Descoberta ocorreu após pesquisadores analisarem amostra de homem que não teve sucesso em tratamentos com Anfotericina B. Caso é único na literatura científica, segundo pesquisadores. Células do sistema imune infectadas com a cepa de Leishmania amazonensis resistente à anfotericina B
Elizabeth Magiolo Coser e Bianca Alves Ferreira/Unicamp
Um estudo desenvolvido na Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) encontrou uma variante da leishmaniose resistente ao medicamento mais usado para o tratamento no país. A amostra foi retirada de um paciente, morador do Maranhão, que vinha tentando, sem sucesso, tratar a doença.
Essa foi a primeira vez que a cepa do parasita Leishmania amazonensis resistente à anfotericina B foi encontrada no Brasil. O homem de 46 anos contraiu o tipo cutâneo (tegumentar) da doença – que é transmitido por um mosquito e provoca lesões persistentes na pele.
📢 Importante: o achado não deve gerar alarde, pois apenas serve de alerta para a circulação, em locais endêmicos, de possíveis cepas resistentes e que podem precisar de outras formas de tratamento. Não há, até então, qualquer indício de que a doença esteja aumentando ou se tornando mais grave por isso, segundo os pesquisadores que conduziram o estudo.
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Paciente resistente ao tratamento
O paciente infectado é de uma área endêmica para leishmaniose – isto é, de uma região onde a doença ocorre com frequência. Segundo Adriano Cappellazzo Coelho, professor coordenador do estudo, o homem já havia sido submetido ao tratamento com anfotericina B– que é uma das poucas opções no país para tratar essa forma da doença –, mas não teve resposta.
Surgiu, então, a ideia de avaliar a cepa de forma isolada. O parasita foi levado ao laboratório e cultivado para pesquisa em modelos in vitro (em placa, de forma microscópica) e in vivo (com animais, neste caso, camundongos). O objetivo era entender como ele reagiria ao medicamento e o resultado confirmou a suspeita de resistência:
🧫 A cepa retirada do paciente foi analisada, primeiro, in vitro. Os cientistas aplicaram a anfotericina B e outros dois medicamentos para entender como o parasita reagiria;
🐀 Depois, camundongos foram infectados com a cepa retirada do paciente. Eles receberam os remédios como forma de avaliar se haveria qualquer reação e se o tratamento seria eficaz;
💊 Os resultados foram comparados e, ao fim, o estudo mostrou que não houve resposta à anfoterecina B nos casos em que a leishmaniose tinha a cepa do paciente.
🦠 A boa notícia é que a cepa não demonstrou resistência aos outros dois fármacos testados. Isto é, a doença pode ser tratada com eles.
“A novidade desse nosso estudo é que essa é a primeira demonstração experimental de uma linhagem, de um parasita circulante no Brasil resistente à anfotericina”.
Por que a descoberta é importante
A existência de uma cepa pouco comum não deve ser encarada como um problema para a população, segundo Coelho. “Na Covid, havia pessoas de uma mesma família com diferentes tipos de infecção. Tem pessoas que praticamente não tiveram sintomas e pessoas que tiveram sintomas graves. Com a leishmaniose, o estudo mostra que isso também pode acontecer”.
Apesar disso, afirma que o resultado deve chamar a atenção para a importância de ter à disposição outros tratamentos. O professor do Instituto de Biologia ressalta que a Anfotericina B é um remédio de alto custo, usado, principalmente, nos casos mais graves da leishmaniose. Por esse motivo, é limitado tem poucas alternativas a ele.
“Essa cepa pode, eventualmente, atingir outras pessoas. Esse paciente infectado continua lá naquela região e pode ser infectado de novo. Isso é preocupante, porque é uma cepa que não responde ao medicamento mais eficaz que a gente tem. A falha no tratamento da leishmaniose é um problema sério”, comenta.
O paciente que motivou o estudo foi tratado com outro medicamento, a pentamidina – que, segundo o pesquisador, é mais tóxico – e teve boa resposta. Até o final de 2023, o homem não apresentou nenhuma recaída.
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O que é a leishmaniose
A leishmaniose tegumentar ocorre nas regiões de florestas primárias e secundárias da Amazônia legal (Amazonas, Pará, Rondônia, Tocantins e Maranhão), mas também está presente no Nordeste (Bahia), Sudeste (Minas Gerais e São Paulo), Centro-oeste (Goiás) e Sul (Paraná).
De acordo com o Ministério da Saúde, é uma doença infecciosa, não contagiosa, que provoca feridas na pele e mucosas. Ela não é transmitida entre humanos, mas, sim, pela picada das fêmeas de flebotomíneos (espécie de mosca) infectadas pelo protozoário.
O diagnóstico é feito por métodos parasitológicos. O Sistema Único de Saúde (SUS) oferece tratamento específico e gratuito para a leishmaniose tegumentar. O tratamento é feito com uso de medicamentos específicos, repouso e uma boa alimentação.
Mosquito-palha costuma ser o transmissor do protozoário da leishmaniose
James Gathany/CDC
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