Bilhete dizia: “Vergonha! Seu filho não é deficiente! Te filmei! Vou publicar você! Não pare mais aqui!”. Mulher recebe bilhete por estacionar em vaga para deficientes em Nova Friburgo
A mãe de um menino autista de 8 anos foi ameaçada com um bilhete deixado no pára-brisa do carro depois de estacionar em uma vaga destinada para pessoas com deficiência em Nova Friburgo, na Região Serrana do Rio. O bilhete dizia: “Vergonha! Seu filho não é deficiente! Te filmei! Vou publicar você! Não pare mais aqui!”.
Segundo Juliana Eller, mãe de João Pedro, o bilhete foi colocado no pára-brisa do veículo mesmo com uma placa de identificação de pessoa com deficiência presa no painel do carro.
“Quando eu cheguei pra estacionar, e é muito recorrente aqui, tinha um carro sem a credencial de estacionamento. Só que dessa vez eu vi a pessoa estacionando e tinha certeza que ela estava ali dentro do carro, mesmo o carro com os vidros todos pretos. E eu cheguei perto com a minha carteirinha no painel pra ver se a pessoa ia se sensibilizar. Como isso não aconteceu, eu bati no vidro e perguntei se a pessoa tinha credencial e se iria usar a vaga. E como ela não tinha, ela tirou de boa. Aí eu estacionei na vaga. Eu tinha deixado João na escola. Quando eu voltei o bilhete estava lá no vidro do meu carro”, contou Juliana, que disse que na hora não teve reação nenhuma, mas que teve medo.
“Aí como tudo que acontece comigo eu mando pro meu marido, eu fiz um vídeo. Mas a minha vontade foi entrar no carro e sair na hora, porque eu tive medo. Eu pensei: será que alguém vai fazer alguma coisa comigo e com o meu filho?”, disse Juliana.
Mãe de autista é ameaçada com bilhete em carro após estacionar em vaga para pessoas com deficiência em Nova Friburgo
Foto: Pablo Pais
Além do medo, a indignação também tomou conta da mãe.
“Como uma pessoa vem e me acusa desse jeito sem saber da nossa luta com o João Pedro”, desabafou.
O menino foi diagnosticado com TEA (Transtorno do Espectro Autista) e é portador da Síndrome de DiGeorge, que causa mau desenvolvimento de vários sistemas do corpo.
A vaga especial é um direito assegurado por lei federal com uso regulamentado por resolução do Conselho Nacional de Trânsito (Contran), que determina que 5% do total de vagas de estacionamento, tanto públicos quanto privados sejam destinadas a idosos e 2% a pessoas com deficiência.
“A lei federal que encube aos municípios a regulamentação e a fiscalização sobre. Em via de regra são pessoas com deficiência nos membros inferiores, pessoas com limitação intelectual e também eventualmente por capacidade temporária, com a incapacidade temporária da locomoção. Tem agora a lei do autismo que garante aos autistas também sua vaga especial. É óbvio que existe a necessidade de uma fiscalização para que não haja uma burla a esse benefício, prejudicando as pessoas necessitadas”, disse o advogado William do Valle.
A família fez um registro de ocorrência na delegacia de Nova Friburgo. Através de imagens das câmeras de segurança, eles descobriram quem foi que colocou o bilhete.
O crime de intolerância ainda não tem uma definição específica na legislação brasileira.
“Pode-se fazer por analogia, já que o STF autorizou o crime de racismo, eles fizeram por analogia o crime de homofobia, e aí dá para fazer uma construção jurídica pra você chegar num crime de intolerância para outras vertentes. Agora a rede virou o nosso judiciário virtual, né! Eu coloco na rede, parece que tá resolvido, não está resolvido, só começa o problema”, disse a advogada Célia Campos.
Segundo a Juliana, ela espera que esse episódio sirva de lição para outras pessoas.
“E o João é ensinamento para gente, é ensinamento para todas as pessoas que conhecem ele. O João é exemplo. Ele atingiu, não diretamente a gente, mas todos os pais que passam pela situação nossa se sentiram ofendidos com essa situação. Eu acho que o mínimo que ele teria era o arrependimento. Não só a gente não, mas por todas as pessoas com necessidades especiais. Isso é uma luta diária, a conscientização é uma luta diária que a gente passa”, concluiu.