A língua surgiu na região da Tabatinga, em Bom Despacho, no Centro-Oeste de Minas que, nos tempos da escravidão, foi um território quilombola nos anos de 1700. Marli Costa, uma das guardiãs da língua, celebrou ao ver uma questão sobre o dialeto na prova do Enem. Questão do Enem que fala sobre a ‘Língua da Tabatinga’, de origem quilombola que vive em Bom Despacho, no Centro-Oeste de Minas
Rosimaire Santos/Divulgação
No último domingo (3), foi aplicada a primeira prova do Exame Nacional do Ensino Médio (Enem) de 2024, com redação e 90 questões de linguagens e ciências humanas.
Entre essas questões, uma chamou atenção ao mencionar a história da “Língua da Tabatinga”, uma tradição preservada em Bom Despacho, no Centro-Oeste de Minas Gerais.
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A Língua da Tabatinga tem origem no povo Banto, da África Central, que engloba diversas etnias e culturas africanas.
Antes mesmo da fundação da cidade de Bom Despacho, a região já era habitada por aldeias de escravos fugitivos, que se estabeleceram ali em busca de liberdade, por volta de 1700.
Foi nesses primeiros assentamentos que a língua começou a se formar, combinando elementos do português arcaico com o banto, como uma forma de comunicação secreta para evitar o entendimento por senhores e capatazes da época, segundo a historiadora Bárbara Freitas.
“Quando eles queriam falar alguma coisa que os brancos não poderiam entender, eles falavam na Língua da Tabatinga”, completou.
Entre 1755 e 1800, a resistência quilombola na região de Tabatinga — hoje, Bairro Ana Rosa — enfrentou milícias vindas de Pitangui, que tentavam reprimir os habitantes do quilombo. No entanto, a cultura e a língua persistiram, atravessando gerações até os dias atuais.
Marli Costa, uma das guardiãs da Língua da Tabatinga, celebrou ao ver uma questão sobre o dialeto na prova do Enem. Para ela, a menção foi uma vitória para toda a comunidade.
Marli conta que aprendeu a língua ainda criança, aos cinco anos, sob a orientação de Dona Fiota, uma das mais antigas conhecedoras do dialeto.
“Dona Fiota achou que precisava ensinar o dialeto para nós, para que a gente preservasse a língua. Na nossa comunidade, que era só de pessoas pretas, sofríamos muita discriminação, e ela quis nos dar uma forma de defesa contra quem nos criticava”, relatou.
Algumas expressões da Língua da Tabatinga
Patrimônio imaterial
Povo quilombola que preserva a Língua da Tabatinga em Bom Despacho
Reprodução/Redes sociais
Desde 2019, a Secretaria de Cultura de Bom Despacho, tentava o registro da Língua da Tabatinga, para torná-la um patrimônio e bem imaterial, e também preservar sua identidade.
“Quando foi feito esse registro, foram acordadas várias ações que têm o objetivo de salvaguardar essa língua de forma a torná-la conhecida e valorizada, garantindo inclusive a permanência da língua africana em Bom Despacho. Foi muito importante, porque aí nós temos que fazer divulgação, buscar oficinas, buscar esses falantes que detêm o conhecimento para que outras pessoas, a geração mais jovem, possa conhecê-la”, disse Rosimaire dos Santos, secretária de Cultura.
Em 2021, Bárbara Freitas, durante uma reunião, reforçou a necessidade do registro para evitar a perda dessa herança linguística.
Em dezembro de 2023, o prefeito Bertolino da Costa Neto assinou o decreto que declarou a Língua da Tabatinga como Patrimônio de Natureza Imaterial, em reconhecimento aos seus valores históricos, culturais e simbólicos.
Com a assinatura do decreto, a Língua da Tabatinga foi oficialmente registrada como parte do patrimônio cultural de Bom Despacho, marcando um importante passo na preservação de sua memória e legado.
Povo quilombola que preserva a Língua da Tabatinga em Bom Despacho
Reprodução/Redes sociais
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