19 de outubro de 2024

Câmara aprova Dia da Conscientização da Dor Crônica; demora no diagnóstico é principal desafio para pacientes

No mundo, um em cada cinco adultos sofre de dor, e 1 em cada 10 adultos é diagnosticado com dor crônica a cada ano, de acordo com dados da International Association for the Study of Pain. A Câmara dos Deputados aprovou nesta quarta-feira (16) a criação do Dia Nacional de Conscientização e Enfrentamento da Dor Crônica, a ser comemorado em todo dia 5 de julho. O projeto também define que os cursos da área de saúde devem ter disciplinas obrigatórias sobre a dor crônica.
O projeto é de autoria da deputada Bia Kicis (PL-DF) e foi relatado pela deputada Adriana Ventura (Novo-SP). A proposta segue para análise do Senado.
No mundo, um em cada cinco adultos sofre de dor, e 1 em cada 10 adultos é diagnosticado com dor crônica a cada ano, de acordo com dados da International Association for the Study of Pain.
Um dos principais desafios de quem sente dor crônica é identificar essa condição. “A dor era enxergada como um sintoma secundário de outra condição, mas hoje ela passou a ser vista como uma condição por si só, mas os profissionais ainda estão muito incapacitados para fazer esse diagnóstico”, diz Lívia Teixeira, farmacêutica-bioquímica PhD e pós-doutoranda em dor, criadora do projeto De Bem Com a Fibro.
Lívia só descobriu ter fibromialgia por trabalhar na área farmacêutica e ter se identificado ao ler sobre a doença. “Eu era uma pessoa que sempre tinha dor, mas nunca tinha uma explicação. E aí eu entendi que fazia parte da minha vida isso”, diz.
“Eu tenho dor desde criança e tive o diagnóstico com 24 anos. E isso porque eu fui atrás, porque eu trabalhava com medicamento para fibromialgia em uma farmacêutica. Eu descobri isso lá, porque nenhum medicamento me falou. Isso é uma coisa que poucas pessoas vão ter a oportunidade”, afirma.
Entenda o que é a dor crônica e como tratá-la
Pacientes com dor crônica frequentemente relatam um estigma sobre sua condição e afirmam que constantemente são questionados se realmente estão com dor durante momentos de lazer, por exemplo.
“As pessoas têm uma ideia de dor como dor aguda. Mas quando você tem uma dor crônica você aprende a conviver com ela, porque se não você não faz nada. Mas as pessoas não entendem isso”, diz Lívia. “A pessoa que tem dor crônica vai ficar mais reclusa nos momentos de crise, mas nos outros momentos ela também está lidando com sintomas.”
Rômulo Marques, neurocirurgião e chefe da central de dor do Instituto Neurológico de Goiânia, diz que o diagnóstico tardio impacta diretamente na capacidade de tratamento. “Quanto mais passa o tempo, maior a chance de sensibilização central, mecanismo genético de expressão de receptor que resulta em uma dor mais difícil de ser tratada”, diz. “É como se fosse uma memória dolorosa, isso vai se impregnando no sistema nervoso central.”
Com isso, é fundamental que os profissionais sejam bem capacitados para identificar a dor crônica.
Ensino sobre dor crônica
O projeto originalmente estabelecia que os cursos na área da saúde tenham disciplinas voltadas para a dor crônica. Este ponto, entretanto, foi retirado pela relatora Adriana Ventura, por essa ser uma prerrogativa do Conselho Nacional de Educação e do Ministério da Educação.
O Congresso recomendará então ao Ministério da Saúde que implemente o tratamento da dor crônica nas diretrizes dos cursos de saúde.
“Eu acho fundamental incluir uma disciplina de dor nos cursos”, diz Lívia Teixeira. “Sei que na prática vai demorar um pouco para a gente ver os resultados disso como sociedade, mas fazer esse movimento é como se a gente dissesse: isso importa, vocês precisam saber disso, porque sem isso vocês são profissionais incompletos.”
O projeto de lei também estabelece que em maio seja realizada a campanha “maio roxo”, de conscientização sobre a fibromialgia. Atualmente, o Dia Nacional de Conscientização e Enfrentamento da Fibromialgia é comemorado, anualmente, no dia 12 de maio.
Com o mês de campanha, o objetivo é que as pessoas se conscientizem sobre o direito ao tratamento adequado e o acesso à assistência farmacêutica, bem como sobre os benefícios das práticas complementares para o tratamento.
Segundo o neurocirurgião Rômulo Marques, as dores complexas dependem de um trabalho transdisciplinar. Esses tratamentos podem incluir psicólogos, fisioterapeutas, cirurgiões e também tratamentos alternativos. “A interação desses grupos levam a uma eficácia maior. Estudos sustentam que quando o paciente é submetido a equipe transdisciplinar, ele tem maior sucesso.”
A enfermeira e acupunturista Patrícia Lucas trabalha diariamente com práticas complementares para tratamento de dor crônica. “O paciente com dor crônica passa por muitos médicos. Ele chega no consultório falando: ‘já fiz de tudo e não sei mais o que fazer’. Mas o caminho deveria ser o oposto, as práticas integrativas podem caminhar juntas com o tratamento tradicional”, afirma.
Segundo ela, uma das principais consequências da dor crônica é a hipervigilância, ou seja, o excesso de atenção que o paciente dá para a dor que sente. O pensamento constante sobre essa situação impacta diretamente na qualidade de vida do paciente, que molda sua rotina para comportar esse novo componente de dor.
O Sistema Único de Saúde (SUS) oferece tratamentos alternativos para a dor, as chamadas Práticas Integrativas e Complementares (PICS). Entre elas, estão a acupuntura, auriculoterapia, aromaterapia, entre outras.
Segundo Patrícia, nem todas as terapias são eficientes para todos os pacientes. “Cada pessoa tem uma sensibilidade específica e uma resposta específica.”
Para além das possibilidades de tratamentos, Rômulo Marques destaca uma ação fundamental em todos os casos. “O principal fator de sucesso é a informação. A equipe tem que ter informação e o paciente tem que ter informação também, porque uma vez que ele entende que todas as etapas são importantes para a vida dele, ele tem uma adesão maior e ele evolui maior.”

Mais Notícias