17 de outubro de 2024

‘O aprendiz’ conta história de Donald Trump como se fosse a origem de um supervilão; g1 já viu

Incomum e deliberadamente perturbador, filme estrelado por Sebastian Stan narra ascensão de ex-presidente americano como empresário nos anos 1970 e 1980. Os Estados Unidos até podem estar divididos se Donald Trump merece mais uma oportunidade como presidente do país – mas, em “O aprendiz”, sua ascensão como empresário nos anos 1970 e 1980 é narrada com a história de origem de um supervilão.
O filme que estreia nesta quinta-feira (17) nos cinemas brasileiros é menos cinebiografia do que o retrato da formação de um monstro.
Com um tom incomum, que mistura produção de baixo orçamento e estudo de personagem obcecado, é deliberadamente – e deliciosamente – perturbador.
Todas as escolhas – desde o visual granulado oitentista e a trilha exagerada até a escalação do galã Sebastian Stan (o Soldado Invernal dos filmes da Marvel) como o protagonista – são feitas para incomodar.
Afinal, pelo menos para o diretor iraniano Ali Abbasi (que disputou a Palma de Ouro em Cannes com “Holy Spider”) e o roteirista Gabriel Sherman (biógrafo de Roger Ailes, outra figura conservadora controversa) o importante é a provocação. Talvez inspirados pela filosofia do próprio Trump.
Depois das duas horas de duração, é difícil cravar que o filme é bom. Instável e com longos períodos arrastados (em especial nas ausências do sempre incrível Jeremy Strong), “O aprendiz” nem sempre se sustenta como narrativa. Mas provoca.
Assista ao trailer de ‘O aprendiz’
Amigo, estou aqui
No filme, Strong (“Succession”) interpreta Roy Cohn (1927-1986), advogado poderoso e inescrupuloso que se torna mentor de um jovem (ou pelo menos mais jovem) Trump, antes da construção de seu império imobiliário (e subsequente queda).
A relação da dupla – e os ensinamentos de pretensa implacabilidade que fariam o mais ousado dos coaches atuais suar – é a alma da obra.
As atuações abraçam o potencial de caricatura dos retratados e conseguem evitar imitações fáceis, sempre no limite das paródias semanais do “Saturday Night Live”.
“O aprendiz” retrata as desventuras criminosas dos dois como algo inerente ao capitalismo e ao “sonho americano”, com um contraste desesperador entre o nível de suas atitudes patéticas e de seu sucesso.
É como assistir, indefeso, a um golpista medíocre roubar descaradamente em um jogo de cartas marcadas enquanto celebra o próprio talento.
A cumplicidade é tão importante que o filme sofre exatamente na inevitável superação de Cohn pelo seu pupilo. Sem o advogado e a evolução constante do protagonista, o ritmo fica estagnado e por um bom tempo o fim parece nunca se aproximar.
Sebastian Stan e Maria Bakalova no filme ‘O aprendiz’
Divulgação
O grande incômodo
Essa versão de Trump tem tudo para revoltar os fãs do ex-presidente, é claro. Patético no começo, bajulador no meio e um criminoso confesso ao final, o agora político não passa por uma jornada de redenção.
Do outro lado do espectro, no entanto, não é como se o filme fosse celebrado. Além da infame (e, de certa forma, gratuita) cena em que o protagonista estupra sua primeira mulher (Maria Bakalova), é possível questionar o timing do lançamento, no meio de uma das corridas presidenciais mais acirradas da história americana.
No entanto, “O aprendiz” nunca parece muito preocupado em atingir algum objetivo complexo escondido. Desde o começo, seu propósito é incomodar. E nisso, pegando emprestado a megalomania do biografado, é o melhor que existe.
O maior e mais bonito e mais elegante incômodo do mundo – ou do ano, pelo menos.

g1
Sebastian Stan em cena de ‘O aprendiz’
Divulgação

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