Família de Francisco Araújo mora no bairro Seis de Agosto, em Rio Branco, e se mudou para dentro de uma embarcação com chegada das águas. Francisco Araújo se mudou com a filha e o neto pequeno para dentro de um barco durante enchente
Quésia Melo/Rede Amazônica Acre
A enchente do Rio Acre já tirou quase 5 mil pessoas de casa na capital acreana. Uma dessas famílias é a do aposentado Francisco Silva Araújo, que se mudou com dois parentes para um barco ancorado em frente de sua casa, no bairro Seis de Agosto, em Rio Branco.
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Assim como milhares de moradores das regiões afetadas, Francisco Araújo viu a água entrando na casa da noite pro dia e precisou tomar uma decisão para salvar os pertences. Inicialmente, começou elevando os móveis dentro de casa, mas, com a água subindo a cada hora, uma nova solução teve de ser encontrada.
Quatro mil pessoas estão desalojadas por causa das cheias dos rios no Acre
Ao perceber que o nível do rio não iria baixar logo, já que a capital acreana enfrenta a segunda maior cheia de sua história, Francisco decidiu se mudar com a família para dentro de um barco, que pertence a eles, e ficar no local para proteger os bens de possíveis furtos.
Uma equipe da Rede Amazônica Acre estava no bairro Seis de Agosto quando viu Francisco e a família dentro da embarcação e resolveu parar para conhecer um pouco da história deles. Tímida, a filha do aposentado não quis falar.
“Foi meio difícil, fomos subindo os móveis e a água veio acompanhando. Quando chegou no teto, passamos para o batelão e estamos pedindo que a água baixe”, contou.
O nível do Rio Acre alcançou a marca de 17,86 metros na medição na tarde desta quarta-feira (6). São 48 bairros e 18 comunidades rurais atingidos pela cheia em Rio Branco e, ao todo, mais de 4,6 mil pessoas precisaram deixar suas casas, segundo a prefeitura da capital.
A capital está a menos de 55 centímetros da maior cota histórica já registrada, que é de 18,40 metros em 2015, desde que a medição começou a ser feita em 1971. Em 2015, mais de 100 mil pessoas foram atingidas pela enchente e o governo decretou situação de emergência e estado de calamidade pública, que foram reconhecidos pelo governo federal. O manancial ficou 32 dias acima da cota de alerta, que é de 13,50 metros.
Em todo o estado pelo menos 27.434 pessoas estão fora de casa, dentre desabrigados e desalojados, segundo a última atualização feita pelo governo nesta terça (5). Além disso, 19 das 22 cidades acreanas estão em situação de emergência por conta do transbordamento de rios e igarapés. Ao menos 23 comunidades indígenas no interior do Acre também sofrem com os efeitos das enchentes e quatro pessoas já morreram em decorrência da cheia.
Dificuldades
Ainda segundo o morador, a vivência dentro de um barco está sendo difícil pela falta de estrutura adequada. Durante à noite, a família não consegue dormir direito por conta do calor, dos insetos e a preocução com invações.
“A gente almoça e toma café aqui. Vamos levando na expectativa de que baixe logo. Nossa expectativa é essa”, resumiu.
Cheia na capital
Nessa segunda (4), uma comitiva do governo federal chegou ao Acre para dar assistência aos atingidos pela cheia. Vieram, entre outros, o ministro de Desenvolvimento Regional, Waldez Góes e a ministra do Meio Ambiente, Marina Silva.
Em entrevista coletiva, o ministro de Desenvolvimento Regional disse que as ajudas humanitárias ao estado devem superar os R$ 30 milhões que foram enviados no ano passado, quando o Rio Acre e igarapés transbordaram na capital.
Ministros da Integração e Desenvolvimento Regional, Waldez Góes, e a ministra do Meio Ambiente, Marina Silva, chegaram ao Acre na segunda-feira (4)
Neto Lucena/Secom
“Temos que considerar depois o restabelecimento, reconstrução de muitos ambientes que estão sendo perdidos e trabalhar a questão da adaptação, que a ministra Marina conduz esse projeto que é muito importante, tem o Fundo Clima que ela vai se referir, tem valores da adaptação climática”, destacou Waldez Góes.
A ministra Marina Silva destacou que eventos como as enchentes são agravadas por alguns fatores: desmatamento, assoreamento de rios e a mudança do clima.
“Por isso estamos trabalhando um plano estruturante, são nove ministérios trabalhando para que a gente possa dar uma resposta junto com os estados mais ponderáveis e os municípios mais ponderáveis. E, obviamente, a principal ação é enfrentar a causa do problema: desmatamento, que aumenta a temperatura da terra, faz com que a haja o assoreamento dos rios e também faz com a gente tenha cada vez mais esses eventos”, confirmou.
Em edição extra do Diário Oficial do Estado (DOE) de sexta-feira (1º), o governo do Acre declarou emergência em saúde pública no estado em razão da cheia dos rios e o volume das chuvas que atingem 19 municípios do estado, desde o dia 21 de fevereiro. O decreto tem vigência de 180 dias.
Somente nos abrigos mantidos pela Prefeitura de Rio Branco, no Parque de Exposições e escolas, são cerca de 4,6 mil pessoas desabrigadas, segundo a Defesa Civil Municipal:
Parque de Exposições Wildy Viana: 800 famílias, mais de 4 mil pessoas
Escolas da capital: 184 famílias em 10 escolas da capital, um total de 600 pessoas
O governo federal liberou ainda mais de R$ 20 milhões para as ações de assistência aos atingidos pelas enchentes no Acre, na capital e no interior do estado. As portarias foram publicadas nas edições dos dias 29 de fevereiro e essa segunda-feira (4) no Diário Oficial da União (DOU). Para capital Rio Branco foram destinados mais de R$ 4 milhões.
Poucos meses separam o ápice de uma seca severa e a chegada de enchentes devastadoras no Acre (leia mais abaixo). Para entender as crises sucessivas que levaram emergência para o estado é preciso considerar ao menos três fatores:
a influência do El Niño
o atraso do “inverno amazônico”, como é conhecida a estação chuvosa na região
o impacto do aquecimento do Oceano Atlântico
Atualmente, o manancial está uma semana acima dos 17 metros. A primeira vez que o Rio Acre alcançou a marca histórica foi em 29 de fevereiro (veja abaixo a evolução do nível do rio).
Colaborou a repórter Quésia Melo, da Rede Amazônica Acre.
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