3 de outubro de 2024

Brasileiros contam como foi para fugir de aldeias bombardeadas no Líbano: ‘Vimos bombas caindo ao longo do caminho’, diz jovem

A jovem Amena Yehia Atwi, de 20 anos, e Mohamed Atwi, de 33, deixaram suas casas, no Sul do Líbano, com medo de serem atingidos e foram para o Norte do país. Ambos os trajetos não levariam mais do que 1h30, mas chegaram a 12h. Brasileiros fogem de aldeias bombardeadas no Líbano
Reprodução
Uma viagem de cerca de 80 quilômetros que poderia ser feita em pouco mais de 1 hora se tornou um dos trajetos mais traumáticos e tristes de milhares de pessoas do Sul do Líbano que tentavam escapar de mais um bombardeio de Israel no país. Famílias levaram mais de 12 horas na estrada.
Os brasileiros Amena Yehia Atwi, de 20 anos, e Mohamed Atwi, de 33, fugiram de suas aldeias em direção ao norte do país durante o ataque do dia 23 de setembro, há pouco mais de uma semana, que deixou mais de 500 mortos em um só dia.
A família de Amena levou mais de 8 horas para conseguir chegar no Norte e encontrar um lugar para ficar.
“Vimos bombas caindo ao longo do caminho e famílias com crianças dormindo na beira da estrada, sem abrigo ou segurança. O medo foi constante, não sabíamos se conseguiríamos achar a um lugar para ficar. A cada som de explosão ou qualquer barulho, o medo aumentava”, relata a jovem.
Brasileiros fogem de aldeias bombardeadas no Líbano
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“Saímos sem saber para onde ir, sem um lugar para ficar. Fomos a várias aldeias diferentes em busca de um lugar para nos abrigar. Passamos por escolas, igrejas e mesquitas que estavam abertas para pessoas deslocadas e fugindo, mas todas estavam cheias”, conta.
A jovem lembra ainda que eles tentaram alugar apartamentos ou casas, mas todos os locais estavam lotados.
“Pensamos que teríamos que dormir em nossos carros, mas, no último minuto, graças a Deus, conseguimos encontrar um lugar seguro para ficar”, relembra ela.
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Brasileiros fogem de aldeias bombardeadas no Líbano
Reprodução/Mohamed Atwi
Mohamed conta que dirigiu por mais de 12 horas até conseguir chegar na casa da irmã, em Beirute, capital do Líbano.
“Imagina ficar 12 horas dirigindo na rua, as bombas caindo por todos os lados, você nem sabe em qual segundo uma bomba vai cair no seu carro com a sua família dentro. Foi muito perigoso, passamos por uma interseção e logo depois que passamos caiu uma bomba”, conta Mohamed.
Brasileiro conta como foi fugir de cidade bombardeada no Líbano
Ele lembra que a situação na estrada era crítica. Em determinado momento, grupos começaram a fazer sanduíches para distribuir entre as famílias que estavam presas no trânsito.
“Tem pessoas que precisam de oxigênio, mulheres grávidas, crianças e bebês nessa situação. Foi um dia horrível. Graças a Deus eu tinha dinheiro, mas muitas pessoas saíram sem nada”, relembra.
Brasileiros fogem de aldeias bombardeadas no Líbano
Reprodução/Mohamed Atwi
Medo intenso e constantes sons de bombas
Os dois brasileiros, que têm origem libanesa mas nasceram em Foz do Iguaçu, ressaltam que o medo era e continua sendo constante. Mesmo em locais agora considerados seguros, eles se sentem temerosos de que o conflito continue escalonando. Nos últimos dias, o subúrbio de Beirute já foi atacado.
O dia do ataque ao Sul do Líbano, sobretudo, foi o mais traumático para as famílias.
“Eu estava na minha casa com a minha família. As bombas estavam caindo por todo lado, bem perto da minha casa. Era uma cidade que achávamos que era segura, mas uma bomba caiu a 200 metros da minha casa e quebrou todos os vidros da casa. Começamos a correr, saímos com algumas roupas, passaporte e documentos”, conta Mohamed.
Na região de Beirute onde ele está é comum ver drones de Israel sobrevoarem o local, segundo ele.
“Chegando em Beirute, esse grupo terrorista começou a atacar Beirute bem perto de onde minha irmã mora, onde estamos. Você não imagina o barulho das bombas todos os dias, nem imagina o medo que as crianças têm. Essa situação vai demorar muito a passar. O melhor é fazer esse projeto de repatriação”, destaca o homem.
‘Vivenciamos um trauma inesquecível’, diz jovem
Uma amiga de Amena e toda sua família, que moravam na mesma aldeia, foram mortos no dia do ataque, enquanto a jovem e seus familiares fugiam para o Norte.
“Na segunda-feira, 23 de agosto, foi o dia mais traumático da minha vida. Eu e minha família, assim como muitos outros, vivenciamos um trauma inesquecível. Acordamos ao som de bombas caindo perto da nossa aldeia. As explosões eram incessantes, destruindo casas e vidas ao nosso redor”, conta Amena.
“O barulho das explosões era ensurdecedor, e a cada bomba a casa tremia. Ninguém conseguiu dormir naquela noite com medo de que a próxima bomba nos atingisse ou que alguém próximo a nós fosse ferido. A cada explosão, levantávamos nossas mãos acima das cabeças, como se isso pudesse nos proteger, em um gesto de medo tentando nos manter a salvo”, continua ela.
“Passamos o dia e a noite ouvindo e vendo as explosões, enviando mensagens a amigos, rezando para que respondessem e que ainda estivessem vivos”, relembra.
Brasileiros fogem de aldeias bombardeadas no Líbano
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Para os próximos dias, Amena tem esperança de que um acordo de cessar-fogo seja feito, mas entende que a repatriação ao Brasil também é uma opção.
“Não temos certeza do que está por vir. Embora estejamos mais seguros agora, ainda ouvimos bombas e bombas sônicas. A maioria das aldeias no Sul ainda está sendo bombardeada todos os dias, e não podemos voltar para o sul porque não é seguro. Não é fácil deixar nossa aldeia e tudo para trás”, diz a jovem.
“Temos esperança de voltar para casa, para o lugar onde uma vez nos sentimos seguros e onde guardamos todos os nossos momentos e memórias preciosas. Queremos voltar para nossa aldeia, onde estiveram todos os nossos amigos e familiares”, afirma Amena.
A família de Mohamed já recebeu o formulário do consulado para preencher as informações da repatriação.
“Nessa guerra ninguém tem certeza qual cidades são seguras”, conclui ele.
O governo brasileiro anunciou nesta terça-feira (1º) que vai iniciar a repatriação de ao menos 3 mil brasileiros que estão no Líbano. O governo estima que 21 mil brasileiros morem no país — formando a maior comunidade brasileira no Oriente Médio.
O primeiro avião da operação estava a caminho de Beirute nesta quarta (2).

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