Aliança conservadora CDU/CSU será a maior força no Parlamento alemão, cacifando-se para nomear o próximo chefe de governo: Friedrich Merz. Merz é casado com Charlotte, uma juíza, há mais de 40 anos.
AFP via BBC
Vitória da aliança conservadora de Merz, derrota retumbante dos social-democratas de Scholz, e um em cada cinco votos depositados na ultradireitista AfD. O que isso significa para o país? A aliança conservadora CDU/CSU será a maior força no Parlamento alemão, cacifando-se para nomear o próximo chefe de governo: Friedrich Merz.
“Ganhamos esta eleição”, celebrou o candidato a chanceler federal e líder da União Democrata Cristã (CDU). Mas a empolgação não era tão grande na sede do partido, em Berlim. De olho nas difíceis costuras para a formação de uma coalizão de governo, os conservadores esperavam um desempenho melhor, acima dos 30% – mas ficaram com cerca de 28%.
Como não têm maioria para governar sozinhos, os conservadores precisam buscar parceiros de coalizão. A Alternativa para a Alemanha (AfD), que ficou em segundo lugar com quase 21%, poderia servir – do ponto de vista matemático.
Um em cada cinco eleitores apoia a sigla de ultradireita, que é monitorada pelos órgãos de inteligência alemã e tem alguns de seus diretórios reconhecidos como “extremistas” por serem potenciais ameaças à ordem democrática.
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“Dobramos de tamanho! Queriam nos cortar pela metade, e aconteceu o contrário”, gabou-se a candidata e co-líder da AfD, Alice Weidel. Segundo ela, só com a ajuda da AfD é que CDU e CSU poderiam pôr em prática suas promessas de campanha, como o fim da imigração irregular. “Nossa mão sempre estará estendida para uma participação no governo, para realizar a vontade do povo, a vontade da Alemanha.”
Mas os conservadores foram categóricos ao descartar, ainda durante a campanha, uma aliança com a AfD. “Temos concepções bem diferentes, por exemplo na política externa, na política de segurança, em muitas outras áreas, no que diz respeito aos temas União Europeia, Otan e euro”, repetiu Merz na noite da eleição. “Pode estender a mão como quiser”, disse, dirigindo-se a Weidel na TV.
Weidel retrucou prometendo que a AfD, como maior bancada de oposição, fará pressão. “Vamos perseguir os outros, para que façam política séria pelo nosso país”, ameaçou.
União promete mudança de rumo no governo
Além do desempenho fraco da economia, o principal tema da campanha foi a política de asilo e refúgio do país.
“Sentimos a insegurança dos alemães”, afirmou o chefe da União Social Cristã (CSU), Markus Söder, ao explicar o sucesso da AfD. As pessoas já não teriam mais certeza de que os conservadores vão cumprir suas promessas e, por isso, elas apelam à AfD. “Faremos de tudo para organizar uma mudança de rumo na Alemanha”, assegurou.
Na lista de possíveis parceiros de coalizão estão o Partido Social Democrata (SPD), do chanceler derrotado Olaf Scholz, e os Verdes, que compuseram o governo anterior.
SPD e Verdes estão digerindo os resultados – especialmente amargos para os social-democratas, que com cerca de 16% tiveram sua pior performance desde 1890. “É um resultado amargo”, admitiu Scholz. “Devastador e catastrófico”, definiu o ministro da Defesa dele, Boris Pistorius.
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Scholz, um chanceler sem sorte
Scholz é o único chanceler federal dos últimos 50 anos a perder uma reeleição. Seu governo de coalizão com os Verdes e o Partido Liberal Democrático (FDP) não durou três anos – colapsou em novembro de 2024, após uma briga sobre a administração do Orçamento.
Até a formação de um novo governo, Scholz seguirá chanceler interino; depois disso, ele diz que só vai querer ser parlamentar.
O SPD não foi o único punido nas urnas. O FDP também perdeu feio, não atingiu os 5% e não fará mais parte do próximo Bundestag (a câmara baixa do parlamento alemão); seu líder, Christian Lindner, anunciou depois da derrota que deixará a política.
As perdas dos Verdes não foram tão dramáticas assim. Seu principal candidato, Robert Habeck, falou em “resultado eleitoral respeitável”. “Não fomos tão duramente punidos, mas queríamos mais e não alcançamos isso”, lamentou. Mas disse que o partido está aberto ao diálogo com os conservadores para a formação de uma coalizão.
Triunfo do A Esquerda
O partido A Esquerda (Die Linke) protagonizou uma reviravolta surpreendente entre as siglas menores nas eleições e garantiu, com mais de 8% dos votos, seu lugar no Bundestag. Mas os conservadores já haviam descartado uma coalizão com eles antes mesmo da eleição, assim como com a sigla populista de direita Aliança Sahra Wagenknecht (BSW), dissidência do A Esquerda.
Independentemente de quão complicadas as negociações de coalizão possam se tornar, o próximo governo enfrentará enormes desafios. E, dada a quantidade de tarefas, ele tem que ser formado rapidamente, avisou Merz: “O mundo lá fora não espera por nós, nem espera por longas e detalhadas conversas e negociações de coalizão.”
Segundo o líder conservador, a Alemanha precisa recuperar rapidamente sua capacidade de ação, “para que possamos estar presentes novamente na Europa e que o mundo reconheça: a Alemanha é governada de forma confiável novamente”. E para que isso dê certo, argumenta a CDU, o acordo de coalizão tem que ser elaborado como um “quadro geral”, e não como uma proposta de governo detalhada.
Rombo bilionário no Orçamento
O maior desafio do novo governo deve ser o financiamento do Orçamento. A arrecadação tributária já não basta mais para cobrir todos os custos do Estado. Despesas militares crescentes, a reforma da infraestrutura, a transição energética – tudo isso consome bilhões. A isso soma-se a maior crise econômica da Alemanha desde a reunificação.
A eleição foi a primeira desde a invasão russa da Ucrânia, em fevereiro de 2022. Desde então, o governo federal apoiou Kiev com cerca de 28 bilhões de euros. Isso faz da Alemanha o segundo maior apoiador da Ucrânia, atrás somente dos Estados Unidos.
As coisas mudaram desde que Donald Trump voltou à Casa Branca; o novo governo americano deu as costas para a Europa. De Washington chega o recado de que, daqui para a frente, cabe à Europa ajudar a Ucrânia e cuidar mais de sua própria Defesa.
Expectativas internacionais
Para o novo governo, isso significa que ele terá que definir prioridades – principalmente se a Alemanha quiser voltar a ter o peso político que a CDU invocou na campanha.
“Precisamos assumir de novo um papel de liderança na Europa; não de cima para baixo, mas com a França, com a Polônia, com uma União Europeia forte”, disse o secretário-geral da CDU, Carsten Linnemann, pouco antes da eleição à emissora ARD.
Além das iniciativas diplomáticas, isso demandará grandes esforços financeiros. O maior ponto contencioso nas negociações para a formação de um governo de coalizão deve ser de onde tirar esse dinheiro: endividamento ou corte de gastos? Há diferenças principalmente entre os conservadores e os social-democratas.
E o freio da dívida?
A Constituição alemã determina que o governo não pode gastar mais do que arrecada. Há exceções em casos emergenciais, como catástrofes naturais e grave crise econômica. SPD e Verdes dizem que é impossível evitar novas dívidas. Merz, da CDU, discorda: ele aposta no crescimento da economia e quer cortar benefícios sociais – algo inaceitável para o SPD. Já os Verdes resistem a cortes na proteção climática.
O novo Parlamento terá que assumir até 25 de março, no mais tardar. O mandato de Scholz – e portanto seu governo – termina oficialmente com a sessão inaugural do Bundestag, mas continua em caráter provisório caso não haja um novo governo até lá.