feijão velho, eles têm naturalmente a Wolbachia. “A gente brinca que quase todo mundo já comeu uma Wolbachia na vida”, diz ele.
“Só que o Aedes aegypti não tem a bactéria naturalmente, então ela foi inserida nos ovos se adaptou bem. A transmissão é feita de forma materna, então toda mãe que tem a bactéria vai passá-la para os filhotes, e é por isso que o método também é autossustentável”, completa.
A descoberta foi feita pelo pesquisador da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz) Luciano Moreira que, em 2011, iniciou discussões com o Ministério da Saúde (MS) para incluir a nova alternativa nas estratégias brasileiras de enfrentamento à dengue.
Solturas de ‘Wolbitos’
Com financiamento do Ministério da Saúde e da Fundação Bill & Melinda Gates, além da aprovação de órgãos regulatórios federais, entre 2014 e 2015 foram executados projetos pilotos em dois bairros nas cidades do Rio de Janeiro e Niterói: Tubiacanga e Jurujuba, respectivamente.
Segundo a Fiocruz, os casos confirmados de dengue caíram de 158 (no ano de implantação do projeto, em 2015) para 55 (em 2023). Houve ainda redução de 60% dos casos de chikungunya e 40% de zika, em comparação a áreas que não receberam os Aedes aegypti com Wolbachia.
Insetário de biofábrica no Rio de Janeiro
Flávio Carvalho/WMP Brasil
“Atualmente, as cidades de Campo Grande (MS), Belo Horizonte (MG) e Petrolina (PE) já têm projetos também. Este ano, vamos começar novos nos municípios que o MS elencou: Joinville (SC), Foz do Iguaçu (PR), Londrina (PR), Presidente Prudente (SP), Uberlândia (MG) e Natal (RN)”, afirma o porta-voz da WMP Brasil.
A expectativa da fundação é que cerca de 1,7 milhão de pessoas serão beneficiadas pela soltura dos “Wolbitos”, nome dado aos ovos do mosquito que carregam a bactéria Wolbachia.
Embora tenha obtido resultados suficientes para aprovação pelo MS, o porta-voz ressalta que o método Wolbachia é complementar a outras ações de enfrentamento das arboviroses, como a vacina que vem sendo disponibilizada no SUS e ações como aplicação de pesticida, trabalho pesquisa dos agentes e dispersão de criadouros pelos municípios e pela população.
Até o fim de 2025, o programa deve ampliar sua capacidade de atendimento aos municípios por meio da construção de uma nova biofábrica de Wolbitos em Curitiba (PR). Segundo a Fiocruz, ela terá deverá produzir cerca de 100 milhões de ovos por semana.
Primeiras solturas de mosquistos foram realizados no estado do Rio de Janeiro
Flávio Carvalho/WMP Brasil
Recordes de dengue
Na última quarta-feira (3), o Brasil registrou 1.020 mortes pela doença e 2.671.332 casos nas primeiras 13 semanas de 2024, segundo o Painel de Arboviroses do Ministério da Saúde. No mesmo período do ano passado, o o país acumulava 388 mortes.
LEIA TAMBÉM
Aquecimento global leva a dengue a países do Hemisfério Norte e Europa, dizem estudos
Brasil passa de mil mortes por dengue em 2024 e se aproxima de recorde histórico
Em fevereiro, a a secretária de Vigilância em Saúde do Ministério da Saúde, Ethel Maciel, afirmou que a estimativa do Ministério da Saúde é que o país registre, neste ano, 4,2 milhões de casos.
Comunicação comunitária
Uma parte importante da execução das solturas são os grupos comunitários de referência. Antes das liberações de Wolbitos, é formado um grupo com lideranças sociais do bairro para atuar como comitê consultivo, que pode sugerir, acompanhar, deliberar ações e tirar dúvidas sobre o projeto
“Essa etapa é fundamental para que a população fique ciente do que vai ser realizado em campo, para ninguém ser surpreendido com um carro liberando mosquitos, ou ver um potinho numa árvore e não saber o que tem nele. Então, desde o engajamento até a entrega final do projeto, a gente mantém esse grupo com reuniões mensais”, comenta Diogo Chalegre.
VÍDEOS: Destaques Terra da Gente
Veja mais conteúdos sobre a natureza no Terra da Gente
Veja mais conteúdos sobre a natureza no Terra da Gente

Mais Notícias