9 de janeiro de 2025

Tabarana desaparece dos rios do Ceará


Abundante em região nordestina, espécie dificilmente é encontrada. Pesquisadores buscam respostas para tentar reverter a situação Tabarana está desaparecida há décadas do Ceará
Douglas Lopes/iNaturalist
O rio Jaguaribe tem aproximadamente 630 quilômetros de extensão. Nasce no município de Tauá, interior do Ceará, e deságua no Oceano Atlântico. É considerado o maior rio intermitente do mundo e um dos mais importantes do Nordeste.
No período de seca entre setembro e dezembro, quando para de correr, os peixes sobrevivem em poças temporárias. Elas se formam em lugares mais profundos do leito e armazenam água até as próximas chuvas. Mas o aumento da temperatura causada pelas mudanças climáticas globais, está afetando a vida dos peixes nessa região do Brasil. Aliás, alguns famosos no passado não tem sido mais vistos.
É o caso da espécie Salminus hilarii , conhecida como jatubarana do Ceará, tabarana, tubarana ou “dourado-branco”, que tem causado preocupação entre os especialistas. Coodernador do Instituto Peixes da Caatinga e pesquisador do Programa de Pós-Graduação de Ciências Biológicas da Universidade Federal da Paraíba Telton Ramos explica que a tabarana era encontrada em grande quantidade nos idos da década de 1940. Além da bacia do Jaguaribe, a espécie também ocorre nas bacias do São Francisco e do Alto Paraná.
Rio Jaguaribe, no Ceará
Telton Ramos
O professor obteve dados do DNOCS (Departamento Nacional de Obras contras as Secas) que apontam a pesca de 3700 exemplares de tabarana entre os anos de 1943 e 1947. No entanto, desde 2009, quando Ramos começou a fazer expedições pelo rio Jaguaribe, nunca conseguiu coletar um indivíduo dessa espécie.
O Salminus hilarii é carnívoro, se alimenta de outros peixes. Uma característica é que precisa migrar para a reprodução que ocorre nas partes altas das bacias hidrográficas. Esse peixe é indicador de integridade ambiental, já que exige alta qualidade do ambiente para sobreviver. Geralmente é encontrado em água limpa e de corredeira ou cachoeira, rica em oxigênio, vivendo em cardumes.
O que então explicaria o fato da tabarana não ser mais vista no Ceará? “Dados pretéritos mostram que a espécie era abundante e utilizada na pesca. A pesca pode ter sido um dos fatores antrópicos (causados pelo ser humano) responsáveis pela possível extinção dessa espécie, associada aos fatores como barramentos, poluição e assoreamento. Mas não podemos esquecer que a redução ou desaparecimento dessa espécie pode estar ligado às mudanças climáticas, pois o rio Jaguaribe é um rio intermitente, ou seja, no período de seca ele para de correr ficando os peixes acumulados, geralmente, nas poças temporárias”, ressalta o pesquisador.
A espécie tabarana sofre com as mudanças climáticas e também com a pesca
Gilberto Salvador
Ramos conversou com pescadores mais antigos que disseram não encontrar a tabarana há cerca de vinte anos. Eles apontaram onde colocavam as redes e o local chamou a atenção, já que eram armadas justamente nas áreas de correnteza. Alguns pescadores mais jovens, alegam nem conhecer a espécie.
Ainda não é possível decretar a extinção desse peixe no Ceará, porque seria necessária uma avaliação oficial do ICMBIO. Mas para o Instituto Peixes da Caatinga, a situação é de uma possível extinção local, já que a espécie não é pescada há décadas. Os especialistas esclarecem que existe a possibilidade de tentar reverter a situação. Porém, o processo é lento e complexo.
Nós ainda temos uma pequena esperança de encontrar uma população da jatubarana do Ceará. Sendo encontrada, a ideia é pegar alguns exemplares para estudar, tentar reprodução em cativeiro. Conseguindo reproduzir em cativeiro, soltaríamos exemplares na bacia para tentar repovoar. No entanto, mesmo assim, não saberíamos se elas conseguiriam se reproduzir no rio Jaguaribe devido às barragens e outros problemas do rio
Local de pesquisa no Rio Jaguaribe, no Ceará
Talton Ramos
Desde 2019, o pesquisador junto com outros colegas da Universidade Federal da Paraíba têm avaliado os impactos da transposição do rio São Francisco. O projeto prevê a construção de dois canais nos eixos norte e leste para levar água às regiões de semiárido do Nordeste. Em 2024, as obras estavam com quase 80% de conclusão. Ramos notou por meio de estudos que a transposição trouxe impactos ambientais como o aumento de populações de parasitas em peixes, assim como introdução de novas espécies no rio Jaguaribe.
“Como essa espécie Salminus hilarii ocorre em outras bacias, portanto, tem ampla distribuição, ela não está como ameaçada nem na lista Nacional (ICMBIO, 2022), nem na lista Internacional (IUCN, 2024). Porém, levarei nossas informações para as próximas avaliações do ICMBIO, para que seja melhor avaliada a situação no Jaguaribe. No entanto, essa espécie entrará como CR (Criticamente Ameaçada de Extinção) na lista de espécies de peixes continentais ameaçados do Ceará que está sendo elaborada”, conclui Ramos.
A tabarana entrará como CR (Criticamente Ameaçada de Extinção) na lista de espécies de peixes continentais ameaçados do Ceará que está sendo elaborada.
Paulo Augusto/TG
A jatubarana do Ceará que no século passado era um dos símbolos do Jaguaribe tende a não mais ser vista. Vai sumindo, como o leito do rio nos períodos de seca.
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