Do gênero Cratosomus, nova espécie de inseto possui coloração e tamanho muito semelhantes aos de uma rã-flecha venenosa. Estratégia de imitar ajuda a evitar predadores. À direita, rã-flecha venenosa Ameerega trivittat. À esquerca, o besouro do gênero Cratosomus que mimetiza a rã
Luís Felipe Toledo e Erika Schulz
No grupo dos anfíbios, um sapo, rã ou perereca com cores muito vivas é quase sempre um sinal de alerta. Isso porque cores brilhantes e contrastantes sinalizam aos potenciais predadores a presença de toxinas ou outros perigos, uma estratégia conhecida como aposematismo.
A novidade é que os cientistas descobriram uma nova espécie de besouro que “se aproveita” dessa estratégia de defesa dos anfíbios ao mimetizar a Ameerega trivittata, uma rã-flecha venenosa de coloração preta e verde.
Rã-flecha Ameerega trivittata, espécie venenosa que ocorre na floresta amazônica
Ubiratã Ferreira Souza
O novo besouro pertence ao gênero Cratosomus, o mesmo do besouro broca-da-laranjeira (Cratossomus flavofasciatus), mas ainda não possui nome científico ou popular. A descoberta foi publicada na revista Boletim Herpetológico em março de 2024.
O que é mimetismo?
O biólogo e mestrando em Ecologia da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) Ubiratã Souza, um dos autores do artigo, explica que mimetizar nada mais é do que imitar outro animal para se beneficiar de algum modo.
Besouro do gênero Cratosomus descoberto na Amazônia, em 2019
Erika Schulz
“Um caso comum ocorre com as espécies que têm uma coloração de advertência. Elas têm uma cor que diz ‘olha, eu sou perigoso, eu sou aposemática’. E elas têm, de fato, um veneno que ocasiona algum perigo para quem tenta comê-la, por exemplo”, explica Ubiratã.
“Nesse caso, existem algumas espécies que imitam esses padrões de cor para poder se aproveitar dessa mensagem passada e evitar predadores. Ainda que, por vezes, os imitadores não sejam necessariamente perigosos”, acrescenta ele.
A presença ou não de perigo nas espécies que mimetizam se traduz em dois tipos de mimetismo: batesiano (no qual apenas o modelo é tóxico) e o mülleriano (no qual tanto o modelo quanto seu imitador são tóxicos).
Primeiro caso entre insetos e anfíbios
Mas voltando ao novo besouro, os cientistas ainda não sabem se ele é tóxico ou não, sendo assim não é possível dizer a qual mimetismo ele pertence.
O que se sabe até o momento é que tanto a rã-flecha como o besouro tem tamanhos semelhantes (cerca de 4 cm de comprimento), ambas foram encontradas na Amazônia (na cidade de Puerto Misahualli, província de Napo, leste do Equador) com suas respectivas populações.
Capacidade de ‘imitar’ cor e tamanho de rã venenosa ajuda o inseto a evitar predadores
A possible case of insect-frog mimicry
“O gorgulho usava o mesmo microhabitat de A. trivittata e foi encontrado andando na vegetação a 50 cm do solo e no solo”, escrevem os autores no artigo A possible case of insect-frog mimicry.
De acordo com Luís Felipe Toledo, professor da disciplina de Vertebrados do curso de Biologia da Unicamp e também autor do artigo, o tipo batesiano de mimetismo é o mais comum na natureza.
“Esse é o primeiro caso de um anel mimético entre insetos e anfíbios, não tem outro que eu saiba. É impressionante porque, na verdade, é uma coisa que a gente esperaria que tivesse. Devem ter outros casos, então acho que essa publicação pode estimular as pessoas a procurar outros casos”, diz o professor universitário.
Luís Felipe acrescenta que esse anel mimético pode trazer benefícios ao besouro relacionados a predadores que enxergam cores, como as aves, que poderiam evitar o padrão de coloração dele e da rã. Mas isso não descarta a possibilidade de outros grupos animais também evitarem o padrão.
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