18 de janeiro de 2025

SP concentra 40% das mortes por causa indeterminada com características de homicídio no Brasil, diz Atlas da Violência

Pesquisa do Ipea e do Fórum Brasileiro de Segurança Pública aponta que homicídios ocultos são mortes violentas não assinaladas como homicídio pelo poder público, mas com alta probabilidade de serem assassinatos. Nesse cenário, São Paulo deixaria de ser estado menos violento do país. Parente mostra cápsulas de bala encontradas dentro de casa em Santo André, SP
Divulgação/Arquivo pessoal
O estado de São Paulo concentrou mais de 40% dos casos de homicídios ocultos no Brasil em 2022, segundo dados do Atlas da Violência 2024, um estudo do Ipea (Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada) e do Fórum Brasileiro de Segurança Pública (FBSP) divulgado nesta terça-feira (18).
Segundo o estudo, homicídios ocultos são mortes violentas que não foram assinaladas como homicídio pelo estado, mas que têm grande probabilidade de serem homicídios. (veja metodologia abaixo)
Em 2022, segundo o Atlas, o Brasil registrou 5.982 homicídios ocultos — e 2.410 (40,29%) aconteceram no estado de São Paulo;
Os pesquisadores estimaram o número com base em registros oficiais em que o Estado não conseguiu definir a causa da morte (se decorrente de homicídio, acidente ou suicídio);
De acordo com o levantamento, parte dessas mortes violentas por causa indeterminada são, na verdade, homicídios que ficaram ocultos nas estatísticas, fator que prejudica as análises sobre prevalência da violência letal.
O Atlas é feito com base em dados do Sistema de Informações sobre Mortalidade (SIM) e do Sistema de Informação de Agravos de Notificação (Sinan), ambos do Ministério da Saúde, e diferem dos dados repassados pelas secretarias da Segurança, utilizados no Monitor da Violência e no Anuário de Segurança Pública.
Para Samira Bueno, coordenadora da pesquisa e diretora do FBSP, isso acontece, principalmente, em razão da precarização dos dados de atestado de óbito, que não estariam sendo devidamente identificados pelos médicos – levando à subnotificação de homicídios em São Paulo.
O segundo estado com mais casos do tipo é o Rio de Janeiro, com 843 registros, ou 14,09%. Em seguida, está o Ceará, com 589 ocorrências (9,85%). Veja tabela completa:
Homicídios ocultos no Brasil (2012 a 2022)
Ipea e FBSP
Metodologia
Para tentar contornar essa a possível falta de dados, os pesquisadores utilizaram inteligência artificial (machine learning) para estimar a quantidade de homicídios ocultos presentes no conjunto de mortes violentas por causa indeterminada.
Eles fizeram isso a partir de um grande banco de dados sobre características pessoais e situacionais;
E definiram se a ocorrência de morte foi provocada, provavelmente, por acidente, suicídio ou homicídio;
A análise se baseou em microdados de óbitos por causas não naturais (ou violentas) ocorridas no Brasil entre 1996 e 2022.
“A gente roda isso na morte por causa indeterminada e vai indicar que aquele caso tem, por exemplo, 70% de chance de ser uma morte por agressão. Porque é uma vítima de 20 anos, sexo masculino, parda, vítima de projétil de arma de fogo”, exemplificou Samira.
“Se o legista não sabe diferenciar entre as três [homicídio, acidente, suicídio], ele coloca causa indeterminada. O problema é que, quando essa causa indeterminada responde a uma porcentagem muito relevante do total de casos registrados, você percebe que há problemas no registro, ou seja, as taxas de homicídio, suicídio e acidente estão subestimadas”, destacou a diretora do Fórum.
Em nota, a Secretária da Segurança Pública afirmou que os dados de eventos com resultado morte são comparados com dados disponibilizados pelo DataSus.
“Na análise de 2022, a mais recente disponibilizada, não foram encontradas divergências significativas entre as duas fontes em relação ao número de homicídios.” Veja a íntegra da nota abaixo.
Homicídios estimados
De acordo com a metodologia do Atlas, o número de homicídios estimados corresponde à soma dos homicídios oficialmente registrados com os homicídios ocultos.
No caso do estado de São Paulo, a inclusão dos homicídios ocultos faz mudar significativamente a taxa de segurança pública:
Em 2022, enquanto a taxa de homicídios registrados era de 6,8 para cada 100 mil habitantes, a taxa estimada era de 12 (incluindo os ocultos);
Nesse cenário, contrariando as estatísticas oficiais, São Paulo deixaria de ser o estado menos violento do Brasil, passando para a terceira posição no ranking, atrás de Santa Catarina e Distrito Federal.
Taxa de homicídios estimados por 100 mil habitantes no Brasil
Ipea e Fórum Brasileiro de Segurança Pública
O que diz o governo
Os dados de eventos com resultado morte são comparados com dados disponibilizados pelo DataSus. Na análise de 2022, a mais recente disponibilizada, não foram encontradas divergências significativas entre as duas fontes em relação ao número de homicídios. Além desta metodologia de comparação, a atual gestão implantou o SPVida, que faz um monitoramento e análise minuciosa dos casos registrados com vítimas fatais, garantindo que cada ocorrência seja registrada e investigada adequadamente, diminuindo a subnotificação de homicídios. Estes dados são disponibilizados para consulta, como forma de compromisso com a transparência.
Outra forma de combater a subnotificação desses casos é investir nas forças de segurança, incluindo a Polícia Técnico-Científica, que conta com mais de 3.500 profissionais altamente capacitados e em constante treinamento. Para ampliar o efetivo, há dois concursos em andamento para o preenchimento de 116 vagas para médicos-legistas e 249 para peritos criminais. Além disso, há 172 médicos legistas com formação prevista para setembro.
Há que se destacar ainda que as ações da Pasta para a segurança pública levaram o Estado a fechar o ano de 2023 com o menor número de homicídios dolosos desde 2001, com uma queda de 10% no número de casos em relação ao ano anterior.

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