13 de outubro de 2024

Órgãos transplantados com HIV: JN descobre irregularidade no laudo de doador

O número do registro que aparece no carimbo de assinatura dos exames de sangue não é da biomédica indicada, mas de uma profissional que nunca atuou no Laboratório PCS Saleme e que não exerce mais a profissão. Órgãos transplantados com HIV: JN descobre irregularidade no laudo de doador
Reprodução/Jornal Nacional
Depois que seis pacientes transplantados receberam órgãos infectados com HIV no Rio, a assinatura de um dos laudos gera mais uma dúvida. A profissional que atestou que um dos doadores não tinha o vírus usou um registro que não era dela, mas de uma biomédica que não atua mais na área.
O registro que aparece no exame de sangue de um dos doadores de órgãos é mais uma questão a ser esclarecida no escândalo de saúde.
A assinatura é da biomédica Jaqueline Iris Bacellar de Assis e atesta que o doador não tem o vírus HIV. O número do registro de Jaqueline que aparece no laudo é CRBM 4125. Com esse número, o registro é inexistente, mas no carimbo aparece mais um zero no final: CRBM 41250.
A produção do JN descobriu que o número do registro que aparece no carimbo de assinatura de Jaqueline Iris Bacellar de Assis não pertence a ela. O registro é de uma outra biomédica, que nunca atuou no Laboratório PCS Saleme e que não exerce mais a profissão.
O número pertence a Júlia Moraes de Oliveira Lima, biomédica que se formou no Recife (PE), onde mora, e que trabalhou em São Paulo. Ela conta que deixou de pagar o Conselho de Regional de Biomedicina há 3 anos.
“Ele tá inativo por falta de anuidade. Eu trabalhava em coleta domiciliar de DNA pra teste de paternidade. Então, em laboratório, em análise clínica, eu nunca nem trabalhei. Eu fiquei muito chateada porque é uma coisa tão séria, é uma coisa tão triste que tanta gente tá passando consequências gigantescas na vida de outras pessoas e é horrível saber que eu tô sendo vinculada a uma história dessa, que eu literalmente não tenho nada a ver”, disse Júlia.
Dois doadores de órgãos, uma mulher e um homem, com laudos negativos para HIV, emitidos pelo Laboratório PCS Saleme, infectaram seis pessoas com o vírus.
A vigilância sanitária interditou unidades do laboratório e, em uma delas, encontrou 39 irregularidades.
Os fiscais pediram a numeração dos testes realizados e a nota fiscal de compra dos kits, para analisar se tinha havido algum erro de fabricação do lote, mas o PCS Saleme não apresentou os documentos comprovando a compra dos itens. A polícia vai investigar se os testes realmente foram feitos.
O Ministério da Saúde, o Ministério Público do Rio, o Conselho Regional de Medicina e a Polícia Federal também estão apurando o caso.
O laboratório foi contratado pelo governo do estado do Rio para fazer exames de sangue em doadores de órgãos para a central estadual de transplantes e atendia em outras dez unidades de saúde. O contrato previa, em média, 73 mil testes por mês.
A Secretaria Estadual de Saúde reforçou que o PCS Saleme não faz mais nenhum teste pro sistema de saúde do Rio e disse que não há indícios de falhas em exames feitos em outras unidades.
“Todos os exames de nossas unidades são realizados por outros laboratórios, não há nenhuma ação mais desse laboratório citado. Existe todo um corpo clínico que avalia e acompanha cada resultado de exame, em avaliação esses pacientes. Então casa haja alguma não conformidade, em relação ao exame e ao caso clínico desse paciente, essa equipe avalia, monitora e repete esses exames se necessário”, afirma Cláudia Mello, secretária estadual de Saúde do Rio de Janeiro.
Dois dos sócios do laboratório, Matheus Vieira e Walter Vieira, são parentes do ex-secretário estadual de saúde, Doutor Luizinho, agora deputado federal pelo PP. A empresa foi contratada três meses depois da saída de Doutor Luizinho da secretaria.
Depois que as atividades do laboratório foram suspensas, o governo do estado decidiu contratar outra empresa para prestar os mesmos serviços. Será uma contratação emergencial, sem licitação.
O documento assinado pela diretora administrativa financeira da Fundação Saúde considerou a urgência e os riscos que podem ser gerados pela paralisação dos serviços e deixou claro que um outro contrato, que segue as regras da Lei de Licitação, está em andamento.
O que dizem os envolvidos
O Laboratório PCS Saleme disse que usou kits recomendados pela Anvisa e pelo Ministério da Saúde, que dará suporte médico e psicológico aos pacientes infectados e que está à disposição das autoridades que investigam o caso. O laboratório afirmou também que está analisando o caso de Jaqueline Iris Bacellar de Assis, que usou o número de um registro que não é dela através de uma sindicância interna.
Em nota, o Conselho Regional de Biomedicina disse que Jaqueline de Assis não tem registro como biomédica. Nós tentamos contato com Jaqueline, mas ela não foi encontrada.
O ex-secretário de Saúde, Doutor Luizinho, disse que jamais participou da contratação do PCS ou de qualquer outro laboratório.

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