O g1 reuniu a história de algumas dessas danças, para ajudar a entender essa rica cultura que faz do São João maranhense uma festança inesquecível. Grupo de Tambor de Crioula se apresenta em São Luís
Governo do Maranhão/Divulgação
O São João do Maranhão é marcado pela diversidade de manifestações culturais. Além do bumba meu boi, há outras danças da cultura popular que enriquecem a festança junina no estado.
Ao longo do mês de junho, as ruas, praças e palcos montados por diversas cidades maranhenses, com destaque para a capital São Luís, recebem o colorido e o brilho de várias danças, como o cacuriá, o tambor de crioula, a dança portuguesa, entre outras.
A originalidade do São João no Maranhão: especialista explica por que as manifestações do estado diferem do resto do país
O g1 reuniu a história de algumas dessas danças, para ajudar a entender essa rica cultura que faz do São João maranhense uma festança inesquecível.
Cacuriá
O Cacuriá é inspirado no Carimbó das Caixeiras, tradição realizada ao final da festa do Divino Espírito Santo, na cidade maranhense de Alcântara.
Douglas Júnior/O Estado
Conhecido pela coreografia sensual e músicas de duplo sentido, o Cacuriá é uma dança que já se enraizou na cultura popular do Maranhão. A dança foi criada em 1973, na capital, por Alauriano Campos de Almeida, folclorista conhecido como “Seu Lauro”.
Conheça a origem do Cacuriá, dança típica da cultura popular maranhense
O Cacuriá é inspirado no Carimbó das Caixeiras, tradição realizada ao final da festa do Divino Espírito Santo, na cidade maranhense de Alcântara. Também conhecida como bambaê de caixa, a dança das caixeiras é realizada após a derrubada do mastro, que é uma espécie de vara enfeitada que ostenta a bandeira do Divino Espírito Santo.
Após a derrubada do mastro, as caixeiras e os festeiros aproveitam para se divertir tocando o carimbó de caixas, ou ainda o baile de caixas, de maneira sensual.
Os integrantes do Cacuriá dançam em duplas, com movimentos cheios de sensualidade coreografados em uma roda, o cordão. Os pares dançam com passos marcados, muito rebolado do quadril, improviso e interação com o público.
Cada passo da dupla transmite a manifestação da cultura, crenças e costumes do povo, por meio do requebrado do corpo, bem como o contato corporal com o parceiro da dança, o riso e o olhar entre os dançantes e espectadores, o que torna essa dança provocante e excitante.
O Cacuriá é considerado uma mistura de marcha, valsa e samba. O ritmo da dança fica a cargo das caixeiras, que cantam toadas que falam sobre a natureza, crenças, brincadeiras antigas e, também, anseios da população. As toadas são ritmadas ao som das Caixas do Divino, que são instrumentos de percussão no formato de pequenos tambores feitos, geralmente, com couro de boi. Há também o uso de outros instrumentos como banjo, violão, clarinete e flauta.
Quanto as indumentárias dos brincantes, as mulheres usam blusas, em geral curtas, e saias rodadas compridas e muito coloridas. Outro aspecto marcante da indumentária feminina é a flor que as brincantes colocam no cabelo para adornar.
Quanto aos homens, em geral, a indumentária é formada por um colete sem camisa por baixo e calças curtas, ou por blusas e calças bordadas. Um detalhe importante, é que a roupa masculina sempre acompanha a estampa da roupa feminina.
Dança Portuguesa
Dança Portuguesa Tesouro de Coimbra em São Luís
Liliane Cutrim/g1 MA
A Dança Portuguesa é uma manifestação popular de ‘raízes europeias’ que se insere no contexto das tradições populares brasileiras. Segundo pesquisadores, a Dança Portuguesa foi trazida para o Brasil por famílias lusitanas que passaram a viver no país, sendo uma manifestação mais presente nas regiões Sul (nos estados de Santa Catarina e Paraná), Sudeste (São Paulo) e, também, na região Nordeste (nos estados do Piauí, Ceará e Maranhão).
No caso do Maranhão, a dança passou a ser inserida nas festividades juninas desde 1975, quando a filha de uma portuguesa, que morava em São Luís, decidiu juntar os amigos e fazer uma dança portuguesa na festa junina da escola. Com o sucesso da apresentação, a mãe da aluna decidiu montar um grupo para ensinar a dança, nascia aí o primeiro grupo de Dança Portuguesa no Maranhão.
Na tese de doutorado em Arte, desenvolvida pela pesquisadora maranhense Tânia Cristina Costa Ribeiro, intitulada: ‘É uma dança portuguesa com certeza? Um estudo sobre formas de pertencimentos, processos de criação e influências da dança Portuguesa do Maranhão’, ela destaca que no Estado, essa dança se caracteriza como uma manifestação cênica apresentada durante as festas juninas, nos arraiais das cidades, bem como em praças e ruas das comunidades, nos pátios de igreja, entre outros lugares. A tradição é muito presente na capital e nas cidades de Paço do Lumiar, Raposa e São José de Ribamar, que fazem parte da Região Metropolitana de São Luís, bem como em cidades da Baixada Maranhense.
Os participantes da dança, geralmente, usam um figurino exuberante, com paetês, plumas, longas botas em veludo, capas e com bordados e cores variadas. As mulheres costumam usar meias, leques e lenços. Os trajes delas, em geral, são vestidos típicos de Portugal. Enquanto que e os homens usam chapéus, luvas e bengalas.
Dança Portuguesa Tesouro de Coimbra em São Luís
Divulgação/Instragram
A Dança Portuguesa do Maranhão mistura alguns elementos de outras expressões culturais na forma de dançar e montar os pares, como a quadrilha, o Cacuriá, a dança do Caroça e a dança do Boiadeiro. A dança também utiliza elementos do Vira e do Malhão de Portugal, o que se pode observar na postura dos braços, das formações circulares e do emprego dos giros.
Assim como a indumentária e a dança, as músicas utilizadas pelos grupos de Dança Portuguesa são de origem lusitana. A manifestação cultural traz um repertório musical que junta mixagens com seleções de músicas tradicionais de Portugal e outros gêneros. Os brincantes dançam ao som de fados e viras, sempre aos pares.
Dança do Lelê ou péla porco
A dança do lelê é considerada uma das mais populares na cultura popular maranhense.
Reprodução/TV Mirante
O Lelê, também conhecido como dança do péla-porco, junta ritos, associados aos gingados. A origem do lelê remonta à influência da dança ibérica, sobretudo na instrumentação utilizada para a performance dos brincantes, com violões, cavaquinhos, flautas e rabecas.
A história também registra que a dança do lelê sofreu certa influência dos franceses, até assumir a sua forma folclórica – datada, segundo informações, desde o século XIX – na região do Munim, em municípios maranhenses como Axixá e Rosário.
Os dançantes, no salão, costumam movimentar-se em honra aos santos, sob as ordens do mandante, que dá a regência para que os grupos se enfileirem, entre homens e mulheres. Com quatro partes, os ritos têm início com o ‘chorado’. É o momento em que os convites se iniciam, para o encaminhamento da ‘dança grande’, considerada a parte fundamental do lelê, quando os pares se cortejam mutuamente.
Na ‘talavera’, chega-se ao momento íntimo: os brincantes se entregam, madrugada adentro, com os corpos entrelaçados, dançando, até a chegada do ‘cajueiro’, no qual a festa se conclui com a simbologia da entrega de cajus ao público.
Dança do Coco
A dança do coco tem influências indígena e africana, como boa parte das festas folclóricas do Brasil.
Divulgação / Grupo Coco Calemba
Uma das manifestações culturais que resiste ao longo das décadas é a dança do coco. Com músicas e letras simples, a dança do coco era muito forte na Região dos Cocais, mas também marca presença em São Luís, capital do estado.
Mesmo com presença marcante no Maranhão, há controvérsia com relação ao local de origem da dança do coco: Uns dizem que foi no Estado do Pernambuco, outros citam a Paraíba. Há também quem defenda que a dança surgiu em Alagoas.
A dança do coco tem influências indígena e africana, como boa parte das festas folclóricas do Brasil. A maioria dos folcloristas concorda, no entanto, que a dança do coco teve origem no canto das quebradeiras de coco, durante a procura pelo fruto na mata e que, só depois, se transformou em ritmo dançado.
A dança do coco é realizada em roda acompanhada de cantoria e executada em pares, fileiras ou círculos. Originalmente há um cantador que puxa as músicas, mas, atualmente, essa figura tem perdido espaço na dança.
Outra característica do coco de roda, como também é conhecida a dança do coco, é a cadência do som dos pés batendo no chão. A sonoridade é completada com as batidas do coco que os dançarinos carregam nas mãos. Adereços como o machadinho e o cofo também sempre aparecem nas rodas de dança.
Dança do coco Pirinã é uma das mais tradicionais do Maranhão
A dança do coco apresenta uma coreografia básica: os participantes formam filas ou rodas onde executam o sapateado característico, em passos que se assemelham ao xaxado.
Quadrilha
Quadrilha Junina Flor de Mandacaru
Brenda Alcântara/Divulgação
A quadrilha é uma das danças mais populares do São João, tanto no Maranhão, como em outros estados do Nordeste. Também chamada de quadrilha caipira ou matuta, a dança tem suas origens na Europa, mais precisamente na Inglaterra, depois se espalhou pela França e chegou à Portugal.
Por conta da colonização portuguesa, essa manifestação cultural chegou ao Brasil, onde incorporou influências indígenas e africanas.
De início, a dança era vista entre a nobreza, mas, com o passar do tempo, ela se popularizou e se tornou parte da cultura popular, principalmente na área rural do nordeste brasileiro, sendo um festejo para agradecer aos santos, São João, Santo Antônio e São Pedro, pela boa colheita.
Com sua inserção no campo, a quadrilha ganhou ares caipira, com a dança é feita em pares, ao som de música caipira, como forró e o baião, usando instrumentos como a viola, o violão, a sanfona, o triângulo e a zabumba.
Já os dançarinos usam roupas coloridas e tipicamente caipiras. Os homens usam camisa xadrez, chapéu de palha e costumam desenhar bigode ou cavanhaque no rosto. Quanto as mulheres, usam vestidos coloridos, maquiagem, além de fazerem tranças ou maria-chiquinha no cabelo.
Quadrilha ‘Arrastapé’ na 13ª edição do Arraiá da Mira
Júlio César
Durante a dança, tem a figura do orador, também chamado de marcador ou animador, o qual diz frases divertidas que guiam a dança, tais como: “Olha a cobra! É mentira!”, “Olha a chuva! Já passou!”, “O caminho da roça”.
Outras figuras importantes na quadrilha são os noivos, sendo que é em torno do casamento deles que gira a dança. Essa tradição tem como objetivo homenagear Santo Antônio, que é considerado o santo casamenteiro. Para alguns pesquisadores, a encenação do casamento seria uma crítica social aos casamentos nas famílias tradicionais, onde a noiva aparecia grávida e seu pai obrigava o noivo a se casar, para honrar a família. Por esse motivo, a tentativa de fuga do noivo, geralmente embriagado, faz parte da dança.
Além dos noivos, a quadrilha conta o padre, o pai da noiva, o juiz e o delegado, que fazem parte da encenação da dança.
Em várias partes do Nordeste, os grupos de quadrilha costumam competir entre si. No Maranhão, a tradicional competição entre os grupos acontece na cidade de Imperatriz, na Região Tocantina, como o Arraiá da Mira, evento realizado pelo Grupo Mirante.
Os grupos são julgados pelos quesitos: temática, casamento, coreografia, evolução, harmonia, animação, figurino e repertório. Além de serem avaliados: os noivos, o marcador e a rainha ou princesa. A competição garante uma vaga nas disputas regionais ou nacionais.
Flor de Mandacaru, do Maranhão, é vice-campeã do Festival de Quadrilhas Juninas da Globo em 2023
Tambor de Crioula
Tambor de Crioula Divino Salve Liberdade realiza apresentação no Centro Cultural Vale Maranhão em São Luís
Divulgação/Centro Cultural Vale Maranhão
Durante o ano inteiro se vê o Tambor de Crioula ecoar nas praças da cidade, em centros culturais, no interior dos terreiros ou em palcos de festas como o carnaval e o São João. A expressão de matriz afro-brasileira, típica do Maranhão, é realizada livremente sem ter um calendário específico. A manifestação é feita tanto como forma de diversão como em louvor a São Benedito, o santo protetor dos negros.
Segundo os registros do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (IPHAN), São Benedito possui duas narrativas de origem. Há um ditado que diz que ele era um escravo que um dia foi para a mata, cortou um tronco de árvore, tocou tambor e depois ensinou outros negros a fazer e tocar tambor. A segunda versão é que o santo era o cozinheiro do mosteiro que escondia comida em suas vestes e a levava aos pobres.
Embora não haja consenso sobre as origens de São Benedito, o fato é que ele é reverenciado por muitos membros do grupo Tambor de Crioula, que marcaram sua história com resistência cultural e religiosa.
A dança circular feita por mulheres, as coreiras ou dançadeiras, as toadas que ficam por conta dos cantadores e a percussão dos tambores feitas pelos tocadores, são as características dessa dança. Ao som do toque dos tambores e das toadas que falam de fé, cultura, problemas sociais, entre tantos outros temas, uma coreira dança dentro da roda e com a punga ou umbigada ela saúda outra dançadeira, que entra na roda para também dançar.
Considerado Patrimônio Cultural do Brasil, o Tambor de Crioula saiu do espaço de marginalizado para os arraiais de elite, onde não havia essa manifestação cultural. Hoje o tambor conseguiu ocupar um espaço que lhe é devido, de identidade cultural.
Casa do Tambor de Crioula, em São Luís.
Divulgação/Governo do Maranhão.
Dança do Caroço
Dança do Caroço Tremembés
Divulgação/Dança do Caroço Tremembés
A dança do Caroço se concentra na região do Delta do Parnaíba, principalmente na cidade de Tutóia, onde um pequeno grupo ainda mantém a tradição. A origem dessa manifestação ainda é vaga, mas pesquisadores acreditam que ela tenha surgido, possivelmente, de uma dança africana trazida pelos escravos, que seguiam a tradição de seus antepassados. Há ainda quem atribua aos índios Tremembés, a origem da dança.
Os integrantes da dança, isolados ou formando uma roda ou cordão, brincam respondendo às toadas improvisadas tiradas pelos cantadores, ao som de instrumentos como caixas (tambores), cuíca e cabaça. Os brincantes são “puxados” por uma líder, geralmente a melhor cantora e dançarina, conhecida como Rainha do Caroço.
Com roupas simples e livres, os componentes dançam isolados formando uma roda ou cordão. As mulheres usam vestidos de corpo baixo, na cor branca, com gola redonda e mangas com quatro folhos pequenos do mesmo tecido da saia, que deve ser estampada, franzida e curta, com três folhos.
Dança do Boiadeiro
Dança do Boiadeiro Gaúcho da Fronteira do Cruzeiro do Anil, em São Luís.
Divulgação/Bruno Tetto
A dança do Boiadeiro, ou Country tradicional, tem sua origem no dos Estados Unidos, no começo do século XIX, quando imigrantes ingleses começaram a povoar o interior do território, na chamada corrida pelo ouro. Ligada a alguns estados do sul do país norte-americano como Louisiana, Idaho, Novo México e Texas, a dança country resgata a exaltação da zona rural, a simplicidade típica da vida no campo.
A denominação ‘country’, proveniente do inglês, refere-se a ‘interior’, ‘campo’. A Dança do Boiadeiro surgiu influenciada por muitas outras formas de dança popular, como danças do norte europeu, swing e as danças tradicionais dos fazendeiros americanos.
A dança, que chegou ao folclore maranhense em meados de 1990, pode se estruturar de diversas maneiras, como em pares, sem par, em fila, com coreografias compassadas ou livres, desde que a estrutura básica seja preservada. Alguns dos passos tradicionais são:
Western- Um dos passos mais característicos, com movimentos fortes e bem marcados.
Two-Step – Estilo usado majoritariamente danças do Maranhão; preservando a dança de casal, coreografada, dançada livre ou em círculos, como em uma quadrilha.
Partner Dance – dança de par, a mais parecida com a dança de salão, onde não existe coreografia e a sequência de passos é definida pelo comando do cavalheiro.
A Dança do Boiadeiro, na cultura maranhense, tem inspiração direta no homem do campo e o peão das vaquejadas. Os grupos tradicionais costumam se apresentar nas festas juninas em casais, com movimentações sincronizadas, embaladas por repertório formado por música sertaneja, forró e música country.
Além da música, as vestimentas utilizadas na dança country remetem diretamente à vida campestre, com chapéus de cowboy e botas, com bastante brilho e sem economizar nos recortes de franjas e cores vibrantes.