16 de outubro de 2024

Órgãos infectados por HIV: ‘Houve uma falha de controle operacional na qualidade dos testes para obter lucro’, diz secretário

Segundo as investigações, houve uma determinação para passar de diário para semanal o controle das amostras. Polícia detalha operação contra laboratório que emitiu laudos negativos para HIV
A fim de lucrar, o PCS Lab Saleme deliberadamente afrouxou o controle dos órgãos para transplantes. A afirmação é do delegado Felipe Curi, secretário estadual da Polícia Civil do RJ, em coletiva sobre a Operação Verum, deflagrada nesta segunda-feira (14) para tentar prender 4 investigados no caso dos transplantes de órgãos infectados pelo HIV.
“Houve uma falha de controle operacional na qualidade dos testes de HIV, tudo isso para obter lucro”, afirmou o secretário Felipe Curi.
Seis pessoas que estavam na fila do transplante da Secretaria Estadual de Saúde do RJ receberam órgãos infectados pelo vírus de 2 doadores e agora testaram positivo para o HIV. O governo culpa o PCS Lab Saleme.
O delegado André Neves, titular da Delegacia do Consumidor, emendou: “Houve uma quebra do controle de qualidade, visando à maximização de lucro e deixando de lado a preservação e a segurança da saúde dos testes.”
“Os reagentes precisavam ser analisados sistematicamente, diariamente, e houve uma determinação, que estamos apurando, para que fosse diminuída essa fiscalização de forma semanal. E essa lacuna, você flexibiliza e aumenta a chance de ter algum efeito colateral — esse efeito devastador que nós estamos analisando”, descreveu.
Os policiais não deram detalhes de como o afrouxamento supostamente aumentou os lucros do laboratório nem esclareceram se há a possibilidade de nenhum teste ter sido realizado de fato.
A Operação Verum
Polícia Civil prende sócio de laboratório responsável pela contaminação de transplantados com HIV
Até a última atualização desta reportagem, 2 homens tinham sido presos. Um deles é Walter Vieira, sócio do PCS Lab Saleme, ginecologista, responsável técnico do laboratório e signatário de um dos laudos errados. Vieira ainda é tio do deputado federal Doutor Luizinho (PP), que foi secretário de Saúde do RJ.
O segundo preso é Ivanilson Fernandes dos Santos, técnico de laboratório contratado pelo PCS para fazer análise clínica no material que chegava da Central Estadual de Transplantes.
Os alvos dos mandados de prisão são investigados por:
crime contra as relações de consumo;
associação criminosa;
falsidade ideológica;
falsificação de documento particular
infração sanitária.
Os advogados que representam o laboratório PSC Lab Saleme informaram que os sócios da empresa “prestarão todos os esclarecimentos à Justiça” (leia mais abaixo).
Na última sexta-feira, Doutor Luizinho afirmou em nota que lamenta o ocorrido e que deseja que os responsáveis pelos erros que causaram as infecções sejam punidos (veja a íntegra da nota mais abaixo).
Agentes da Delegacia do Consumidor (Decon) também começaram a cumprir nesta segunda-feira 11 mandados de busca e apreensão, expedidos pelo Plantão Judiciário do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro.
A sede do PCS Lab Saleme, em Nova Iguaçu, na Baixada Fluminense, teve de ser arrombada pelos policiais. O local estava interditado desde a semana passada.
Polícia diz que grupo criminoso falsificou laudos
“As investigações indicam que os laudos, falsificados por um grupo criminoso, foram utilizados pelas equipes médicas, induzindo-as ao erro, o que levou à infecção dos pacientes. Um dos pacientes veio a falecer, com as causas da morte ainda sob investigação”, disse a Polícia Civil.
A polícia investiga se o PCS Lab Saleme falsificou laudos em outros casos além dos transplantes. A unidade atendia outras 10 unidades de saúde estadual.
“Diversas diligências complementares estão sendo realizadas para identificar toda a cadeia de profissionais envolvidos nesse esquema criminoso, e todos serão prontamente responsabilizados na medida da sua respectiva culpabilidade”, informou a Decon.
Policiais arrombaram a porta para entrar no laboratório PCS Lab Saleme.
Reprodução/ TV Globo
O que diz o laboratório
Os advogados do laboratório PCS Lab Saleme divulgaram a nota abaixo:
“A defesa de Walter e Mateus Vieira, sócios do PCS Lab Saleme, repudia com veemência a suposta existência de um esquema criminoso para forjar laudos dentro do laboratório, uma empresa que atua no mercado há mais de 50 anos. Ambos prestarão todos os esclarecimentos à Justiça.”
O que diz o Doutor Luizinho
Na última sexta-feira (11), quando o caso veio à tona, o ex-secretário de Saúde Doutor Luizinho divulgou a nota abaixo:
“Conheço o Laboratório Saleme há mais de 30 anos, dirigido pelo Dr Montano e posteriormente por seu Filho Dr Valter Viera (casado com a irmã da minha mãe, Ana Paula) e suas irmãs. Lamento veementemente o ocorrido, desejando ao fim das investigações punição exemplar para os responsáveis por esses gravíssimos casos de infecção.
Enquanto Secretário de Estado de Saúde , mantive a mesma equipe do Programa Estadual de Transplantes da gestão anterior e jamais participei da contratação deste ou de qualquer outro Laboratório.
É muito triste como um dos maiores defensores do Transplantes no País, cuja minha vida pública está marcada pela ampliação do número de transplantes no Estado, ver casos graves como esse! Espero punição aos responsáveis, independente de quem for.”
Entenda o escândalo
Seis pessoas que estavam na fila do transplante da Secretaria Estadual de Saúde do Rio de Janeiro (SES-RJ) receberam órgãos infectados pelo HIV de dois doadores e agora testaram positivo para o vírus.
Segundo o governo do estado, o erro foi em dois exames do PCS Lab Saleme, que liberou órgãos de dois doadores que tinham HIV para a fila dos transplantes:
Em janeiro, a família de um homem autorizou a remoção do coração, dos rins, das córneas e do fígado. O receptor do coração e as duas pessoas que receberam um rim cada testaram positivo para o vírus. Quem ganhou a córnea não foi infectado, e o destinatário do fígado morreu logo após a cirurgia.
Em maio, parentes de uma mulher doaram o fígado e os rins, e os três receptores testaram positivo.
A unidade privada foi contratada pela SES-RJ em dezembro do ano passado, em um processo de licitação via pregão eletrônico no valor de R$ 11 milhões, para fazer a sorologia de órgãos doados.
O caso veio à tona na última sexta-feira (11). Desde então, o g1 publicou as seguintes reportagens:
PCS Saleme é de primo do ex-secretário de Saúde Dr. Luizinho;
Sócios de laboratório foram condenados por falso positivo em exame;
Gestão da Central de Transplantes não foi consultada sobre contratação;
Biomédica diz que teve registro usado sem autorização;
Laboratório não possui registro no Conselho Regional de Farmácia;
“É como se o chão se abrisse, a minha vida mudou”, diz receptora.
Investigações:
Ministério da Saúde, Polícia, MP, Secretaria e Cremerj apuram contaminação;
Polícia Federal vai investigar caso de pacientes que receberam órgãos com HIV;
MP vai apurar se houve irregularidade na licitação de laboratório;
MPRJ recomenda que Hemorio fique responsável pelos exames.

Mais Notícias