24 de setembro de 2024

Maioria do STF vota para aplicar ‘repercussão geral’ no debate sobre direito de mulher trans em receber pensão do pai militar

Ministros analisam a questão no plenário virtual. Maioria considerou que o caso tem relação com direitos previstos na Constituição. Com isso, Corte vai elaborar ‘guia’ para orientar disputas semelhantes nas instâncias inferiores da Justiça. A maioria dos ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) votou para aplicar o sistema de repercussão geral a um processo que trata do direito de uma mulher trans, filha solteira de um militar, de receber a pensão do pai (leia mais abaixo).
Na prática, o tribunal entendeu que deve adotar a repercussão geral para o caso. Com isso, o tema será analisado futuramente pela Corte, que vai definir o direito e elaborar uma orientação a ser aplicada em ações semelhantes na Justiça.
O julgamento começou na última sexta-feira (12), no plenário virtual, ambiente eletrônico de deliberações. Está previsto para acabar na próxima sexta-feira (19), se não houver pedido de vista (mais tempo de análise) ou de destaque (leva o caso para julgamento presencial).
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Prevalece o voto do relator, o presidente do STF, ministro Luís Roberto Barroso, pelo reconhecimento de que o tema tem repercussão geral. Seguem nesta linha os ministros Edson Fachin, Dias Toffoli, Cármen Lúcia, Alexandre de Moraes e Gilmar Mendes.
Recurso
Os ministros analisam uma disputa judicial envolvendo uma mulher transexual, filha de um militar da Marinha, que morreu em 1998.
A pensão do pai foi concedida quando ela quando era menor de idade, aos 11 anos. Até então, sua documentação tinha o nome anterior, no sexo masculino. Em 2008, com a maioridade aos 21, o benefício foi encerrado.
Posteriormente, ela obteve uma decisão da Justiça que permitiu a mudança do nome e dos documentos, para adequá-los à sua identidade de gênero.
O processo, nesse sentido, tinha sido apresentado em 2012. Até então, a única via para obter a mudança era judicial. A decisão do Supremo, que permitiu a mudança no registro civil para transgêneros em cartório, só ocorreu em 2018.
O pedido para manter o pagamento foi negado nas instâncias inferiores da Justiça, sob o argumento de que, na época da morte do pai — o que gerou o direito à pensão — ela não havia alterado o seu registro civil.
O caso chegou ao Supremo após o recurso da defesa da filha do militar, que argumentou que a negativa do direito afeta princípios constitucionais, como a dignidade da pessoa humana, igualdade e a promoção do bem de todos, sem preconceito e discriminação.
Para os advogados, a pensão deveria ser assegurada a todas as filhas maiores solteiras, independentemente do momento em que o Poder Público passou a reconhecê-la como pessoa do gênero feminino.
O que está em discussão
O processo debate a seguinte questão: para receber uma pensão de militar na condição de filha maior solteira, uma mulher trans deve ter feito a mudança do registro civil antes de ter direito ao benefício?
Para o presidente Luís Roberto Barroso, relator do caso, a questão envolve os impactos da mudança dos documentos de pessoas trans sobre o exercício de direitos.
“A discussão diz respeito aos efeitos do ato de alteração de registro civil sobre direitos da personalidade e sobre o acesso a direito social. Trata-se de matéria que transcende os interesses específicos das partes deste processo, alcançando a definição da extensão da proteção constitucional da seguridade social às pessoas transexuais”, afirmou.
Plenário virtual
Neste primeiro momento, os ministros avaliam se a questão colocada no processo tem relação com as previsões da Constituição. Se houver maioria nessa linha, em um segundo momento o caso vai a julgamento, em data a ser marcada.
Barroso concluiu que o tema deve ser analisado pelo Supremo, a partir do que prevê a Constituição. Além disso, pontuou que há diferentes entendimentos sobre a questão em julgamentos nas instâncias inferiores.
“A existência de interpretações diversas sobre os efeitos e a natureza do ato de alteração de registro por pessoas transexuais para fins previdenciários evidencia a relevância jurídica da controvérsia. Mais além, o conflito potencial entre, de um lado, a segurança jurídica e, de outro lado, a tutela do direito à igualdade e ao direito ao reconhecimento dos transexuais, demonstra a natureza constitucional da questão submetida ao Supremo Tribunal Federal. Trata-se de matéria com repercussão geral, sob todos os pontos de vista (econômico, político, social e jurídico), em razão da relevância e transcendência dos direitos envolvidos”, pontuou.

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