9 de outubro de 2024

Caso Zé Maria do Tomé: Acusado de matar ambientalista que lutava contra agrotóxicos vai a julgamento 14 anos depois

Zé Maria do Tomé foi morto a tiros em abril de 2010. Ele atuava contra a pulverização aérea de agrotóxicos em Limoeiro do Norte, no interior do Ceará. Líder comunitário e ambientalista cearense José Maria Filho, conhecido como Zé Maria do Tomé
Melquíades Júnior/SVM
Mais de 14 anos depois, o assassinato do líder comunitário José Maria Filho, o Zé Maria do Tomé, vai ser levado a júri popular nesta quarta-feira (9) no Fórum Clóvis Beviláqua, em Fortaleza. Zé Maria foi morto com 25 tiros no município de Limoeiro do Norte, no interior do Ceará, por conta de sua atuação contra a prática de pulverização aérea de agrotóxicos.
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O réu, acusado de envolvimento na morte de Zé Maria, é o agricultor Francisco Marcos Lima Barros. Conforme a investigação, Marcos Lima teria repassado ao executor do crime informações sobre a localização e hábitos de Zé Maria, para ajudar na emboscada.
Diante disso, o Ministério Público do Ceará (MPCE) denunciou Marcos Lima por homicídio qualificado por motivo torpe, meio cruel e com recurso que dificultou a defesa da vítima.
Zé Maria era morador da comunidade Tomé e atuava em movimentos sociais. Ele tinha, entre suas bandeiras, a redistribuição de terras no perímetro irrigado da região da Chapada do Apodi, além da luta contra o uso de agrotóxicos pulverizados por meio de aeronaves.
Ele filmava aviões, tirava fotos e reunia documentos e estudos sobre os perigos da pulverização. Com a atuação do ambientalista e apoiadores, a Câmara Municipal de Limoeiro do Norte chegou a proibir temporariamente a pulverização, mas a proibição foi revogada após sua morte.
O líder comunitário também chegou a fazer denúncias, que foram levadas à Justiça federal, contra empresas privadas que estariam se apropriando de terras da União.
Julgamento
Zé Maria foi morto a tiros em 21 de abril de 2010. O caso iria a julgamento em Limoeiro do Norte, onde aconteceu o crime, no entanto, a pedido da defesa do réu, o processo foi desaforado, isto é, enviado pela Justiça a outra cidade – no caso, Fortaleza.
Por se tratar de um crime contra a vida, a acusação será julgada pela Conselho de Sentença, formado por sete jurados da sociedade civil, escolhidos a partir de sorteio.
Pulverização aérea de agrotóxicos foi proibida no Ceará em 2019 pela Lei Zé Maria do Tomé
Agência Brasil
Além de Francisco Marcos Lima Barbosa, outros cinco suspeitos são acusados de envolvimento no assassinato. Dois deles já morreram – inclusive o acusado de realizar os disparos – e os outros dois, apontados como mandantes do crime, ainda não têm previsão de serem levados a julgamento.
Os cinco envolvidos são:
João Teixeira Júnior, empresário e fazendeiro apontado como idealizador do crime; ainda não foi a julgamento
José Aldair Gomes Costa, gerente da empresa de João Teixeira, apontado como organizador do crime; ainda não foi a julgamento
Francisco Marcos Lima Barros, que vai a julgamento nesta quarta-feira (8), acusado de repassar informações para ajudar na morte
Westilly Hytler Raulino Maia, apontado como dono da arma e atirador que disparou todos os tiros contra Zé Maria; Westilly Hytler já faleceu
Antônio Wellington Ferreira Lima, moradora da mesma comunidade de Zé Maria; morto em confronto com a polícia
Fórum Clóvis Beviláqua
Natinho Rodrigues/SVM
O crime
De acordo com a denúncia do Ministério Público, José Maria Filho foi assassinado com 25 tiros de armas de fogo. Ele estava andando em uma motocicleta, em uma estrada pouco movimentada, quando foi emboscado e atingido.
Segundo o MP, a arma usada no crime era de Westilly Hytler. Ele teria sido responsável pelos 25 disparos. E, conforme laudo da Perícia Forense do Ceará (Pefoce), todos os disparos partiram da mesma arma e atirador.
As investigações revelaram que Zé Maria do Tomé sofria ameaças de morte e, em março de 2010, um mês antes do crime, chegou a registrar um boletim de ocorrência porque estava sendo ameaçado por telefone.
De acordo com Ministério Público, Francisco Marcos Lima Barros, levado a júri popular nesta quarta, também morava na comunidade Tomé, assim como Zé Maria. Marcos teria repassado a Hytler informações sobre a rotina do ambientalista e líder comunitário.
A quebra de sigilo telefônica, inclusive, apontou que Marcos trocou telefones com o executor do crime na véspera do assassinato de Zé Maria.
Acampamento Zé Maria do Tomé, em Limoeiro do Norte, homenageia líder ambientalista
Defensoria Pública do Ceará
Lei Zé Maria do Tomé
Em novembro 2009, antes da morte de Zé Maria do Tomé, a Câmara Municipal de Limoeiro do Norte aprovou e o prefeito sancionou uma lei que proibia a pulverização aérea de agrotóxicos em regiões agrícolas do município.
A medida fez parte do esforço do ambientalista contra a prática. Ele vinha alertando que a pulverização aérea estava contaminando a água usada para consumo humano.
Cinco meses depois, Zé Maria foi assassinado. E em maio de 2010, um mês após sua morte, a Câmara Municipal aprovou um projeto que voltou a autorizar a pulverização aérea de agrotóxicos na cidade.
No ano de 2018, a Assembleia Legislativa do Ceará aprovou a lei nº 16.820, sancionada em janeiro de 2019, que proíbe a pulverização aérea de agrotóxicos em todo o território cearense. O projeto recebeu o nome de Lei Zé Maria do Tomé.
A Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA) ajuizou uma ação contra lei, alegando que seria responsabilidade da União, e não do estado do Ceará, legislar sobre o tema, mas o Supremo Tribunal Federal (STF) manteve a validade da lei.
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