26 de dezembro de 2024

‘Arrancaram um direito da minha filha’, diz mãe que recebeu diploma em nome de estudante da UFRGS morta a tiros em Porto Alegre

Sarah Domingues foi assassinada enquanto fazia uma pesquisa para o trabalho de conclusão de curso. Militante do movimento estudantil, jovem estudava Arquitetura e Urbanismo. Mãe de Sarah Domingues recebeu o canudo na formatura de Arquitetura e Urbanismo da UFRGS
Everaldo Oliveira/ Jornal A Verdade
A mãe da estudante Sarah Domingues definiu como “uma homenagem bonita, mas dolorosa” a entrega do diploma da filha, morta por engano em janeiro em Porto Alegre. A servidora pública Marta da Silva Domingues, de 53 anos, recebeu o canudo em nome de Sarah, na sexta-feira (28), em uma cerimônia realizada pela UFRGS na capital.
Moradora de Campo Limpo Paulista (SP), Marta viajou na quarta (26) para Porto Alegre, cidade onde a filha cursava Arquitetura e Urbanismo. A jovem de 28 anos foi baleada enquanto realizava a pesquisa do trabalho de conclusão do curso na Ilha das Flores, na capital, e recebeu a graduação póstuma.
“É difícil. É um misto de sentimentos, pois foi uma homenagem bonita, mas dolorosa. Todos estavam felizes e fiquei o tempo todo imaginando como seria, mas ela não estava lá. Arrancaram um direito da minha filha. Ela esperou muito por esse dia, queria muito essa formatura”, relata a mãe.
Durante a cerimônia, o nome de Sarah foi recebido sob aplausos da plateia e dos formandos, que se levantaram para a homenagem. Veja o vídeo abaixo.
Estudante da UFRGS morta a tiros em Porto Alegre é homenageada em formatura
Além da mãe, a irmã de Sarah, a estudante Eloá da Silva Farias, de 17 anos, também viajou para participar da homenagem de formatura. Percorreram mais de 1,1 mil km de carro em 16h horas de viagem, chegando em Porto Alegre na quinta (27).
Durante o trajeto e na chegada, a lembrança de Sarah era constante. A jovem deixou Campo Limpo Paulista, a 60 km da capital, São Paulo, em busca de conhecimento, de cursar uma faculdade e concluir o ensino superior.
“A cada vinda, fazíamos passeios juntas, passeávamos pelo Centro Histórico, conhecíamos vários locais. Ela veio para Porto Alegre para uma vida melhor, para realizar um sonho. Passou por dificuldades financeiras, estava longe de casa. Era uma aluna cotista e lutou pela permanência na universidade. É muito difícil voltar. Porto Alegre era ela”, lembra a mãe da estudante.
Sarah Domingues, assassinada em Porto Alegre, estudava o curso de Arquitetura e Urbanismo, na UFRGS
Everaldo Oliveira/ Jornal A Verdade
Projeto sobre enchentes nas ilhas
A família de Sarah deve ficar no Rio Grande do Sul até a próxima segunda (1º). Além da formatura, a mãe também foi até a Ilha das Flores, região onde a jovem foi morta. No local, as marcas da última enchente também lembraram a dedicação da estudante na luta pela moradia digna.
O trabalho de conclusão de curso desenvolvido pela estudante foi sobre um tema que se revelou urgente meses após a morte: a necessidade de um projeto urbanístico para combater as frequentes enchentes que atingem a região das ilhas. Após os temporais de abril e maio, o bairro Arquipélago teve 6,4 mil moradores afetados.
“Ela queria fazer uma denúncia com o trabalho que ela estava concluindo. Fui até lá e entendi. É uma região com infraestrutura precária, onde as pessoas seguem morando no meio da água. Conheci a família do seu Valdir, que também foi morto por querer proteger os moradores. Por tudo isso, espero que a luta e dedicação da Sarah não sejam esquecidas e sirvam de inspiração porque a história dela merece ser contada”, diz Marta.
Sarah foi coordenadora do Diretório Central dos Estudantes (DCE), diretora da União Nacional dos Estudantes (UNE) e integrou o Conselho Universitário da UFRGS. Após a morte da estudante, o Diretório Acadêmico da Faculdade de Arquitetura (DAFA) da universidade foi renomeado para “DAFA Sarah Domingues – UFRGS”.
Área inundada na Região das Ilhas, em Porto Alegre
Reprodução/RBS TV
O crime
De acordo com o 9º Batalhão de Polícia Militar (BPM), no dia 23 de janeiro Sarah estava em frente a um mercado na região da Ilha das Flores, enquanto fazia uma pesquisa acadêmica, quando o crime aconteceu.
Moradores relataram à polícia que dois homens em uma motocicleta chegaram ao local, desceram do veículo e atiraram com armas de fogo contra a estudante, que conversava com o proprietário do estabelecimento.
Ele e Sarah morreram na hora, informou a Brigada Militar (BM). Foram disparados pelo menos 15 tiros. Sarah foi atingida no peito e também em um dos braços.
O alvo dos criminosos seria o dono do estabelecimento. A polícia acredita que ele estaria incomodado com o tráfico de drogas na região.
Sarah Silva Domingues fazia TCC na região da Ilha das Flores
Arquivo Pessoal
Prisões
No dia 6 de fevereiro, a Polícia Civil prendeu temporariamente cinco pessoas suspeitas de envolvimento no assassinato da jovem de 28 anos.
Os presos seriam o mandante do assassinato, dois executores e outras duas pessoas que teriam envolvimento com o crime. Eles foram alvo de mandados judiciais cumpridos em diferentes endereços de Porto Alegre e Região Metropolitana.
Já na noite de 21 de fevereiro, a Polícia Civil prendeu preventivamente o traficante Maicon Donizete Pires dos Santos, conhecido como “Red Nose”, que teria cedido os homens que participado do ataque. Ele estava foragido e foi capturado em Garopaba, Santa Catarina.
Conforme Mario Souza, diretor do Departamento Estadual de Homicídios e Proteção à Pessoa (DHPP), de Porto Alegre, as investigações apontam que a morte de Sarah Domingues pode ter sido realizada por um grupo criminoso, da Zona Norte da capital, com o qual Maicon tem envolvimento.
“É uma pessoa inocente que morreu devido a essa violência. Esse grupo criminoso faz parte do criminoso que foi preso em Garopaba. Então, a morte da estudante da UFRGS, existem indícios fortes, de que está ligada a esse grupo criminoso da Zona Norte, que resultou em várias outras mortes durante o ano de 2023”, salienta Souza.
Homem preso por envolvimento em grupo criminoso com ação na Zona Norte de Porto Alegre
RBSTV/Reprodução
Investigação
A Polícia Civil cedeu, à reportagem da RBS TV, imagens que mostram a conduta dos criminosos.
No vídeo, é possível ver que os criminosos descem de um carro branco no meio da rua, à luz do dia, e se revezam atirando. Um homem é atingido várias vezes e morre. Um dos envolvidos nos atos de violência, segundo a polícia, foi preso dentro de um shopping de Porto Alegre.
O conflito entre os criminosos de diferentes grupos foi registrado pela polícia. Nas imagens, um homem efetua diversos disparos, sendo possível ver cartuchos de balas caindo.
A Brigada Militar e a Polícia Civil, em operação realizada no ano passado, prenderam 28 pessoas e 25 armas.
Polícia investiga grupos criminosos que estariam envolvidas em morte de estudante
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