Decisão foi do TST, que estabeleceu indenização de R$ 25 mil. Ministro diz que empresa podia ter evitado situações constrangedoras à empregada, ‘garantido o respeito à sua integridade moral e psicológica’. Empresa fabricante de óculos é condenada pelo TST
Pedro Torres/EPTV
A 8ª Turma do Tribunal Superior do Trabalho (TST) condenou a empresa Luxottica Brasil Produtos Óticos e Esportivos Ltda, de Campinas (SP), a pagar R$ 25 mil de indenização a uma auxiliar de almoxarife transgênero proibida de utilizar o banheiro feminino durante o trabalho.
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Na decisão, o Tribunal rejeitou o argumento de que seria necessário aguardar alteração do registro civil e cirurgia de redesignação da funcionária para tratá-la como pessoa transgênero e, por isso, entendeu que a empresa violou o direito de personalidade e a dignidade da empregada.
A EPTV, afiliada da Globo, tenta contato com a empresa citada, mas, até a publicação desta reportagem, não teve retorno.
Transição
A profissional foi admitida em outubro de 2008 na empresa. Segundo depoimento no processo, a auxiliar começou a exteriorizar sua identidade feminina em meados de 2011. No ano seguinte, deu início ao “processo transexualizador”, que consiste em terapia psicológica e processo clínico de adequação sexual.
Nesse momento, comunicou à chefia as mudanças e pediu para passar a usar o banheiro feminino. Contudo, só permitiram que ela acessasse o local na parte da noite, e de forma provisória.
A empregada disse ainda que foi constrangida ao adotar o nome social. “Solicitava aos colegas de trabalho e aos supervisores que passassem a me tratar pelo prenome feminino, mas muitos se recusavam, alegando que o crachá ainda continha meu nome de registro civil”.
Argumentos da empresa
Em contestação, a Luxottica disse que segue a Norma do Ministério do Trabalho, que prevê instalações sanitárias separadas por sexo. “Tanto as instalações reservadas ao sexo masculino quanto as destinadas ao sexo feminino cumprem as exigências estabelecidas na norma, constituídas de sanitários individuais, com portas independentes e fechos, garantindo privacidade aos usuários”
Quanto ao nome social, a empresa argumentou que a equipe de gestão de pessoas havia esclarecido à auxiliar que, de acordo com a CLT, é obrigação do empregador efetivar o registro de seus empregados, e dele deve constar, entre outras informações, a sua qualificação civil. Assim, não poderia utilizar nome e gênero distinto do registro civil, inclusive nos crachás, por servirem ao controle eletrônico de jornada.
Por isso, para a Luxottica, a alteração do crachá somente seria autorizada após a realização da cirurgia de redesignação sexual e ação judicial para alteração do registro civil.
Tribunal Superior do Trabalho (TST), em Brasília
Divulgação
Decisão final
Ao analisar o recurso da auxiliar, o ministro Douglas Alencar Rodrigues, disse que o empregador não pode deixar de tomar medidas adequadas para garantir um meio ambiente de trabalho seguro e saudável, também do ponto de vista da saúde mental, coibindo práticas que possam gerar danos de natureza moral ou emocional a seus empregados.
O ministro lembrou que enquanto o “nome civil” faz parte dos direitos de personalidade, o “nome social” é a designação pela qual a pessoa trans se identifica e é socialmente reconhecida. Nesse sentido, lembrou que o artigo 1º, inciso I, do Decreto 8.727/2016 dispõe sobre o uso do nome social e o reconhecimento da identidade de gênero de pessoas trans no âmbito da administração pública federal.
Além dessa norma, o relator observou a adoção de diversas iniciativas, em termos de políticas públicas e medidas legislativas, voltadas para a proteção desse grupo, com fundamento no princípio constitucional da dignidade da pessoa humana.
Para o ministro, a empresa poderia (“e deveria”), ter evitado situações constrangedoras ou vexatórias à empregada diante de colegas e garantido o respeito à sua integridade moral e psicológica. Esse entendimento se baseia na boa-fé objetiva contratual, da qual decorre o dever de cooperação, colaboração e de cuidado.
Segundo o relator, a empregada apresentava aspectos estéticos suficientes para validar sua identidade de gênero feminina, pois se identificava como mulher, trajava-se como mulher e se portava como mulher no âmbito da empresa. Nesse contexto, a utilização do nome social era medida necessária para a concretização do seu direito de personalidade, sem causar qualquer ônus ou prejuízo para a empresa.
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