15 de novembro de 2024

Justiça aceita denúncia contra três servidoras do TJPB por racismo religioso

As servidoras insinuavam que a vítima perderia a guarda de seus filhos se não abrisse mão de sua religião. Fórum Criminal de João Pessoa
Divulgação/TJPB
A justiça aceitou a denúncia contra três servidoras do Tribunal de Justiça da Paraíba (TJPB) por racismo religioso. As mulheres são acusadas de discriminar uma mulher de religião de matriz africana nas dependências do poder judiciário, em João Pessoa, entre os anos 2015 e 2018. O juiz José Guedes Cavalcanti Neto, da 4ª Vara Criminal da Capital, aceitou a denúncia neste sábado (24).
De acordo com o MPPB, as servidoras trabalhavam no Setor Psicossocial do Fórum Cível da Capital, e foram identificadas como Ana Valquíria Perouse Pontes, Suênia Costa Cavalcanti e Rosângela de França Teófilo Guimarães. O g1 não conseguiu localizar a defesa das acusadas, mas o espaço permanece aberto para resposta.
A vítima, que é mãe de santo, era parte de um processo que tramita na 2ª Vara de Família de Mangabeira. Ela entrou com uma ação de regulamentação das visitas de seus dois filhos para seu ex-marido. Foi determinada a avaliação do setor psicossocial do TJPB, localizado no Fórum Cível, e ficou acordado os dias em que a mulher deveria levar as crianças ao setor, para que o genitor as visitasse.
A mulher relatou ter sido alvo de racismo religioso por parte das três servidoras, entre o período de 2015 e 2018. Segundo a vítima, as mulheres diziam frases como “chegou a macumbeira” e insinuavam que ela perderia a guarda de seus filhos se não abrisse mão de sua religião. Ela contou também que ouviu que não deveria levar as crianças para o terreiro, pois não era ‘ambiente familiar’.
De acordo com o MPPB, a vítima também denunciou outras situações de racismo, como ter sido barrada no Setor Psicossocial por estar com um vestido branco e a cabeça raspada com torço (composição da indumentária religiosa).
Os órgãos ministeriais tomaram conhecimento do caso, este ano, a partir de ofício encaminhado pela Coordenação do Núcleo de Apoio das Equipes Multidisciplinares do TJPB.
Cópias dos autos do processo foram enviadas ao TJPB para que tomem as medidas disciplinares cabíveis em relação às servidoras do Setor Psicossocial. O mesmo foi enviado para à Presidência do TJPB, cobrando a realização de capacitações dos servidores do órgão contra a intolerância religiosa e sobre letramento racial.
Ainda de acordo com o MPPB, a Presidência do TJ informou que promoveu, em julho, capacitação de servidores sobre o assunto. A Promotoria aguarda informações da Corregedoria do tribunal sobre as medidas disciplinares adotadas em relação às servidoras.
O inquérito policial
A denúncia é um desdobramento de um inquérito policial, instaurado a pedido da promotora de Justiça da Capital, Fabiana Lobo, que atua na defesa da cidadania e do Núcleo de Gênero, Diversidade e Igualdade Racial (Gedir/MPPB).
A vítima é iniciada no Candomblé, religião que segue desde criança, e, em 2015, precisou ajuizar ação de regulamentação de visitas dos filhos menores.
Segundo a investigação, a mulher sofreu racismo religioso por parte das três servidoras, que questionavam a sua religião e diziam que ela não deveria levar os filhos para “terreiro de candomblé”, porque o local não era adequado para crianças, tinha bebidas e era habitado por homossexuais e travestis, dentre outras afirmações preconceituosas e discriminatórias.
A vítima relatou à autoridade policial e ao MPPB, episódio em que chegou a ouvir uma das servidoras dizer às demais denunciadas: “chegou a macumbeira”, referindo-se a ela.
Ainda de acordo com a denúncia, em outra ocasião, a servidora impediu a vítima de entrar na sala do fórum por estar vestida com os trajes do candomblé. A mulher relata que, após o ocorrido, deixou de utilizar os trajes característicos da religião que pratica.
Em outros momentos, a denunciadas chegaram a zombar de alguns rituais próprios de sua religião, como o banho de pipoca, e diziam que só havia um Deus e que ela deveria levar seus filhos para uma igreja católica ou evangélica.
A vítima afirmou que sofreu tanto que chegou a mentir para as servidoras, dizendo que não frequentava mais os terreiros e que fechara a casa de santo, para que elas parassem, pois até mesmo suas crianças não queriam mais ir para as visitas no Fórum.
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