Piloto não resistiu a acidente no Grande Prêmio de San Marino, em Ímola, Itália; morte completa 30 anos nesta quarta-feira. Cortejo do corpo de Ayrton Senna pelas ruas de São Paulo em 5 de maio de 1994
Acervo TV Globo
Domingo, 1º de maio de 1994. Mais um Grande Prêmio de San Marino era realizado em Ímola, Itália. Os ânimos dos pilotos não eram os melhores, afinal, nos treinos de sexta-feira, Rubens Barrichello havia batido forte, e, no sábado, uma tragédia: a morte do piloto austríaco Roland Ratzenberger após outro grave acidente.
Ayrton Senna liderava o GP de San Marino com sua Williams. Milhares de brasileiros acompanhavam a corrida do grande ídolo, que contava 41 vitórias já conquistadas. Porém, o acidente com desfecho fatal chocou todos.
O g1 publica uma série de reportagens desde segunda-feira (29) em homenagem a Ayrton Senna, em parceria com o Bom Dia São Paulo. Nesta quarta-feira, 1º de maio, faz 30 anos que o piloto morreu.
A quebra de um componente mecânico fez o carro de Senna parar de responder aos comandos do volante. Ele passou reto pela curva Tamburello e colidiu contra um muro de concreto. O grande impacto fez com que uma peça se soltasse da suspensão e atingisse o capacete do tricampeão mundial.
Senna, aos 34 anos, morreu no auge da carreira e sua perda marcou uma geração de fãs dos anos 90 que relembra até hoje como foi aquele 1º de maio e também o cortejo do corpo em São Paulo em 5 de maio de 1994. Durante o trajeto até o Cemitério do Morumbi, ruas da capital paulista ficaram tomadas por brasileiros que queriam despedir-se do ídolo.
“Foi um baque ver uma pessoa se acidentar na sua frente. Você não está esperando isso. Você está esperando uma vitória porque Ayrton Senna sempre foi vitorioso. Nessa corrida, teve acidente do Rubinho, falecimento do Ratzenberger, mas não esperávamos que íamos perder o nosso brasileiro. Realmente é chocante e para mim, até hoje, sinto tristeza”, relata o desenhista Marcos Davi Ferriera, morador de Santo André.
“Foi impressionante e inesquecível. É até emocionante falar dessa parte. Você vai assistir a uma corrida para ver seu ídolo vencer, não para algo que vai marcar sua vida. Para mim, é uma coisa que vou carregar para a vida.”
Cortejo do corpo de Ayrton Senna em 5 de maio de 1994
Acervo TV Globo
Marcos relata que era vibrante assistir a Senna nas corridas, o que foi um marco para sua geração.
“Quem viveu na época sabe o que o Ayrton Senna representa para o povo brasileiro como herói das pistas, modelo profissional e talentoso. Muitas coisas que faço nos meus desenhos, na arte, me inspiro nele. Ele era focado, muito detalhista nas coisas que fazia, não entrava para perder. Era vibrante assistir às corridas dele e até hoje sentimos falta. Se perguntar para qualquer brasileiro vai falar que não tem outro que pode ser colocado no lugar dele como piloto. Era vibrante demais assistir ao Ayrton Senna correndo.”
“Ele, como brasileiro, era parte do brasileiro torcedor. O brasileiro que ficava na frente da televisão esperava o Ayrton Senna vencer. Ele foi vencedor, o campeão em tempos de chuva. Todas essas coisas eu trago na minha memória e não tem como esquecer. Um piloto extremamente talentoso e tinha orgulho de ser brasileiro, compartilhar com a multidão que torcia por ele.”
Fãs no cortejo de Ayrton Senna em 1994
Acervo TV Globo
Marcus Vinicius de Vicenzo Vieira dos Santos mora em São Paulo e faz parte desde 1988 da Torcida Ayrton Senna, conhecida como TAS. Ele relembra que no dia 1º de maio de 1994 assistia à corrida dentro de um carro.
“Na época, eu jogava futebol e eu levava uma televisão no carro porque eu ficava assistindo à corrida e o futebol era depois. Quando aconteceu o acidente, eu estava no carro esperando. Acabou o dia para mim. Fui embora para casa acompanhar. A notícia veio no final do dia. Foi como se tivesse perdido uma pessoa da família. O Ayrton é um exemplo, um herói.”
“Eu tinha 12 anos quando ele surgiu na Fórmula 1 e 22 quando ele partiu. Então, eu cresci minha adolescência toda me espelhando no Ayrton, meu herói de adolescência, e era um herói vivo, uma pessoa. Eu costumo dizer que o Ayrton permanece vivo dentro de nós. Nós, fãs, tentamos levar o legado dele para as próximas gerações, que é um trabalho fantástico feito pela família através do Instituto Ayrton Senna.”
Marcus Vinicius de Vicenzo Vieira dos Santos
Eduardo Apolinário/TV Globo
Marcus ainda ressalta que acompanhou o cortejo pela televisão, pois não teve coragem de ir ao velório.
“Nunca houve uma paralisação em São Paulo como o cortejo do Ayrton. Isso demonstra todo o amor que nós, brasileiros, temos por ele, e não só brasileiros. Eu acompanhei o velório pela televisão. Não tinha condições emocionais para ir até a Assembleia. Depois de muito tempo fui ao cemitério para fazer homenagens e orações. Só muito tempo depois consegui ir.”
Márcio Nascimento, de 50 anos, também é membro da Torcida Ayrton Senna e mora na capital paulista. Ele conta que gravou toda a cobertura do acidente, mas nunca assistiu.
“Eu tinha 19 anos e estava assistindo pela televisão à corrida, como todo brasileiro. Não acreditei. Na mesma hora, coloquei a fita cassete para gravar tudo o que passava. Te confesso que até hoje não assisti nenhuma fita dessa. Para mim, foi o dia mais triste que tivemos em nosso país. Mas depois, de ter passado esse tempo, a gente entende que o Ayrton se tornou eterno e que devemos cultuar, se espelhar e buscar as qualidades que tinha não, a ponto de ter pedido para a família criar um instituto para ajudar as pessoas mais necessitadas deste país.”
“Tinham muitas brigas de torcidas organizadas naquela época. No dia [1º], haveria dois clássicos e as duas torcidas se uniram e cantaram o nome do Senna nos estádios, no Maracanã e Morumbi. Se juntaram e se uniram para homenagear o maior esportista e maior brasileiro que nós tivemos.”
Márcio Nascimento, membro da Torcida Ayrton Senna
Eduardo Apolinário/TV Globo
Márcio ainda ressalta que começou a acompanhar Senna porque um tio dele era fã de Fórmula 1 e colocava todo domingo a corrida antes do almoço da família.
“Eu acompanhei a carreira do Senna desde que começou porque tinha um tio que gostava de Fórmula 1 e ia almoçar com a gente e assistia. E comecei a acompanhar uma pessoa que era determinada. Depois descobri que era ariano e corintiano como eu, e passei a acompanhar com mais ênfase no Senna. De repente, quando percebi, eu e milhões de brasileiros estávamos torcendo para ele ser campeão porque era muito difícil um piloto brasileiro chegar à Fórmula 1 e vencer.”
“A gente estava numa situação econômica que não era muito boa, favorável. O próprio futebol não ganhava Copa do Mundo. O brasileiro estava com autoestima baixa até o Senna chegar à Fórmula 1 e mostrar que era possível ganhar. Em 1986, nós perdemos uma Copa [para a França], e o Senna estava correndo em uma escuderia que tinha muito francês. No outro dia ele foi lá, tirou a bandeira do Brasil e deu uma volta com a bandeira para mostrar o orgulho que ele tinha, que ele corria não só pelo sonho dele, mas pelos brasileiros.”
Márcio Nascimento fez tatuagem em homenagem ao piloto Ayrton Senna
Eduardo Apolinário/TV Globo
Virginia Bertini, de 71 anos, professora aposentada, foi antiga vizinha dos avós do piloto e também relembra como foi o dia da morte do tricampeão mundial.
“Liguei a televisão, fiquei aguardando notícia e, quando soube que havia morrido, eu chorei muito, meus filhos choraram comigo. Eu sempre contei as histórias da infância. Meu filho mais velho tem camiseta dele, e eles ficaram fãs também, até mais até que eu.”
“Fomos na esquina quando passou o corpo dele, que passou aqui na Zona Norte. Era uma coisa muito triste. Todas as pessoas queriam prestar homenagem, mas a emoção era muito grande. Uma gratidão por ele ter feito o nome do Brasil em todos os países. Isso foi muito lindo da parte dele. Sempre com a nossa bandeira, camiseta, com nosso coração. Ele era o nosso coração.”
“Nós estávamos fazendo um churrasco e levamos a televisão para baixo para assistir à corrida. Não se perdia uma corrida. Eu acho que isso era geral, não era só comigo, era com todo mundo. E, quando aconteceu esse acidente, infelizmente, muito triste, eu não tenho nem como expressar como fiquei. Subi do meu andar aqui no prédio e fiquei quieto. Pelo pouco que conhecia, quando vi a pancada, seria muito difícil de sobreviver. Enfim, foi muito triste, foi horrível”, complementa o irmão de Virgínia, Américo Bertini.
Cíntia Moraes tinha 11 anos quando Ayrton Senna morreu e relembra que as aulas foram até suspensas durante o velório e o enterro do piloto na capital paulista.
“Minha escola era na Zona Sul de São Paulo, distante de onde nasceu Ayrton, mas próxima de onde ele conseguiu grandes feitos, o Autódromo de Interlagos. A notícia impactou muito toda a comunidade escolar. Eu estava na 6ª série do Ensino Fundamental, e toda a sala se vestiu de preto, em luto pelo Senna. Não só nossa sala, toda a escola. Fomos dispensados das aulas nos dias do velório e enterro. Eu e minhas amigas parodiamos uma música e cantamos ao longo desses dias: “Ele foi tricampeão e morreu na direção […] Quero que o Senna volte para alegrar o meu Brasil.”
‘Ninguém tinha dimensão da conexão das pessoas pelo Ayrton’
Cortejo de Ayrton Senna em São Paulo em 1994
Acervo TV Globo
Em entrevista ao g1, Viviane Senna, irmã de Ayrton Senna, relembrou como as ruas de São Paulo ficaram lotadas de fãs para acompanhar o cortejo do corpo, além de homenagens feitas em outros países.
“Ninguém tinha dimensão do tamanho, da extensão dessa conexão das pessoas pelo Ayrton. Foi impressionante, não só no Brasil, mas em outros países teve um movimento dessa natureza muito grande. Na França, por exemplo, no interior, as lojas começaram a fechar. Uma cantora brasileira, que na época era superfamosa e estava lá, me contou outro dia que estava andando e aconteceu que viu lojistas fechando as portas das lojas. Isso na França, na terra do Prost [rival de Senna].”
“Jornais, inclusive em países que nem passava Fórmula 1, ele estava na primeira página. Foi uma comoção tão profunda, tão extensa, que surpreendeu completamente não só nós, mas as pessoas do mundo também.”
“Em São Paulo, onde a gente passava com o carro, saindo da Assembleia, onde foi o velório, até o aeroporto, as ruas não tinham espaço, as calçadas estavam cheias do começo do trajeto até o aeroporto. Não tinha um lugar, em qualquer calçada. Os prédios, as janelas dos prédios todas cheias. Estava completamente tomada a cidade. Eu acho que nunca teve isso, pelo menos eu nunca soube que houve antes ou depois uma comoção dessa envergadura.”
Velório de Ayrton Senna na Assembleia Legislativa do Estado de São Paulo
Acervo TV Globo
Fãs nas ruas fazendo homenagem para Ayrton Senna em 5 de maio de 1994
Acervo TV Globo
Fãs nas ruas fazendo homenagem para Ayrton Senna em 5 de maio de 1994
Acervo TV Globo