Militares são suspeitos de matar pelo menos sete pessoas para se livrarem de provas relacionadas ao assassinato do empresário Fábio Alves Escobar Cavalcante. Mensagens foram extraídas de aparelhos encontrados com os investigados. Fábio Alves Escobar Cavalcante foi morto a tiros em Anápolis
Reprodução
Uma troca de mensagens entre policiais militares investigados por uma série de assassinatos mostra que eles simulavam confrontos para justificar as mortes. Os militares são suspeitos de matar pelo menos sete pessoas para se livrarem de provas relacionadas ao assassinato do empresário Fábio Alves Escobar Cavalcante, em 2021, em Anápolis, a 55 km de Goiânia.
“Quero confronto, só mais um, depois ‘nóis’ para”, escreveu um dos policiais.
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Um documento obtido pelo repórter Honório Jacometo mostra a troca de mensagens feita em 2021 pelos policiais. As mensagens foram extraídas a partir de uma decisão judicial de celulares que foram encontrados com policiais militares investigados.
Nos aparelhos, é possível ver que nos dias em que seis das vítimas morreram, os policiais informações do suposto confronto em um grupo de divulgação de ocorrências da Polícia Militar. O g1 entrou em contato com a Polícia Militar, mas não obteve retorno até a última atualização desta reportagem.
Conforme a denúncia do MP contra os policiais, para encobrir o crime contra Fábio Escobar, foram mortos: Bruna Vitória Rabelo Tavares, Gabriel Santos Vital, Gustavo Lage Santana, Mikael Garcia de Faria, Bruno Chendes, Edivaldo Alves da Luz Junior e Daniel Douglas de Oliveira Alves.
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Relatório policial
No documento de 84 páginas é explicado que os policiais criaram um grupo para tratar de ocorrências de supostos confrontos. Na conversa entre os militares é possível ver que eles combinavam versões desses confrontos.
A suspeita é que as pessoas que foram assassinadas tenham sido mortas em uma espécie de “queima de arquivo” feita por esses militares para que a investigação não chegasse nos policiais envolvidos na morte do empresário Fábio Escobar.
Foram mencionados no relatório da Polícia Civil, os seguintes policiais.
Glauko Olivio de Oliveira – preso pela morte de Fábio Escobar;
Marcos Jesus Rodrigues;
Thiago Marcelino Machado – preso pela morte de Fábio Escobar;
Wembleyson Azevedo Lopes;
Jhonatan Ribeiro de Araújo;
Marco Aurélio Silva Santos;
Rodrigo Moraes Leal;
Os policiais Almir Tomás de Aquino Moura, Erick Pereira da Silva e Adriano Azevedo Souza, que foram investigados no caso, não são mencionados no relatório. O g1 não conseguiu localizar a defesa de Almir, Marcos Aurélio, Adriano, Jhonatan e Rodrigo. A reportagem entrou em contato com a defesa dos demais militares, mas não teve retorno até a última atualização desta reportagem.
Delegacia de Repressão às Ações Criminosas Organizadas em Goiânia
Thauany Melo/g1 Goiás
Troca de mensagens
Logo no início do documento, policiais combinam o que seria relatado sobre a ocorrência que aconteceu na BR-060, em agosto de 2021. Nesta ocorrência, morreram três pessoas: Gabriel Santos Vital, Gustavo Lage Santana e Mikael Garcia de Faria.
“Lembrem, o mais importante da ocorrência é o arquivamento, as demais coisas são consequências […]. Vamos alinhar os pensamentos para todos conversarem na mesma língua”, completou.
O relatório ainda mostra um policial narrando o suposto confronto a um superior (não envolvido no caso). Nessa ocasião, o investigado sugere que “foi o autor de pelo menos um dos homicídios”.
Nas mensagens, um outro agente diz que “para que todos tenham a chance de serem promovidos”, preparou uma “linha de depoimento da equipe de inteligência até o momento do acidente”. A versão do suposto confronto enviada aos agentes pelo policial em questão é chamada de “versão da diagonal sobre o acidente”.
Essa versão justifica que as vítimas (que eles dizem ser “indivíduos faccionados e armados” que estavam “levando drogas a Goiânia”) teriam provocado um acidente com uma das viaturas da ocorrência. Além disso, diz que, ao verem os militares, as vítimas teriam fugido para uma mata e atirado contra os agentes, motivando o confronto.
“Ficou top”, comentou um policial, ao ler a versão em questão.
Mensagens trocadas entre policiais investigados por uma série de assassinatos em Goiás
Reprodução
Conversas realizadas em 2022 ainda mencionam a participação de uma escrivã da Polícia Civil, que seria responsável por passar informações do inquérito policial aos militares investigados.
“A escrivã acabou de me ligar e falar que nosso inquérito vai demorar mais um pouco para ser finalizado. Que o delegado pegou hoje ele para olhar e solicitou várias diligências”, informou um dos PMs.
O g1 solicitou a Polícia Civil uma nota sobre essa suposta escrivã que estaria colaborando com os agentes investigados, mas não obteve retorno até a última atualização desta reportagem.
Ainda em 2022, no mês de maio, o inquérito policial foi arquivado. Por mensagens, os policiais comemoraram o arquivamento.
“Agora é meritória”, disse um dos policiais, se referindo a uma possível promoção por “ato de bravura”.
“Aleluia”, comentou outro.
Já em dezembro de 2022, dois dos policiais investigados falam sobre um “possível alvo” para “trabalhar”.
“Ele é nosso. A gente não pode perder esse bicho”, escreveu um dos militares.
Já em conversas realizadas em 2023, os policiais ainda mencionam a prisão do Thiago Marcelino Machado, que ocorreu em setembro, explicando que iriam visitá-lo.
Prisão de policiais
Em uma operação da Polícia Civil em 2023, 10 policiais militares foram presos na operação que investiga assassinatos em Anápolis e Terezópolis de Goiás.
Na denúncia realizada pelo Ministério Público, uma testemunha chegou a dizer que o policial Glauko Olivio de Oliveira “plantou” uma arma de fogo, utilizada para matar Bruna Vitória Rabelo Tavares, com a finalidade de atribuir a autoria do homicídio dela aos outros amigos mortos no suposto confronto – Gabriel Santos Vital, Gustavo Lage Santana e Mikael Garcia de Faria.
O grupo de policiais é suspeito também de coletar informações prévias sobre as vítimas, como fotografia da placa de carro e localização em tempo real. Eles faziam o monitoramento e tinham até equipamento de rastreamento eletrônico, que foi colocado no carro de uma das vítimas.
Segundo as conversas de Marco Aurélio Silva Santos, Thiago Marcelino Machado e Adriano Azevedo Souza, os policiais militares envolvidos executaram um dos confrontos no período noturno, horário em que a rua ficaria com menos movimento de pessoas e carros.
Jorge Caiado e Cacai Toledo
Jorge Caiado (à esquerda), Carlos César Savastano Toledo, conhecido como Cacai (meio), e o empresário morto a tiros, Fábio Alves Escobar Cavalcante (lado direito)
Reprodução/TV Anhanguera
O assessor da Assembleia Legislativa (Alego), Jorge Luiz Ramos Caiado virou réu por participar do assassinato do empresário Fábio Alves Escobar Cavalcante. A denúncia do Ministério Público argumentou que Caiado era aliado do ex-presidente do Democratas, Carlos César de Toledo, conhecido como Cacai, denunciado como mentor intelectual do crime. A investigação concluiu que Escobar foi assassinado após denunciar desvios de dinheiro na campanha eleitoral de Cacai, em 2018.
Em nota, a assessoria jurídica de Jorge Caiado informou que, após o aditamento da denúncia, a defesa enfrentou dificuldades para acessar os elementos de prova, e ressaltou o uso de depoimentos dissidentes e matérias jornalísticas pelo Ministério Público, o que é repudiado por Caiado.
A denúncia ainda diz que, movidos por vingança, Caiado e Cacai teriam se reunido, em fevereiro de 2019, com o Coronel Benito Franco Santos, então comandante da Ronda Ostensiva Tática Metropolitana (Rotam). Eles teriam dito que Escobar estaria ameaçando Cacai e que a única forma de resolver seria “só matando”, conforme a denúncia.
Segundo a denúncia, o coronel se recusou a participar da “empreitada” e, então, Caiado e Cacai ainda se reuniram com o ex-chefe da Casa Militar, Coronel Newton Nery Castilho, para buscar apoio para “exterminar Fábio Escobar”. Conforme o documento, Castilho também negou a proposta e declarou que não era “jagunço”.
Apesar das negativas, Caiado e Cacai mantiveram o plano e, para cumpri-lo, aliciaram os policiais militares denunciados como executores do crime, que, segundo a denúncia, após o assassinado do empresário, receberam promoções por “ato de bravura” em confronto policial com resultado morte.
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