Mametu Nangetu atua na religião de matriz africana e luta diariamente pelo direito e respeito à cidade. Mametu Nangetu
Acervo Pessoal
A líder religiosa Mametu Nangetu lembra que aos 12 anos sua avó perguntou se ela queria seguir a tradição afro-religiosa. À época, ela não tinha entendido bem a pergunta, mas, aos 77 anos, entende os desafios de ser uma liderança paraense na luta pela liberdade religiosa.
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“Quando abri o terreiro fomos apedrejados, quebraram muita telhas e pessoas levaram pedradas na cabeça. Nesse momento eu voltei no passado, na minha infância, quando minha vó dizia o que ela passou. Sou empoderada, mas sei que se fosse um homem isso não aconteceria”, relembra.
Mametu Nangetu recebeu em 2019 o reconhecimento de Mulher Axé do Brasil. A paraense é fundadora do terreiro “Manso Massumbando Quem Quem Neta”. O espaço funciona há mais de 30 anos.
Terreiro Manso Massumbando Quem Quem Neta de Mametu Nangetu
Acervo Pessoal
A partir do terreiro foi criado o Instituto Nangetu de Tradição Afro-religiosa e de Desenvolvimento Social. O espaço realiza trabalhos sociais, de fomento à cultura e também de combate à intolerância religiosa no Pará.
Sendo atuante há mais de 15 anos, o instituto é um grande percursor da religião afro e tem um papel fundamental como um setor social e de pertencimento, diz a organizadora.
“Eu me identifico em ver meus colares, minhas roupas e luto não só por mim, mas por nós, por isso criamos o instituto pois através dele é possível participar de editais, tem uma proteção financeira e um amparo político também. Infelizmente os terreiros não possuem isso, eu acredito muito na legalização desses espaços no Pará”, declarou.
Outro ponto forte citado pela paraense é sua posição como mulher na sociedade, atrelada à luta pelo direito e respeito a religião afro. Para Mametu é um dos pontos que a fragiliza, porém não a ponto de deixar de se impor diante das situações que enfrenta diariamente.
Mametu Mangetu
Reprodução/Agência Belém
Há mais de 20 anos viúva, a líder religiosa também relata que percebe olhares e desvalorização social quando a veem sem a presença de um homem por traz das suas conquistas e vitórias.
“Eu sou destemida, sei meu direito e eu tenho esse empoderamento de leis. Então, como uma mulher eu não levo desaforo, o que me ampara com uma mulher de tradição, eu vou para cima, não me calo”, afirmou Mametu.
Quando perguntada sobre os desafios e preconceitos que ainda enfrenta, a líder religiosa foi muito sucinta e disse que a discriminação ainda é um ponto muito real nas vivências de uma mulher, principalmente sendo da religião de matriz africana.
Mametu conta que na época de sua avó as pessoas precisavam se esconder para conseguir seguir as próprias tradições africanas. O bater palma e tambor era considerado crime, chegando a levar muitas pessoas a cadeia pelo simples fato de praticarem a religião.
“Minha avó dizia assim: não bate tambor, fica na corina, que é apenas bater palma, no teu cantinho, no fundo do quintal. Dos anos 90 para cá, nós começamos a andar paramentados com nossas roupas e isso causa muito (olhar discriminado) até hoje”, comentou.
Entre os relatos fortes, Mametu relembra que uma das ações mais comuns é que ninguém senta ao seu lado no transporte coletivo, quando está utilizando as vestimentas de sua religião.
Mametu Nangetu
Reprodução
A saia baiana, o turbante na cabeça, os colares de proteção e as cores brancas se tornaram uma simbologia para as pessoas que tem o olhar preconceituoso, descreveu.
“Esse tipo de violência não diminuiu, isto aumentou muito mais, porque são outras formas, até de mortes de lideranças religiosas. Então a criação de redes de proteção ajuda a nos proteger”, relatou.
Quando recebeu o título nacional por representar a religião afro do Pará, percebeu que era a voz de várias mulheres que lutam pelo direito de caminhar. Por isso afirma que mesmo aos 78 anos, ainda tem forças e coragem para lutar pela próxima geração.
” Eu me sustento, eu luto todo dia pelo direito de me alimentar e alimentar os meus filhos, de ter políticas, então não dá mais, precisamos poder e ter o direito de usar o que queremos e o que nos identificamos”, finalizou
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