Em audiência na Alesp, deputado estadual Eduardo Suplicy (PT) questionou o secretário Guilherme Derrite sobre abusos durante ação de policiais no litoral; neste ano já foram registradas 39 mortes. Guilherme Derrite durante Comissão de Segurança Pública na Alesp
Reprodução/Alesp
O secretário da Segurança Pública do estado de São Paulo, Guilherme Derrite, afirmou nesta quarta-feira (6) que não reconhece excessos na ação da Polícia Militar na Baixada Santista durante a Operação Escudo e a Operação Verão entre 2023 e 2024.
A afirmação ocorreu após Derrite ter sido questionado sobre denúncias de abusos por parte de policiais pelo deputado estadual Eduardo Suplicy (PT) durante audiência da Comissão de Segurança Pública da Assembleia Legislativa de São Paulo (Alesp).
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“Importante deixar claro que nenhum órgão correcional das polícias, Corregedoria da Polícia Militar, Corregedoria da Polícia Civil, recebeu qualquer denúncia, qualquer informação, qualquer relato oficial, de que houve abuso das forças policiais. Caso isso aconteça, com total transparência e absoluta certeza, isso será investigado”, afirmou Derrite.
“Então, para nós, enquanto são relatos, que são, claro, publicizados pela imprensa, mas que são falados por parte dos moradores, a gente não pode, através de um relato informal, uma denúncia anônima, instaurar procedimento sendo que os dois órgãos correcionais da PM e Polícia Civil não receberam nenhum tipo de denúncia.”
E complementou: “Por isso, é óbvio, que não reconheço nenhum excesso até que se chegue oficialmente às forças policiais”.
A Operação Escudo começou em 28 de julho de 2023 e foi finalizada, temporariamente, em 5 de setembro do ano passado, deixando 28 mortos. Retomada no início deste ano como Operação Verão, a ação já matou 39 pessoas no litoral paulista.
Suplicy ainda questionou Derrite sobre a denúncia de que policiais militares estariam indo a enterros de pessoas mortas pelos agentes.
Um vídeo enviado à GloboNews mostra policiais militares em um cemitério em Santos, no litoral paulista, durante enterro de um dos mortos por agentes na Operação Verão no dia 15 de fevereiro.
Nele, é possível ver dois agentes andando próximo ao local do sepultamento e, um pouco mais distante, um terceiro policial e uma viatura da PM. Ele fica parado, olhando em direção aos familiares e amigos da vítima (veja abaixo).
Derrite afirmou que não tinha conhecimento sobre o caso. “Volto a dizer que se algum relato formal for feito, vamos tomar providências.”
VÍDEO mostra policiais em enterro de morto por agentes na Operação Verão
Câmera corporal
O secretário também foi questionado sobre o uso de câmeras corporais por policiais após um estudo da Fundação Getúlio Vargas (FGV) apontar que houve redução de 57% da letalidade policial com o uso do equipamento e afirmou que as câmeras “inibem” a atuação dos agentes.
Operação Escudo em fevereiro de 2024
Reprodução/Redes Sociais e Carlos Abelha/TV Tribuna
“Primeiro, sobre o estudo. A gente utiliza a nomenclatura internacional, adotada pela ONU, de ‘letalidade criminal’ e não ‘letalidade policial’. Porque é uma menção que soa como pejorativa, parece que o policial sai para a rua querendo matar. Não é a realidade.”
“Então, quando fala da queda de 57% da letalidade após a utilização dos equipamentos, são alguns fatores que têm que ser analisados. Primeiro ponto, eu respeito muito o estudo que foi realizado, os pesquisadores, e o período que foi analisado. Porque no período em que foi realizado, no período da vigência da pandemia, não é que reduziu o indicador criminal, reduziu a movimentação global.”
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Derrite ainda afirmou: “O segundo ponto é que a utilização da câmera corporal em unidades policiais, tem estudos publicados sobre isso, não é que ela reduziu a letalidade, ela reduziu todos os números. Ela reduziu número de prisões, de apreensões de armas, de abordagens, uma série de coisas que nos levam a crer que inibiu a atividade policial”.
“Mantivemos o programa das câmeras corporais. O que nós fizemos, e foi muito inovador, colocamos tornozeleira no criminoso. Foram 200 vindas da SAP e mais 800 contratadas por nós, e o governador vai divulgar mais mil. São tecnologias distintas, mas que trouxeram redução de homicídios.”
Ao ser questionado sobre as 316 mortes por policiais em 2023, apontada no estudo, o secretário enfatizou que os policiais não mataram, mas sobreviveram a 315 entreveros.
“Posto isso, dizendo [o estudo] até que agentes mataram 316 pessoas. Eles não mataram, eles sobreviveram a entreveros até que se prove ao contrário, até que se tenha trânsito em julgado. Eu acredito nos meus policiais, confio na atuação legítima do policial que usa do último recurso que ele tem, a arma de fogo. O maior interessado que nenhum confronto aconteça sou eu.”
Baixada Santista concentra 34% das mortes por intervenção policial
Operação Verão havia deixado 39 mortos até a última terça-feira (29).
Carlos Nogueira/TV Tribuna e Carlos Abelha/TV Tribuna
Um levantamento da Defensoria Pública do Estado de São Paulo aponta que 34% das mortes por intervenção policial no estado de janeiro e 1º fevereiro ocorreram na Baixada Santista.
Conforme relatório obtido pelo g1 Santos nesta quarta, 16 dos 47 registros foram nas cidades de Cubatão, Guarujá, Santos, São Vicente e Praia Grande.
Os números foram extraídos do portal da SSP e consideram apenas as mortes praticadas por policiais em serviço.
Com base no documento, a Defensoria considera que a porcentagem evidencia um “uso desproporcional” da força nessas operações.
Primeira fase da Operação Escudo
Dois policiais militares que participaram da primeira fase da Operação Escudo, no litoral paulista, no ano passado, respondem por homicídio duplamente qualificado (motivo torpe e recurso que impossibilitou a defesa da vítima).
O Ministério Público de São Paulo denunciou os agentes, e a Justiça acatou a denúncia. Assim, os PMs vão responder ao processo como réus.
Dois policiais militares se tornam reús por homicídio qulificado durante a Operação Escudo, no litoral paulista
A denúncia traz imagens de câmeras de segurança que, de acordo com os promotores do caso, mostram o assassinato de Rogério de Andrade Jesus, morto com um tiro de fuzil na manhã do dia 30 de julho.
O Conselho Nacional de Direitos Humanos (CNDH) reuniu ao menos 11 relatos de violações dos direitos humanos durante a primeira fase da operação.
Testemunhas relataram casos de execução, pessoas de outras regiões sendo levadas para serem mortas onde ocorria a operação, invasão de casas, omissão de socorro médico, ausência de câmeras ou identificação nas fardas, morte de moradores de rua, entre outros (veja os onze 11 relatos abaixo).
No relatório, o Conselho narra que, com a ajuda da líder das Mães de Maio, Débora Maria da Silva, conseguiu contato com familiares das vítimas da operação, testemunhas e líderes comunitários, que foram ouvidos no dia 14 de agosto.
Em encontros em Santos e no Guarujá, os conselheiros recolheram os 11 relatos de violações dos direitos humanos.