19 de setembro de 2024

Afegãos acampados no Aeroporto de Guarulhos à espera de abrigo ficam 20 dias sem conseguir tomar banho: ‘É falta de humanidade’, diz voluntária

Até esta sexta-feira (8) estavam 60 pessoas, entre elas crianças e idosos, aguardando acolhimento, segundo Coletivo Frente Afegã; prefeitura fala em 20 pessoas no local. Afegãos no Aeroporto de Guarulhos
Reprodução/TV Globo
Os afegãos que estão acampados no saguão do Aeroporto Internacional de São Paulo, em Guarulhos, à espera de vagas em abrigos, enfrentam dificuldades para conseguirem tomar banho com frequência, segundo informou ao g1 a voluntária Aline Sobral, do Coletivo Frente Afegã.
Até esta sexta-feira (8) eram 60 imigrantes, entre crianças e idosos, conforme o coletivo.
“Não é reivindicação de direito, é dever. Temos pactos internacionais sendo violados. Banho é dignidade humana. As pessoas estão ficando, em média, 15, 20 dias sem banho. Conseguimos ontem [quinta-feira (7)] que eles tomassem banho por uma ação de banho com voluntários, mas está cada vez mais difícil”, enfatizou Aline Sobral.
Afegãos no Aeroporto de Guarulhos à espera de abrigo enfrentam dificuldade para banho
Ainda segundo Aline, outro local disponibilizado foi uma mesquita em Suzano. Eles tiveram que ir de trem.
“Não deu certo. A CPTM foi atenciosa e acolhedora, mas foi cansativo para os idosos. O mau cheiro gerou desconforto para eles e para os usuários, infelizmente”.
E complementou: “Não tem abrigo em Guarulhos que nos atenda para o banho. Pedimos ajuda na prefeitura e eles não dispuseram o ônibus. O vestiário [do aeroporto] é dos funcionários e não é obrigação deles, pois ali não é local para viver. Conseguimos em Arujá, em um retiro evangélico, mas ônibus para levar todo mundo é R$ 800 e não temos arrecadação”, disse.
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Em 4 de janeiro deste ano, dois casos de escabiose, doença popularmente conhecida como sarna, foram registrados entre os afegãos. Em junho de 2023 houve surto da doença no local. Ao menos 20 imigrantes foram detectados com sarna.
Em nota, a prefeitura afirmou que no momento não são 60, mas 20 afegãos aguardando acolhimento no aeroporto, e negou que o grupo fica 20 dias sem tomar banho.
“Não confere a informação de que eles estão há vinte dias sem banho, já que eles chegaram nos últimos dias. Existe apenas uma mulher solteira que está no aeroporto desde o dia 9 de fevereiro, mas ela não aceita sair do local”.
“Com frequência a Secretaria de Desenvolvimento e Assistência Social solicita auxílio na questão dos banhos para a GRU Airport. A pasta irá inclusive reforçar a solicitação e verificar a possibilidade de uma ação para a próxima semana. A Prefeitura de Guarulhos também não se responsabiliza pelos itens pessoais dos afegãos”.
Sobre o transporte, a prefeitura afirmou que os voluntários que atuam no aeroporto não solicitaram em nenhum momento a parceria referente ao transporte.
Promessa de abrigo com 300 vagas
Gilberto Nascimento, Secretário do Desenvolvimento Social, afirmou nesta sexta-feira (8) que o governo estadual vai inaugurar em breve um complexo na Região Metropolitana de São Paulo para acolher os afegãos. O local poderá atender até 300 pessoas.
“Estamos em vias de entregar mais um lugar com possibilidade de 300 vagas. Já temos o local, que está em reforma. Será na Grande SP para fazermos o deslocamento, a prefeitura está ciente, já conversamos com prefeito para fazer esse acolhimento”.
“A verba do governo federal está vindo e começamos a adaptar esse espaço novo, como pintura, telhado, com essa verba federal. A manutenção já será feita pelo governo estadual”.
Afegãos voltam a ocupar saguão do Aeroporto de Guarulhos
Fim de 2023
Em 26 de novembro eram 170 pessoas acampadas, sendo 45 crianças. A TV Globo esteve no aeroporto naquele dia e constatou que as barracas voltaram a se espalhar pelo terminal.
Em agosto, o g1 mostrou que os afegãos que chegaram ao Brasil demoraram um ano para conseguirem comprar as passagens com destino a São Paulo.
“Dentro do aeroporto a gente não essa estrutura básica. Tem alguns vestiários do aeroporto que são dos funcionários. Então, a gente tem uma dificuldade de locomovê-los para fora para tomar banho em outros locais”, afirmou Ana Paula Pinhati Oliveira, vice-presidente da Organização de Resgate dos Refugiados Afegãos.
Afegãos acampados em Aeroporto Internacional de São Paulo, em Guarulhos
Reprodução/TV Globo
A alimentação está sendo fornecida pela prefeitura de Guarulhos de segunda a sexta feira. Já aos finais de semana são as ONGs que levam as marmitas.
Uma das possibilidades estudadas pelas autoridades era um abrigo em Franco da Rocha com capacidade para 150 pessoas. Contudo, o governo do estado de São Paulo informou que “não se viabilizou por questões técnicas”.
“Quando vai acabar este tormento? Desde 30 de junho todos se reuniram e Franco da Rocha iria receber, mas o governo estadual barrou. As ajudas humanitárias estão escassas”, afirma Aline Sobral, do Coletivo Frente Afegã.
Concessão de visto temporário e autorização de residência
Afegãos no Aeroporto Internacional de São Paulo, em Guarulhos
Reprodução/TV Globo
Em 26 de setembro, o governo federal publicou no Diário Oficial da União uma portaria prorrogando a concessão de visto temporário ou autorização de residência para acolhida humanitária de afegãos que desejam viver no Brasil. A medida prolonga autorização concedida em setembro de 2021.
Segundo a portaria, o visto ou autorização de residência serão concedidos devido à instabilidade institucional e violações de direitos humanos registradas no Afeganistão desde que o Talibã retomou o poder no país, em agosto de 2021.
No caso dos afegãos que desejam vir ao Brasil e ainda não deixaram o país de origem, o governo restringiu para 2 as possibilidades do pedido de um visto temporário em outros países: agora, deve ser solicitado nas Embaixadas do Brasil em Teerã (Irã) e Islamabade (Paquistão).
Em setembro de 2021, o Itamaraty autorizou a concessão dos vistos em 5 embaixadas: Teerã, Moscou (Rússia), Ancara (Turquia), Doha (Catar) e Abu Dhabi (Emirados Árabes Unidos) para processar os pedidos de visto “para acolhida humanitária”.
O documento terá prazo de validade de 180 dias. O governo disse que a emissão dos vistos estará condicionada à capacidade da oferta de abrigo dos afegãos no país.
Afegãos no Brasil
Afegãos no Aeroporto de Cumbica, em Guarulhos
Fábio Tito/g1
O g1 acompanha desde 2022 a chegada dessas famílias afegãs ao aeroporto. Eles começaram a entrar no país quando as tropas americanas encerraram os 20 anos de intervenção militar no Afeganistão e o grupo extremista Talibã voltou ao poder.
O governo brasileiro publicou em setembro de 2021 uma portaria estabelecendo a concessão de visto temporário, para fins de acolhida humanitária, a cidadãos afegãos. Um ano após a portaria, a reportagem do g1 conversou com famílias que tinham acabado de entrar no Brasil em busca de liberdade e recomeço (veja vídeo e fotos mais abaixo).
Em 2022, o Alto Comissariado das Nações Unidas para os Refugiados (Acnur) atendeu 1.035 afegãos. A maioria era composta por homens entre 18 e 59 anos (490) e mulheres na mesma faixa etária (248). Dessas 738 pessoas, 50,4% possuem formação universitária e 6,5% são pós-graduadas.

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