Larvas de moscas e besouros ajudam a identificar há quanto tempo uma pessoa está morta, por exemplo. Laboratório da universidade faz parcerias com Polícia Científica desde 2005. Como peritos e cientistas da Unicamp usam insetos para solucionar crimes no interior de SP
Um crime sem respostas que pode ser solucionado com a ajuda de uma mosca. Parece enredo de filme, mas o trabalho de pesquisadores da Unicamp, em Campinas (SP), em parceria com peritos criminais tem tornado isso possível.
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Na prática, funciona assim: um laboratório no Instituto de Biologia da universidade é responsável por analisar diversas fases das moscas, incluindo larvas de varejeiras encontradas em corpos em decomposição.
Aliando a análise da “idade” das larvas aos conhecimentos dos pesquisadores sobre diferentes espécies, é possível precisar, por exemplo, há quanto uma pessoa está morta. Com isso, a polícia pode elucidar assassinatos e até descartar suspeitos.
“Já tivemos diversos casos que as moscas realmente foram cruciais para entender essa questão da dinâmica do tempo de morte e, efetivamente, para associar pessoas ou, então, retirar as pessoas da cena do crime. Isso entra nos laudos periciais”, detalha a professora Patrícia Thyssen, coordenadora do Laboratório de Entomologia Integrativa.
No universo dos insetos, outro “pequeno investigador” é analisado minuciosamente pelas lentes do microscópio: o besouro.
Enquanto as larvas de moscas aparecem nos estágios iniciais de decomposição, os besouros são comumente encontrados em locais onde a exposição do corpo se estende por mais tempo.
“Aqueles ossinhos de frango que a gente joga fora, a gente usa também para criar esses besouros, porque eles adoram os ossos. Nós estudamos o ciclo deles também, e eles já contribuíram para trazer alguns dados que auxiliaram no processo investigativo de tempo de morte”, afirma a docente.
Laboratório de Entomologia Integrativa da Unicamp
Estevão Mamédio/g1
Da contaminação de alimentos aos maus-tratos
Segundo Thyssen, as parcerias com peritos se consolidaram por volta de 2005, após ela finalizar o doutorado. Desde então, diversos ex-alunos do laboratório já assumiram posições na Polícia Científica.
“Nosso laboratório é um laboratório de pesquisa com um grupo bastante consolidado, então já tive diversos estudantes e egressos que saíram da universidade e hoje estão atuando na Polícia Científica do estado de São Paulo e fora do estado de São Paulo”, frisa.
Vale destacar que o trabalho dos pesquisadores não se resume à atuação em crimes contra a vida. O laboratório também é responsável por análises usadas em casos de contaminação de alimentos e até maus-tratos aos animais.
“A partir desses casos das moscas parasitas, que são chamadas de bicheiras, determinando o tempo de infestação, que é o tempo de permanência da larva, a gente consegue determinar quanto tempo, por exemplo, o animal ficou sem cuidado, e responsabilizar isso ao dono”, explica.
Larvas de mosca-varejeira revelam há quanto tempo uma pessoa está morta
Estevão Mamédio/g1
Mais acessível
Os alunos orientados pela professora também desenvolvem as próprias pesquisas com o objetivo de tornar o acesso à entomologia (ramo da zoologia que estuda insetos) forense mais rápido, fácil e objetivo.
É o caso do mestrando José Lucas Dias da Silva, que estuda a genética das moscas usadas em perícias. “Extraímos o DNA do indivíduo, fazemos uma amplificação desse DNA, e por fim a gente sequencia. Essas sequências a gente pode analisar de várias formas, e essas análises nos indicam como está o processo evolutivo da espécie”.
“O perito precisa acessar um dado biológico de uma determinada espécie, ele não sabe qual espécie é essa. Se ele fizer um processo molecular, ele consegue obter qual espécie é e assim procurar na literatura dados de desenvolvimento”, explica.
Já a aluna de doutorado Aline Marrara do Prado trabalha em uma ferramenta para auxiliar os peritos a identificarem espécies coletadas na cena de crime – nesse caso, utilizando a identificação taxonômica, ou seja, analisando características para determinar a que grupo biológico pertencem.
“A entomologia forense tem crescido muito, e a ideia é justamente fazer essas parcerias com o pessoal da Polícia Científica e a universidade para tornar isso mais mais amplo no Brasil inteiro. É algo que ainda está sendo iniciado, começando aqui em São Paulo, a Patrícia está começando essa parceria, então a gente espera que se expanda”, diz Prado.
Moscas criadas em laboratório do Instituto de Biologia da Unicamp
Estevão Mamédio/g1
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