Doze idosos perderam ou ficaram com a visão comprometida após procedimento oftalmológico. Sala de esterilização de equipamentos tinha inadequações, diz prefeitura. Secretaria de Saúde de SP apura o caso. Pacientes relatam terem ficado cegos após mutirão de cirurgias em Taquaritinga
Doze pacientes que participaram de um mutirão de cirurgia de catarata no Ambulatório de Especialidades Médicas (AME) em Taquaritinga (SP) ficaram cegos ou com a visão comprometida.
As cirurgias foram feitas no dia 21 de outubro do ano passado e, até agora, eles não sabem o que provocou os danos à visão.
Em nota, a Secretaria de Saúde de Taquaritinga informou que os pacientes tiveram complicações pós-cirúrgicas oftalmológicas. Em uma visita técnica, membros das vigilâncias sanitárias estadual e municipal identificaram inadequações na Sala de Materiais para Esterilização (SME) do AME. A área está interditada.
A secretária executiva da Saúde do Estado de São Paulo, Priscilla Perdicaris, classificou o caso como “fato isolado gravíssimo” e disse que uma investigação apura as causas para a adoção de providências. Segundo Priscilla, toda a equipe médica envolvida no mutirão foi afastada das funções.
Os laudos das análises feitas no AME devem ficar prontos em 15 dias.
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Perda total do olho operado
O pintor Carlos Augusto Rinaldi, de 66 anos, morador de Santa Ernestina (SP) conta que, há um ano, operou o olho direito no AME. O procedimento foi bem sucedido assim como sua recuperação.
O pintor Carlos Augusto Rinaldi perdeu a visão do olho esquerdo após passar por cirurgia de catarata no AME de Taquaritinga, SP
Valdinei Malaguti/EPTV
Em outubro de 2024, ele e mais 23 pessoas foram atendidos em um mutirão no AME de Taquaritinga. Logo após passar pelo procedimento no olho esquerdo, começou a sentir dores e sentiu que a visão piorou.
Na consulta pós-operatório, ele reclamou da visão embaçada para a médica, mas, segundo ele, a profissional disse que a situação era normal e que os sintomas desapareceriam em dois ou três meses.
“No segundo dia pós-cirurgia, a médica constatou que estava tudo normal e não estava. Ela era uma especialista e já deveria ter falado. Aí foram segurando a gente, enganando. Daqui um mês, dois meses, pode a visão ir voltando. Passaram um mês, dois meses, três meses, e nada.”
Com o agravamento da situação, Carlos ficou cego do olho esquerdo. O diagnóstico veio em janeiro deste ano após ser encaminhado pelo próprio AME para tratamento especializado em uma clínica em Araraquara (SP).
“Não tem como fazer mais nada”, diz Carlos sobre o quadro irreversível.
‘Mais nada a fazer’
A salgadeira Maria de Fátima Garcia Chiari, que mora em Matão (SP), teve um quadro ainda pior. Ela alega que após meses aguardando a visão voltar por orientação de médicos do AME, não só parou de enxergar do olho direito como quase perdeu o globo ocular.
“Com o passar dos dias, eu comecei a ver uns vultos e ficou nisso até o dia que eu perdi a visão totalmente. No dia 31 de dezembro, eu comecei a perder a visão. No dia 1 [de janeiro deste ano] ficou tudo cinza e quando foi no dia 2, estava tudo preto.”
A salgadeira Maria de Fátima Garcia Chiari ficou cega do olho direito após passar por cirurgia de catarata no AME de Taquaritinga, SP
Valdinei Malaguti/EPTV
Maria de Fátima diz que foi diagnosticada com uma infecção por bactéria que acabou atacando o globo ocular. Ela também foi encaminhada pelo AME à clínica em Araraquara e precisou passar por um transplante de córnea para salvar o olho, mas não enxerga mais.
“O dia que eu cheguei lá [no AME] sem visão, que foi uma médica que é retinóloga que me atendeu, ela olhou e viu que não tinha mais visão. Ela falou: ‘não tenho mais nada para fazer’”, lembra.
A salgadeira lembra que vários pacientes que passaram pela cirurgia no mesmo dia que ela relatavam dores intensas após o procedimento, mas mesmo assim as operações continuaram sendo feitas.
Em novembro de 2024, após o agravamento do quadro dos pacientes, uma reunião foi realizada entre os 12 pacientes afetados e o AME. De acordo com os idosos, eles foram encaminhados para serviços de referência em oftalmologia na Santa Casa de Araraquara e no Hospital das Clínicas (HC) de Ribeirao Preto (SP), onde parte deles recebeu a notícia que a situação era irreversível.
Em nota, a Prefeitura de Taquaritinga informou que todos foram inseridos na fila de transplante de córnea.
AME de Taquaritinga, SP
Valdinei Malaguti/EPTV
O que diz a Saúde?
Nesta sexta-feira, a secretária executiva de Saúde do Estado de São Paulo disse o governo do estado só tomou conhecimento dos casos em janeiro por meio da Santa Casa de Franca, que é a Organização Social (OS) responsável pela administração do AME de Taquaritinga.
“O fato está sendo apurado. Tão logo nós soubemos pela OS que gerencia essa unidade, nós enviamos a nossa equipe de Vigilância Sanitária e enviamos a equipe da Controladoria de Gestão de Serviços em Saúde, que faz a coordenação dos AMEs no estado, para um levantamento detalhado de tudo o que pode ter acontecido na cirurgia.”
Ainda à espera dos laudos para avaliar as medidas necessárias e sem dar detalhes, Priscilla Perdicaris disse que a sala onde é feita a esterilização dos equipamentos passou por adequações. Todas as cirurgias feitas no AME de Taquaritinga estão suspensas.
A secretária disse que os pacientes estão recebendo medicação, atendimento médico e multidisciplinar para que possam restabelecer a qualidade de vida.
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