27 de dezembro de 2024

‘Brasil mudou o rumo da minha vida’, diz dentista que deixou Síria como refugiado para realizar sonho de se formar na Unicamp

Sameh Brglah, de 31 anos, deixou país de origem para fugir da guerra civil e recomeçar a vida longe dos conflitos no Oriente Médio. Cirurgião vive em Piracicaba (SP), interior paulista. Dentista Sameh Brglah, sírio naturalizado brasileiro, no consultório odontológico onde trabalha em Piracicaba.
Sameh Brglah/Arquivo pessoal/Reprodução
Naturalizado brasileiro, o cirurgião-dentista Sameh Brglah, de 31 anos, chegou ao país como refugiado sírio em 2015, depois de passar pelo Líbano, Jordânia, Turquia e Malásia . Na bagagem, tinha lembranças de casa, o sonho de continuar os estudos e de se formar na faculdade. Ainda sem conhecer a cultura e de não falar o idioma da nação que o abrigaria, apostou na chance de recomeçar a vida longe da guerra civil que já matou mais de 400 mil pessoas na Síria.
A conquista chegou alguns anos depois. Morador de Piracicaba (SP) , no interior paulista, há quase uma década, ele se formou em odontologia pela Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), em 2023, e trabalha na área atualmente. – O g1 contou o início da história de Sameh no Brasil, de quando ainda era estudante na graduação. 👉Clique aqui e saiba como tudo começou.
Os sonhos do Sameh, agora, são outros. “Quero abrir meu consultório própria e continuar crescendo na carreira profissional”, declarou g1.
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“Após longo processo entre revalidar documentos e solicitar vaga na Unicamp, fui aprovado no curso de odontologia em uma vaga de estrangeiro. Apesar das dificuldades com o curso e a língua, consegui avançar com o passar dos anos até me formar, em julho 2023. Foi uma grande conquista na minha vida. Passei anos fora da Síria sonhado essa formação. Foi muito emocionante e satisfatório. […] O Brasil representou pra mim uma grande oportunidade de mudar o rumo da minha vida, um novo começo de vida longe da guerra da Síria, os conflitos e inseguranças do Oriente Médio”, contou.
Piracicaba
Desde 2019, Piracicaba recebeu 13.721 imigrantes e 264 refugiados, de acordo com dados da Polícia Federal.
A delegacia regional da Polícia Federal em Piracicaba na cidade teve 200 pedidos de visto para imigrantes e nove refugiados em maio de 2024, sendo a quarta unidade do estado em número de processos para estrangeiros. Entre as nacionalidades em que há mais solicitações, estão coreanos, haitianos, sul-africanos, colombianos e venezuelanos.
Para Sameh, que foi naturalizado brasileiro em 2022, Piracicaba é a cidade onde ele fez amigos a quem chama de “família do coração”.
“Piracicaba representou pra uma abrigo e uma casa nova com a convivência agradável com a comunidade. O povo tem sido muito receptivo e acolhedor comigo e sinto que tenho muita sorte por ter me encontrado nessa cidade linda. Gosto e planejo me manter vivendo aqui, pois me senti bastante à vontade”, comenta o dentista.
Nos últimos oito anos, Sameh foi o único aluno refugiado graduado no campus da Faculdade de Odontologia (FOP) da Unicamp em Piracicaba (SP).
Dentista Sameh Brglah, de 31 anos, se formou na Unicamp em 2023.
Sameh Brglah/Arquivo pessoal/Reprodução
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‘Fuga’ do exército
Aos 18, Sameh deixou a capital Damasco para não ter que servir ao exército, função obrigatória para os rapazes quando atingem essa idade, e lutar contra seu próprio povo. Na guerra entre o governo, rebeldes, radicais islâmicos e países estrangeiros, milhares de civis foram mortos.
Sameh queria continuar o curso de direito, que já tinha iniciado na capital da Síria. Seguiu para a Turquia, mas não deu certo.
“A adaptação foi difícil, inclusive para aprender a língua deles”, disse. Mas o principal motivo de não permanecer no país estrangeiro, segundo o jovem na época, foi por não conseguir meios para ingressar em uma faculdade. “Não tinha oportunidade. Cheguei a tentar administração de empresas também”, relatou.
Sameh Brglah na festa de formatura em odontologia da FOP-Unicamp, o campus da Universidade Estadual de Campinas em Piracicaba.
Sameh Brglah/Arquivo pessoal/Reprodução
Novas lembranças do passado
Sameh chegou ao Brasil, aos 23 anos, após obter visto pelo consulado na Turquia. Na primeira conversa com o g1, em 2016, sobre como era viver na Síria em meio a guerra civil e que futuro enxergava para os jovens da terra natal, o dentista foi direto.
“Não vejo futuro para os jovens da Síria”, disse. “Em um país em guerra, não há como ter desenvolvimento. Onde existe violência, não tem espaço para a liberdade de pensamento e muito menos para mudança”, disse.
Passados oito anos, a resposta para a mesma pergunta é incerta, mas parece não carregar o pessimismo, esperado e óbvio, da realidade de um país em guerra. “Sendo sincero.. não tenho resposta sólida [sobre o futuro dos jovens Síria]”, afirma em tom de brevidade.
Sameh é refugiado sírio no Brasil e escolheu o campus da Unicamp.
Claudia Assencio/Arquivo g1/Reprodução
Infância
Diferente da primeira entrevista, em 2016, o dentista, agora, já pensa em retornar à Síria – “para visitar”, esclarece. As experiências de acolhimento que teve no Brasil talvez possam despertar outras lembranças do lugar onde nasceu, que não mais a guerra apenas. Sem ter muito contato com familiares, atualmente, o desejo de voltar se explica pelas memórias afetivas.
“[…] pretendo retornar para reencontrar meus familiares a amigos e visitar os lugares que tenho saudade de ver. As ruas antigas de Damasco onde parava pra comprar os doces e comidas tradicionais de lá. Algumas cafeterias antigas. A casa dos meus pais. E a “casa” de internato do meu ensino médio”, listou.
Com orgulho, Sameh, sabe que pode se alegrar dos caminhos que trilhou. “Sou pessoa bem mais madura, com mentalidade diferente, com mais coragem e garra. Consegui conquistar coisas que nunca imaginei ter conquistado algum dia. Cheguei em lugares nunca pensei que irei estar”, celebrou.
Sameh Brglah deixou a Síria em busca de uma vida melhor no Brasil.
Claudia Assencio/Arquivo g1/Reprodução
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