‘Lembro aquela frase do líder africano Nelson Mandela que disse: É muito fácil demolir e destruir, poderosos são os que constroem’, disse Lula. O presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) abriu às 12h50 desta terça-feira (19) a 4ª e última sessão da Cúpula de Líderes do G20, o grupo das principais economias do mundo.
“Dialogamos com a sociedade por meio do G20 social”, disse Lula. “Deixamos a lição de que quanto maior a interação, maior o resultado dos nossos trabalhos.”
Na reunião, Lula passou a presidência rotativa do G20 para o colega Cyril Ramaphosa, da África do Sul, que sediará o encontro do ano que vem.
“A África do Sul poderá contar com o Brasil para exercer uma presidência para além do que podemos executar. Lembro aquela frase do líder africano Nelson Mandela que disse: ‘É muito fácil demolir e destruir, poderosos são os que constroem.’”
Lula passou a presidência rotativa do G20 para o colega Cyril Ramaphosa, da África do Sul
Reprodução/EBC
A íntegra do discurso
O Brasil completa hoje a penúltima etapa de uma sequência de quatro anos em que a liderança do G20 coube a países em desenvolvimento. Indonésia, Índia, Brasil e, agora, África do Sul trazem à mesa perspectivas que interessam à vasta maioria da população mundial. Partindo de Bali, passando por Nova Délhi e chegando ao Rio de Janeiro, buscamos promover medidas com impacto concreto sobre a vida das pessoas.
Lançamos uma Aliança Global contra a Fome e a Pobreza e iniciamos um debate inédito sobre a taxação de super-ricos.
Colocamos a mudança do clima na agenda dos Ministérios de Finanças e Bancos Centrais e aprovamos o primeiro documento multilateral sobre bioeconomia.
Fizemos um Chamado à Ação por reformas que tornem a governança global mais efetiva e representativa e dialogamos com a sociedade por meio do G20 Social.
Lançamos um roteiro para tornar os bancos multilaterais de desenvolvimento melhores, maiores e mais eficazes e demos voz aos países africanos na discussão sobre o endividamento.
Instalamos o Grupo de Trabalho sobre Empoderamento das Mulheres e propusemos um décimo oitavo Objetivo de Desenvolvimento Sustentável para promover a igualdade racial.
Definimos princípios-chave sobre comércio e desenvolvimento sustentável e adotamos o compromisso de triplicar a capacidade global de energias renováveis até 2030.
Criamos uma Coalizão para a Produção Local e Regional de Vacinas e Medicamentos e decidimos expandir o financiamento para infraestruturas de água e saneamento.
Sediamos eventos da Rodada de Investimentos da Organização Mundial da Saúde, por acreditar que mais recursos são necessários para uma resposta coletiva a novos e persistentes desafios sanitários.
Aprovamos uma Estratégia para Promover a Cooperação em Inovação Aberta contra assimetrias na produção científica e tecnológica e decidimos estabelecer uma força tarefa sobre a governança da inteligência artificial no G20.
Neste ano, realizamos mais de 140 reuniões em 15 cidades brasileiras.
Voltamos a adotar declarações consensuais em quase todos os grupos de trabalho. Deixamos a lição de que, quanto maior for a interação entre as trilhas de sherpas e de finanças, maiores e mais significativos serão os resultados dos nossos trabalhos.
Trabalhamos com afinco, mesmo cientes de que apenas arranhamos a superfície dos profundos desafios que o mundo tem a enfrentar.
Depois da presidência sul-africana, todos os países do G20 terão exercido, pelo menos uma vez, a liderança do grupo. Será um momento propício para avaliar o papel que desempenhamos até agora e como devemos atuar daqui em diante.
Temos a responsabilidade de fazer melhor. É com essa esperança que passo o martelo da presidência do G20 para o presidente Ramaphosa.
Esta não é uma transmissão de presidência comum — é a expressão concreta dos vínculos históricos, econômicos, sociais e culturais que unem a América Latina e a África.
Agradeço a todos os que contribuíram com a presidência brasileira, em especial as pessoas que trabalharam para viabilizar os resultados que alcançamos.
Desejo ao companheiro Ramaphosa todo sucesso na liderança do G20. A África do Sul poderá contar com o Brasil para exercer uma presidência que vá além do que pudemos realizar.
Lembro as palavras de outro grande sul-africano, Nelson Mandela, que disse: “É fácil demolir e destruir; os heróis são aqueles que constroem.”
Vamos seguir construindo um mundo justo e um planeta sustentável. Muito obrigado.
O Brasil no G20
A presidência brasileira do G20 começou em 2023, recebida da Índia, e desde então norteou debates em 3 eixos centrais:
acordos para o combate à fome e à pobreza – foi lançada oficialmente a Aliança Global contra a Fome e a Pobreza;
a reforma da governança global, com mais representatividade de países emergentes em órgãos internacionais – como a Organização das Nações Unidas (ONU);
e sustentabilidade e enfrentamento às mudanças climáticas.
Os temas foram exaustivamente debatidos ao longo do ano pelos sherpas, embaixadores designados pelos governos para levar as posições de cada país.
Cada Cúpula de Líderes redige um documento, e a Declaração de Líderes do G20 do Rio foi aprovada com consenso. O texto foi publicado ainda na noite desta segunda-feira (18).
O texto trata em detalhes os temas prioritários e pediu o fim das guerras da Ucrânia e na Faixa de Gaza e a taxação dos ultrarricos, nomeados como “indivíduos com patrimônio líquido ultra-alto” (veja os principais pontos da declaração).
Apesar de divulgar uma lista de ressalvas, o presidente da Argentina, Javier Milei, também aderiu à declaração. Devido às discordâncias anunciadas, havia a dúvida sobre a anuência do argentino (leia os bastidores da sessão de aprovação).
Leia a íntegra da declaração final
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Veja abaixo um resumo da Declaração Final dos Líderes por tema.
Desigualdade e Desenvolvimento Sustentável
O G20 reafirmou o compromisso com a Agenda 2030, destacando que apenas 17% das metas dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) estão no caminho certo.
As desigualdades entre e dentro dos países foram reconhecidas como fatores que agravam desafios globais.
A cúpula destacou o lema de 2024: “Construindo um mundo justo e um planeta sustentável”, com foco na redução de desigualdades e ações socialmente justas e ambientalmente sustentáveis.
Conflitos e Paz Mundial
Foram enfatizadas as consequências humanitárias de conflitos como na Ucrânia e na Faixa de Gaza. O G20 condenou o uso da força contra a soberania dos Estados e defendeu soluções diplomáticas e de paz, além de reafirmar o apoio a uma solução de dois Estados para o conflito Israel-Palestina.
“Afirmamos que todas as partes devem cumprir suas obrigações sob o direito internacional, incluindo o humanitário e de direitos humanos, condenando ataques contra civis e infraestrutura”, diz o texto.
Ação Climática e Transição Energética
O documento cita compromissos renovados para atingir emissões líquidas zero até meados do século e para aumentar significativamente as energias renováveis e a eficiência energética globalmente até 2030.
A cúpula também lançou a Força Tarefa para Mobilização Global contra as Mudanças Climáticas para reforçar o financiamento climático, especialmente em países em desenvolvimento.
Combate à Pobreza e à Fome
Foi lançada a Aliança Global contra a Fome e a Pobreza, promovendo estratégias como transferência de renda, programas de alimentação escolar e acesso ao microcrédito.
Apesar de considerar a produção global de alimentos suficiente, a cúpula apontou a necessidade de vontade política para garantir acesso amplo e equitativo.
Reformas em Governança Global
O G20 defendeu uma reforma do Conselho de Segurança da ONU para torná-lo mais representativo, além de reforçar o papel de instituições financeiras multilaterais como o FMI e o Banco Mundial, garantindo maior representação de países em desenvolvimento.
Além disso, celebrou a inclusão da União Africana como membro pleno do G20.
Taxação de ultrarricos
O G20 destacou a importância de taxar de forma eficaz os “indivíduos com patrimônio líquido ultra-alto”, respeitando a soberania fiscal de cada país. A proposta inclui cooperação internacional para troca de boas práticas, combate a práticas fiscais nocivas e criação de mecanismos anti-evasão.
Também incentiva a aplicação de sistemas tributários mais progressivos para reduzir desigualdades e financiar os Objetivos de Desenvolvimento Sustentáveis. O grupo defende o debate contínuo sobre o tema em fóruns globais.
Governança Digital e IA
O G20 abordou os desafios da inteligência artificial, enfatizando uma regulamentação centrada no humano, ética, transparente e responsável. Foram debatidos os riscos associados à IA, como desinformação e privacidade, e defendido o uso da tecnologia para inclusão social, saúde e educação, com apoio à capacitação digital global.
Iniciativas em Saúde Global
O G20 reafirmou o papel central da OMS no fortalecimento da arquitetura de saúde global e na preparação para pandemias. Foi destacada a necessidade de sistemas de saúde resilientes, financiamento sustentável e acesso equitativo a vacinas, diagnósticos e tratamentos, especialmente para doenças negligenciadas. A criação de uma Coalizão para Produção Local e Regional busca ampliar o acesso a tecnologias de saúde.
Biodiversidade e Florestas
Foi reafirmado o compromisso com o Marco Global de Biodiversidade de Kunming-Montreal, visando a proteção de ecossistemas e a reversão da degradação florestal até 2030. O grupo destacou a necessidade de financiamento inovador para conservação, como o Fundo Tropical Forever Facility, e incentivou iniciativas de pagamento por serviços ambientais.
Reforma do Comércio Global
Foi reforçada a necessidade de modernizar a OMC, promovendo um sistema comercial multilateral baseado em regras, justo e sustentável. O G20 apoia uma reforma no sistema de solução de disputas acessível a todos os membros e destacou o papel do comércio para o crescimento econômico inclusivo e a realização dos ODS.
Líderes mundiais reunidos no Rio de Janeiro para o encontro do G20
Ricardo Stuckert/PR