9 de outubro de 2024

‘O quarto ao lado’ traz mais uma bela e emocionante obra de Almodóvar; g1 já viu

Vencedor do Leão de Ouro do Festival de Veneza é o primeiro filme do diretor espanhol falado em inglês. Tilda Swinton e Julianne Moore brilham como a dupla de protagonistas Antes de “O quarto ao lado”, o espanhol Pedro Almodóvar só tinha feito filmes falados em seu idioma original. Exibido nesta sexta (4) no Festival do Rio 2024, o longa chama atenção por ser o primeiro de sua carreira gravado totalmente em inglês. O filme chega aos cinemas brasileiros no dia 24 de outubro.
Almodóvar mostra que, mesmo realizando a obra fora de seu país natal, não perdeu a essência. O cineasta mantém seu estilo a partir de belos enquadramentos, cores fortes e, principalmente, sensibilidade ao dirigir o elenco e tratar de temas complexos.
Inspirado no livro “O que você está enfrentando”, de Sigrid Nunez, o longa conta a história de Ingrid (Julianne Moore), uma escritora consagrada que descobre o adoecimento de Martha (Tilda Swinton), mulher que ela conheceu quando trabalhava em revista.
Após saber que Martha está sozinha num hospital em Nova York, distante de sua única filha, Ingrid decide retomar o contato com a amiga para confortá-la. Um dia, Martha convida a escritora para uma casa isolada de Woodstock, para onde se muda com o objetivo de melhorar a qualidade de vida. Ingrid aceita, mas sabe que, com isso, precisará lidar com uma questão que esbarra em seus valores. Mesmo com o conflito, as duas aproveitam o momento juntas para reviver o passado e compreender melhor o que poderá acontecer a partir de então.
Assista ao trailer do filme “O quarto ao lado”
Um espanhol em Nova York
O que torna “O quarto ao lado” uma experiência tocante é a maneira que Pedro Almodóvar conduz o filme. O cineasta deixa de lado seu jeito provocador e exuberante para criar uma obra mais intimista. Ao mesmo tempo, ele dá ao público a emoção necessária para uma conexão com a história e suas personagens.
Como poucos, o diretor sabe falar do universo feminino em todas as suas formas. Em “O quarto ao lado”, Almodóvar se aproxima de seu filme “Tudo sobre minha mãe” (1999), mas surge de maneira mais sofisticada. Ele usa o mesmo argumento do longa para revelar melhor a alma das protagonistas num momento difícil de suas vidas.
Alguns fãs podem estranhar a condução mais contida adotada pelo espanhol. Mas não se engane: o filme continua puro Almodóvar.
Martha (Tilda Swinton) e Ingrid (Julianne Moore) numa cena de ‘O quarto ao lado’
Divulgação
Ao aceitar fazer um filme totalmente falado em inglês, Almodóvar se cercou de alguns de seus habituais colaboradores para não perder seu estilo tão conhecido entre os cinéfilos. Apesar do longa ter fotografia assinada por Eduard Grau, que trabalha com o diretor pela primeira vez, ela possui as mesmas características de outras obras do espanhol, com cores básicas e intensas, além de belos enquadramentos — alguns remetem a obras de Ingmar Bergman, como “Persona”.
Fora isso, o filme tem uma emocionante trilha sonora assinada mais uma vez pelo habitual colaborador do cineasta, Alberto Iglesias. A produção é de seu irmão, Augustin Almodóvar.
Esses elementos mostram que, mesmo com uma produção “hollywoodiana”, Almodóvar não “se vendeu” e mantém o que acredita para contar suas histórias de maneira original.
Mesmo que seu roteiro não traga maiores novidades, ele surpreende por lidar com temas pesados, como a perda de um ente querido, com um inusitado humor que pode fazer o espectador se surpreender por rir em momentos que poderiam ser mais densos. Mesmo assim, eles não diminuem a importância ou a urgência que a trama exige.
Ingrid (Julianne Moore) sofre por sua amiga numa cena de ‘O quarto ao lado’
Divulgação
Prova de amizade
Mas o grande mérito de “O quarto ao lado” está na dupla de atrizes que protagonizam o filme de forma arrebatadora. Tilda Swinton comove com sua entrega para interpretar Martha, tanto na parte física quanto na parte psicológica. Seu corpo mostrar os efeitos da doença da personagem, enquanto sua atuação alterna entre serenidade e inconformidade, como geralmente acontece com pessoas que têm os problemas de saúde da protagonista.
Além disso, Swinton surpreende ao mostrar um timing cômico que surge em momentos inesperados e até mesmo originais.
Porém, é Julianne Moore quem tem o trabalho mais difícil do filme, já que sua Ingrid precisa lidar com as questões complexas que envolvem sua relação com Martha, especialmente diante do sofrimento da amiga.
Moore emociona e conquista a empatia do espectador, ao mostrar que a personagem quer estar forte para não decepcionar a companheira mesmo quando não é possível. Traço de humanidade que, certamente, surgiria em qualquer um que se encontrasse na mesma situação da personagem.
Julianne Moore e Tilda Swinton numa cena do drama ‘O quarto ao lado’, de Pedro Almodóvar
Divulgação
Com interpretações tão brilhantes, não seria injusto considerar que as duas artistas “empataram” com suas atuações.
O elenco também conta com a boa participação de John Turturro (o Carmine Falcone do “Batman”), que surge como Damian, um homem que fez parte do passado das duas amigas e que ajuda Ingrid a entender melhor os desejos de Martha. Almodóvar usa o personagem para fazer críticas ambientais e dá ao ator algumas das falas mais interessantes do filme.
Com tantas qualidades, “O quarto ao lado” levou o Leão de Ouro do Festival de Veneza de 2024 e pode surgir em outras premiações importantes, especialmente no final do ano.
Não seria injustiça se a obra de Almodóvar chegasse a ser lembrado para o Oscar 2025. Seria um ótimo começo do diretor em solo americano. E não seria nada ruim se ele voltasse a fazer filmes em inglês mais vezes.
Cartela resenha crítica g1
g1

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