22 de setembro de 2024

Ameaças de Elon Musk de descumprir decisões judiciais brasileiras provocam novas reações

Presidente do Supremo diz que o STF vai continuar a proteger as instituições e que empresas que atuam no país estão sujeitas à Constituição Federal. Presidente do Congresso afirma que é inevitável regulamentar as redes sociais. Ameaças de Elon Musk de descumprir ordens judiciais brasileiras provocam novas reações
Os presidentes do STF – Supremo Tribunal Federal e do Congresso Nacional criticaram nesta segunda-feira (8) as ameaças do bilionário sul-africano Elon Musk de descumprir decisões judiciais brasileiras.
O presidente do STF, ministro Luís Roberto Barroso, usou a página oficial da Corte. Ele escreveu:
“Travou-se recentemente no Brasil uma luta de vida e morte pelo Estado Democrático de Direito e contra um golpe de Estado, que está sob investigação nesta Corte com observância do devido processo legal. O inconformismo contra a prevalência da democracia continua a se manifestar na instrumentalização criminosa das redes sociais. O Supremo Tribunal Federal atuou e continuará a atuar na proteção das instituições, sendo certo que toda e qualquer empresa que opere no Brasil está sujeita à Constituição Federal, às leis e às decisões das autoridades brasileiras. Decisões judiciais podem ser objeto de recursos, mas jamais de descumprimento deliberado. Essa é uma regra mundial do Estado de Direito e que faremos prevalecer no Brasil”.
A nota foi uma resposta a uma ameaça feita pelo empresário Elon Musk de descumprir decisões da Justiça brasileira. No sábado (6), em sua própria rede social – X, o antigo Twitter -, Musk questionou o ministro Alexandre de Moraes.
“Por que você está exigindo tanta censura no Brasil?”
E ameaçou reativar contas no X bloqueadas por desrespeitar a legislação, mesmo que, segundo ele, isso custasse o fechamento da empresa no Brasil e prejudicasse o lucro.
Alexandre de Moraes é relator de inquéritos no STF, como o das milícias digitais – que investiga ações para disseminar mentira e minar a democracia – e o de 8 de janeiro – sobre a tentativa de golpe por apoiadores de Jair Bolsonaro. Durante as apurações, o Moraes determinou o bloqueio de contas de investigados que difundiam informações falsas ou incitavam o golpe.
No domingo (7), Musk voltou a atacar Moraes e a ameaçar liberar as contas suspensas. Até o momento, não cumpriu a ameaça. As contas seguem restritas.
Horas depois, o ministro Alexandre de Moraes, sem que tenha havido manifestação da Procuradoria-Geral da República, incluiu o empresário entre os investigados no inquérito das milícias digitais por, em tese, dolosa instrumentalização criminosa da provedora de rede social X, e determinou abertura de uma investigação contra ele para apuração das condutas em relação aos crimes de obstrução à Justiça, inclusive em organização criminosa e incitação ao crime.
Na decisão, Moraes disse que “as redes sociais não são terra sem lei e nem terra de ninguém”; que “os provedores de redes sociais devem absoluto respeito à Constituição Federal, à lei e à jurisdição brasileira”; e determinou que se Musk descumprir a ordem da Justiça – por exemplo, reativando perfis bloqueados -, a rede social X estará sujeito a multa diária de R$ 100 mil por perfil e responsabilidade por desobediência à ordem judicial dos responsáveis legais pela empresa no Brasil.
Em entrevista à GloboNews, o cientista político Pablo Orttelado lembrou que a suspensão de contas na rede social ocorreu para impedir fake news durante os ataques ao processo eleitoral, mas ponderou que essas decisões talvez não sejam adequadas ao momento atual.
“O problema é que quando a gente passou a suspender, quando a Justiça brasileira passou a suspender contas, ela passou a fazer um método que pode ser lido como censura, censura prévia, porque você não está tirando algo que foi publicado no passado, mas você está tirando uma conta achando, pressupondo, que aquela pessoa que está reiteradamente fazendo publicações ilícitas vai seguir fazendo no futuro. Eu acho que a gente precisa discutir um pouco esse protagonismo que o STF e o TSE assumiram no momento de crise. Foi muito necessário naquele momento, mas está se tornando cada vez menos necessário, à medida que as pessoas envolvidas no 8 de janeiro estão sendo processadas, estão sendo julgadas e tenho certeza que serão punidas”, diz.
PL das Redes Sociais: entenda o que texto diz sobre conteúdo criminoso e cumprimento de ordens judiciais
As ameaças de Elon Musk reacenderam a discussão sobre a importância da regulação das redes sociais. Um projeto de lei que tramita no Congresso Nacional quer impedir ataques à democracia e a desinformação do meio digital. Para isso, propõe, entre outras coisas, co-responsabilizar as redes sociais por conteúdos criminosos publicados por usuários.
O projeto foi aprovado pelo Senado em 2023, mas não andou na Câmara. O relator, deputado Orlando Silva, do PCdoB, disse que pediu aos líderes dos partidos para que o projeto volte à pauta.
“Porque quando você não tem regra, há quem se beneficie da falta de regra. E quem crê que se beneficia hoje com a falta de regra não quer que haja regra alguma”, afirma Orlando Silva.
O advogado-geral da União, Jorge Messias, publicou na rede X que se reuniu com a Comissão Interamericana de Direitos Humanos, em Washington, nos Estados Unidos, e que denunciou o recente ataque coordenado pela extrema direita transnacional contra a democracia brasileira; que anunciou que, muito em breve, o Estado brasileiro apresentará propostas concretas e contundentes, com alcance internacional, na luta contra o discurso de ódio, a desordem informacional e o extremismo que alimenta o lucro fácil de muitas redes sociais. Segundo ele, as bigs techs precisam prestar contas e respeitar a legislação dos países onde operam; que no Brasil, a liberdade de expressão é sagrada, mas não existe imunidade digital para cometimento de crimes.
O presidente do Congresso, Rodrigo Pacheco, do PSD, defendeu a aprovação de regras claras.
“São regras para o uso dessas plataformas digitais para que não haja captura de mentes de forma indiscriminada e que possa manipular desinformações, disseminar ódio, disseminar a violência, disseminar ataques a instituições. Há um papel cívico que deve ser exercido pelas plataformas digitais, de não permitir que esse ambiente seja um ambiente de vale tudo. Eu espero que a Câmara dos Deputados possa evoluir, ainda que com alterações naquilo que foi feito no Senado, para poder termos uma lei, uma lei federal que discipline essas plataformas digitais no Brasil”, afirma.
O ministro Alexandre de Moraes comunicou a decisão à Procuradoria-Geral da República nesta segunda-feira (8) para que ela se manifeste sobre o caso.
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