26 de dezembro de 2024

O dia é da mulher, mas a noite não: medos e desafios de quem luta por igualdade

No Dia Internacional da Mulher, o g1 MS foi às ruas procurar os principais obstáculos que uma mulher enfrenta ao longo da vida. Confira a vídeo reportagem especial. Dia Internacional das Mulheres: g1 foi para as ruas descobrir medos e desafios
Andar por uma rua sem poste de luz. Se locomover em um transporte coletivo. Participar de uma entrevista de emprego. Limpar a casa, lavar banheiro ou cozinhar. Ações que são simples e rotineiras, mas que podem se tornar, em alguns casos, um pesadelo na vida de uma mulher. Veja o vídeo acima.
O IBGE aponta que a maioria da população de Mato Grosso do Sul, e do Brasil, é feita de mulheres. Ainda assim, o público enfrenta estigmas e violação de direitos básicos presentes na Constituição.
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No Dia Internacional da Mulher, o g1 foi às ruas de Campo Grande e abordou 12 pessoas, sendo 6 homens e 6 mulheres, perguntando sobre questões cotidianas enfrentadas pelos sul-mato-grossenses e brasileiros. As respostas refletiram as diferenças entre sexos.
Para todos os entrevistados, foram feitas as mesmas perguntas:
Você tem medo de andar na rua de noite sozinha (o)?
Você já foi assediada (o)?
Em uma entrevista de emprego, já te perguntaram se tem filho?
É responsável pelos serviços domésticos da sua casa?
Veja as respostas no vídeo acima.
Você tem medo de andar na rua de noite sozinho (a)?
A insegurança de andar sozinho em uma rua escura pode estar presente em qualquer pessoa, mas entre os entrevistados pelo g1, os motivos foram diferentes entre os homens e as mulheres.
De acordo com as estatísticas da Secretaria de Segurança Pública de Mato Grosso do Sul (Sejusp), apenas em 2024, foram registrados 657 casos de roubo, contra 295 notificações de estupro, em todo o estado.
Mesmo que o índice de assaltos seja maior que o de violência sexual, todas as mulheres responderam de imediato que não andam sozinhas de noite para que “não aconteça algo pior”.
“Eu tenho medo de sofrer algum tipo de violência e eles me deixarem viva, porque eu penso que o trauma é irreparável. Nada, nada, nada ameniza”, disse a cuidadora de idosos Norma Ortiz.
Dos seis homens, apenas um revelou que caminha com medo em uma rua escura, porque teme ser assaltado.
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Você já foi assediada (o)?
Existem vários tipos de assédio, o moral, o sexual, o patrimonial e outros. Segundo o Conselho Nacional de Justiça (CNJ), o assédio moral é definido como “toda conduta abusiva, a exemplo de gestos, palavras e atitudes que se repitam de forma sistemática, atingindo a dignidade ou integridade psíquica, ou física de um trabalhador”. Geralmente, ocorre em ambientes de trabalho.
Já o assédio sexual é definido, de forma geral, como o constrangimento com conotação sexual. No Brasil, o assédio sexual é crime, definido no artigo 216-A do Código Penal como “constranger alguém com o intuito de obter vantagem ou favorecimento sexual, prevalecendo-se o agente da sua condição de superior hierárquico ou ascendência inerentes ao exercício de emprego, cargo ou função”.
Entre as mulheres, a maioria respondeu “sim” para a pergunta sobre o assédio. Em relação aos lugares onde elas mais foram assediadas, o transporte público foi o que apareceu com mais frequência nas respostas.
Entre os homens, um respondeu que já foi assediado no trabalho de vendedor; outro, que costuma ser assediado por outros homens; e o terceiro que já recebeu cantadas de homens e mulheres na rua.
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Em uma entrevista de emprego, já te perguntaram se tem filho?
A advogada trabalhista Camila Marques explica que algumas perguntas não podem, por lei, ser feitas durante uma entrevista de emprego. São as questões de cunho pessoal e íntimas, que não têm relação com a experiência profissional do candidato.
“Como, por exemplo, se o candidato ou a candidata tem filhos. Justamente para evitar a discriminação no momento da seleção e da contratação. O que acontece principalmente com mulheres, já que quando o entrevistador faz esse tipo de pergunta, é justamente para saber qual a disponibilidade da pessoa”, destacou a profissional.
Em outras palavras, deduzir que uma pessoa não será eficiente em suas funções, nem vai atender às expectativas do empregador pelo fato ter filhos, fere as leis trabalhistas, além de ir ao encontro do princípio da isonomia, também conhecido como princípio da igualdade, presente no art. 5º da Constituição Federal.
Outra vez, as mulheres foram as que mais passaram por esta situação. Das seis, quatro afirmaram já ter sido questionada, pelo menos uma vez, se tinha filhos durante uma entrevista de emprego. A cuidadora Norma Ortiz relatou que até perdeu oportunidades de trabalho por responder a verdade.
“Todas as entrevista que eu já passei até hoje (perguntaram se ela tinha filhos). Perdi várias oportunidades, mas mesmo assim eu não desisti e também não coloquei os meus filhos como obstáculos”, destacou.
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É responsável pelo serviços domésticos da sua casa?
A psicóloga Ana Flávia Weis destacou que historicamente as tarefas domésticas e os cuidados com a casa e com os filhos, foram impostos as mulheres, enquanto os homens era os provedores, os encarregados de garantir a subsistência do grupo familiar.
Ela diz que mesmo com a mudança cultural da sociedade, com a quebra de paradigmas sobre o papel da mulher e a divisão de tarefas entre os sexos, os serviços domésticos ainda continuam, na maioria das vezes, sob responsabilidade quase exclusiva delas, como uma espécie de contrato silencioso.
Quando questionados sobre a frequência com que limpam a casa, a maioria dos homens atribuiu a responsabilidade a uma mulher, com respostas como: “eu ajudo minha mulher toda semana”; “eu ajudo sempre que posso”; ou então “pagamos uma empregada”.
Apenas dois afirmam serem responsáveis pelo lar: um, porque mora apenas com o pai, e outro, porque a esposa tem problemas de saúde.
No público feminino, apenas uma disse que ajudava em casa quando podia, porque ainda morava com os pais. As outras cinco afirmaram ser responsáveis pelas tarefas domésticas.
“Isso ainda é uma coisa que precisa avançar muito, nós precisamos nos libertar da ideia de que esse papel é só nosso e o homem precisa também tomar neste lugar que é dele, no cuidado da casa, no cuidado com as crianças, no cuidado com a família, também num sentido de igualdade de papéis. Então, essa é uma luta que nós ainda precisamos trabalhar para tirar a sobrecarga da mulher e para que realmente as coisas sejam vistas como iguais para homens e mulheres”, completou a psicóloga.
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Esporte, autoconhecimento e defesa pessoal
Dia Internacional das Mulheres: veja dicas de autodefesa de Krav Maga
No contexto de superação diária de desafios, a busca da mulher por alternativas para se conhecer melhor e praticar atividades que possam representar um momento de ‘respiro’ em meio a dupla ou até tripla jornada em alguns casos, com ganhos para sua saúde física e mental, uma modalidade esportiva vem ganhando espaço, o Krav Maga. E com um plus, é uma eficiente ferramenta de defesa pessoal.
A luta de defesa pessoal foi criada em Israel, por Imi Lichtenfeld, e se espalhou no mundo inteiro. Segundo a Federação Brasileira de Krav Maga, o embate tem o objetivo de dar a qualquer pessoa, independente de sexo, idade ou porte físico, a capacidade de se defender contra qualquer tipo de agressão: armada ou desarmada, contra um ou vários agressores, em pé ou no chão.
A repetição é uma das principais aliadas da aprendizagem. Na infância, por exemplo, cada frase que uma pessoa escuta é responsável por enraizar conceitos de forma cada vez mais sólida. Dessa forma, se uma mulher ouvir durante a vida toda que é mais vulnerável que um homem, ela provavelmente vai ter mais medo de andar sozinha em uma rua escura.
Esse era o caso de Thais Soares Vieira, de 30 anos, que buscou na modalide uma alternativa para fugir da sensação de medo constante.
“Antes, eu me sentia muito vulnerável e agora eu não tenho mais esse medo de estar nos lugares, independente de qual lugar for, principalmente na rua, à noite, na faculdade, em ambiente escuro. Então, agora eu não tenho mais esse medo, me sinto muito mais segura”, relatou Thais.
O instrutor de Krav Maga da academia frequentada por Thais, Cesar Ribeiro, disse que diversas alunas já relataram casos em que escaparam de agressões por meio das técnicas aprendidas no tatame, ou ainda, quando conseguiram identificar previamente e evitar situações de risco.
“Aqui, chegam alunas com problemas psicológicos, afetivos, e quando ela começa a ter aulas conosco, elas têm um empoderamento pessoal, criam forças para que tudo que aconteça ao seu redor seja encarado de outra maneira. Elas aprendem a se defender, e focar nelas mesmas”, completou.
Aulão de Krav Maga voltado para mulheres, realizado em 2023.
Reprodução
O professor Giulio César Del Duca também explica que o Krav Maga dá autonomia e sentimento de autoconfiança para as mulheres. Por isso, todos os anos no mês de março, em comemoração ao Dia Internacional da Mulher, a Federação concede treinamentos gratuitos de defesa pessoal, voltado para o público feminino.
“Hoje, infelizmente, com a ascensão do feminicídio, o Krav Maga traz respostas para esse tipo de para qualquer tipo de agressão que elas possam vir sofrer. Seja agressão doméstica, seja agressão psicológica, cárcere privado, físico, sexual. O Krav Maga tem resposta para qualquer tipo de agressão, é uma excelente ferramenta para que as mulheres se sintam mais seguras e quem sabe resgatar a autoestima também”, ressaltou.
O aulão será realizado no sábado (8) e domingo (9), no Centro de Krav Maga e Lutas de Mato Grosso do Sul, que fica no centro de Campo Grande. Informações sobre as aulas é possível através do número (67) 3253 – 4905.
Thais lamenta que a violência seja tão grande, a ponto de mulheres precisarem buscar alternativas para não se tornarem vítimas. Por outro lado, ela avalia que o movimento de fortalecimento entre o público feminino é uma forma de lutar contra o machismo.
“Infelizmente, é necessário que as mulheres aprendam a se defender, porque o mundo realmente está muito violento. Vemos hoje em dia crescendo os números de violência contra a mulher. Não que os casos não existissem antes, mas temos agora muito mais divulgação e conscientização. Elas tem muito mais coragem de denunciar e acredito que esse empoderamento, que a defesa pessoal traz para a gente, é muito importante para lutarmos contra isso”, completou.
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