17 de novembro de 2024

‘Gerações’: série mostra problemas que atravessam gerações em cidades do RJ

Primeiro episódio mostrou família que reúne 4 gerações de mulheres que têm dificuldades de mobilidade na Zona Oeste. ‘Gerações’: série mostra problemas que atravessam gerações em cidades do RJ
O RJ2 começou nesta terça-feira (20) a exibir uma série de reportagens sobre as eleições municipais, em que vai mostrar problemas que perduram mesmo com o passar dos anos e de diferentes gestões nas quatro cidades mais populosas do estado: Rio, São Gonçalo, Duque de Caxias e Nova Iguaçu.
A série começa na capital, falando sobre mobilidade, através da história da família Vianna, de Campo Grande. São quatro gerações de mulheres que observam os anos passarem da janela do ônibus.
Dona Conceição, garçonete aposentada da casa de shows Canecão, lembra que enfentou muitas dificuldades para, após noites de trabalho, voltar pra casa no raiar do dia em ônibus como a linha 415.
A binesta, Giulia, estudante e estagiária de educação física, sai de casa antes de amanhecer. Ela passa mais tempo nos bancos de couro dos ônibus que nos bancos escolares, em uma jornada tripla de transporte. Seis décadas separam os dois relatos, mas os problemas persistem.
“Quando eu vou pra faculdade, eu acabo pegando ali 4 conduções. E aí, no total dá por aí, umas 6, 7 horas. [Na faculdade passo] no máximo umas 3 horas. Eu levo muito mais tempo no caminho, no trajeto, do que de fato lá estudando. E isso é até um fator desanimador”, diz ela.
Ela conta que viu avanços recentes, mas ainda enfrenta problemas como a espera em pé longa antes de embarcar, falta de lugar pra sentar, além das várias baldeações.
“Aquele ônibus azulzinho antigo era desumano. As pessoas iam no ônibus com a cabeça pra fora. Era, assim, extretamente quente. Não tinha refrigeração, todo fechado, sem ar-condicionado, então assim era até muito perigoso”, lembra.
Cinco anos de vida nos ônibus
Um estudo recente mostra que ainda há muitos desafios: comprova o problema histórico na cidade do Rio de Janeiro. O aplicativo de mobilidade urbana Moovit, que monitora os transportes, aponta o Rio como a quarta pior metrópole do mundo em tempo gasto no transporte público.
O passageiro sofre antes mesmo de entrar no ônibus. Seja pela falta de abrigo no ponto, seja pelo calor, seja pela demora. Só de espera, em média, são 42 minutos em um dia.
Muita gente começa a usar o transporte público desde cedo, ainda criança, pra ir pra escola e fazer outras atividades.
Não é exagero dizer que o carioca vê uma parte da vida de dentro dos coletivos. O tempo de deslocamento médio é de uma hora e sete minutos pra ir pra faculdade, pro trabalho, etc…E mais uma hora e sete minutos pra voltar.
Ao longo da vida, são mais de dois milhões e meio de minutos. O equivalente a quase cinco anos vendo a vida passar daqui da janela – quando dá pra sentar. Nesse tempo todo, cabe um ciclo eleitoral inteiro.
De quatro em quatro anos, o carioca tem a chance de votar por diferentes projetos de cidade. Em outubro, os cariocas vão às urnas escolher prefeito e vereador, que podem planejar e executar as políticas de mobilidade, além de fiscalizar a própria prefeitura e concessionárias.
“Os investimentos no transporte público não conseguem atender transporte de massa. O município não consegue por exemplo expandir metrô, que é transporte de massa. Então, fica tudo sobre pneus. os ônibus realmente fazem grande parte do transporte no rio de janeiro. então, carece de investimentos maciços em frota, em conforto, na parte toda de climatização, regularidade, frequência, abrangência. Isso vem deixando a desejar ao longo do tempo”, diz Marcus Quintella, diretor da FGV Transportes.
Mais duas gerações de dificuldades
Giulia é a quarta geração da linhagem das Vianna a passar aperto para ir e vir. Antes dela, Dona Conceição, Dona Sônia e Vanessa passaram por dificuldades.
A mãe de Giulia, Vanessa enfrenta os mesmos problemas há mais de duas décadas. “Eu chego na Leopoldina e pego o 460 pra ir até o Leblon – eu trabalho no Hospital Miguel Couto. Ali é o caos. Eu já to no Miguel Couto há 25 anos e sempre foi assim: a gente chega no ponto, é uma fila quilométrica e o ônibus já sai do ponto final lotado”, reclama. Há 30 anos, uma reportagem do RJTV registrava esse mesmo problema no 460.
“O transporte municipal depende de planejamento, investimentos, mas numa área macro, que seria a Região Metropolitana. O transporte na cidade do Rio de Janeiro, por exemplo, ele por si só não consegue atender toda a população, porque existe a Região Metropolitana que abastece, gera e atrai transporte. Então, deveria haver uma integração intermunicipal, o que é uma situação não muito fácil de se conciliar porque são 22 municípios na Região Metropolitana”, opina Quintella.
A mãe de Vanessa e avó de Giulia, dona Sônia, agora está aposentada, mas durante muitos anos, precisava ir de Campo Grande para o Centro e improvisava uma alternativa quando o transporte alternativo não tinha nem nome.
“Às vezes tinha o pirata, aqueles ônibus de viagem que saía de linha e as pessoas comprava o piratão porque aí era a salvação, conseguia vir sentada, banco reclinado. Fora isso, a gente vinha em pé, as vezes eu pedia pro trocador – na epoca tinha o trocador – deixar eu sentar um pouquinho porque eu não tava aguentando”, lembra.
“O problema das gerações que vêm sofrendo com transporte e outras mazelas da cidade, é uma questão de planejamento e continuidade política. Eu sempre prego muito que o planejamento de transporte, ele tem que ser apolítico e apartidário. Ele tem que transcender mandatos”, acrescenta Quintella.
“Tanto minha mãe, quanto a minha vó e pode-se dizer que até a minha bisa já passaram por alguns perrengues. Campo Grande, Centro da cidade; Campo Grande, Zona Sul; porque acho que nenhuma de nós conseguimos trabalhar ali em Campo Grande mesmo, a gente sempre trabalhou nos extremos. Eu trabalho na Barra agora, minha mãe trabalha na Zona Sul e minha vó trabalhou no Centro da cidade, minha bisa também. Sempre dependendo de transporte público, acordar cedo, se antecipar pra chegar na hora”, observa Giulia.
“O eleitor tem que gravar em sua memória todos os seus problemas, suas mazelas, principalmente na área de transporte que eu posso falar, para que isso não caia no esquecimento dele próprio. Ele tem que cobrar isso ao longo do tempo, ao longo do mandato do seu vereador. Lembrar de quem que ele votou e cobrar efetivamente, seja de forma individual ou de alguma associação, de alguma forma que ele possa efetivamente mostrar que os problemas estão se agravando”, finaliza Quintella.

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