17 de janeiro de 2025

Estrutura inadequada e negligência: entenda o que levou a Polícia Civil a indiciar três pessoas pelo incêndio da pousada Garoa


Reportagem teve acesso, com exclusividade, ao inquérito policial do incêndio que matou 11 pessoas na Pousada Garoa, em Porto Alegre. Investigação aponta negligência como principal causa, apesar de não determinar causa do incêndio. Três pessoas são indiciadas pelo incêndio da Pousada da Garoa
Quase nove meses depois do incêndio na pousada Garoa, a reportagem do g1 teve acesso, com exclusividade, ao documento do inquérito policial instaurado para investigar o caso. A tragédia, que deixou 11 pessoas mortas e 15 feridas, aconteceu no dia 26 de abril de 2024, em Porto Alegre.
📲 Acesse o canal do g1 RS no WhatsApp
Após a investigação, a polícia indiciou três pessoas por incêndio culposo com resultado de morte. Relembre na reportagem acima os indiciamentos. Foram indiciados o proprietário da pousada, André Kologeski da Silva, e dois servidores públicos da Prefeitura de Porto Alegre: o presidente da Fundação de Assistência Social e Cidadania (Fasc), Cristiano Atelier Roratto, e a fiscal do contrato da pousada junto à prefeitura, Patrícia Mônaco Schüler.
O g1 entrou em contato com a defesa dos indiciados. A defesa de André Kologeski da Silva diz que “ainda persistem dúvidas sobre a possibilidade do incêndio ter sido criminoso. Por isso, estamos fazendo alguns questionamentos a autoridade policial. A defesa e o acusado estão empenhados na busca da verdade real, para que seja feita justiça”
Já a defesa de Patrícia Mônaco Schülert afirma que “Após ter acesso e analisado a íntegra do Inquérito Policial, observamos que carece de muitos documentos, oitivas de pessoas e informações imprescindíveis para que realmente o fato seja esclarecido. O Ministério Público recebeu as partes e temos certeza que irá solicitar a complementação do Inquérito Policial, após manifestação da Defesa”.
A defesa de Cristiano Atelier Roratto também foi contatada e, até a mais recente atualização da reportagem, não retornou. O espaço segue aberto para manifestações.
Durante a investigação, a Polícia Civil interrogou testemunhas, sobreviventes e envolvidos administrativamente com a pousada. Apesar de não identificar as causas do incêndio, conforme o inquérito, depoimentos coletados indicam falhas na segurança, como extintores inoperantes, falta de plano de prevenção contra incêndios (PPCI), estrutura precária e inadequada, além de relatos de negligência por parte da administração da pousada e do convênio com a FASC.
LEIA TAMBÉM:
Pousada Garoa: polícia indicia três pessoas por incêndio com 11 mortes em Porto Alegre
VÍDEO: incêndio mata 10 pessoas em pousada de Porto Alegre
Sobrevivente de incêndio em pousada que matou 10 pessoas em Porto Alegre se atirou do 3º andar para escapar, diz testemunha
Sem alvará para funcionar como pousada, pensão atingida por incêndio no RS teve contrato renovado com prefeitura em dezembro
Falta de estrutura adequada
Segundo a Polícia Civil, o prédio não se enquadra nas edificações que possuem baixo risco e, portanto, não poderia ter a dispensa do Alvará de Prevenção e Proteção Contra Incêndios (APPCI), expedido pelos bombeiros. Isso porque a Garoa, localizada na Farrapos, tinha mais de 200 metros quadrados e mais de dois andares, limites estabelecidos pela lei.
Em outro entendimento da regulamentação, existiria uma brecha que aponta que o prédio poderia estar regularizado caso apresentasse, na prefeitura, um Plano Simplificado de Prevenção e Proteção Contra Incêndio (PSPCI). Entretanto, nesse caso, o prédio precisaria ter até três pavimentos – a unidade da Garoa que pegou fogo tinha quatro andares habitáveis.
Moradores contam que Pousada Garoa não tinha condições adequadas
Para além da documentação, a Polícia identificou que, dados o tamanho da estrutura e a atuação como hospedagem, a unidade precisaria ter saídas, sinalização e iluminação de emergências, extintores e brigada de incêndio.
Um dos hóspedes ouvido pela polícia relatou que tentou usar os extintores que encontrou no momento do fogo, mas que os equipamentos não funcionaram.
Entre os relatos, destacam-se o de moradores que descreveram a precariedade do local, com problemas como fiação irregular e condições de higiene insatisfatórias, como presença grande de ratos e baratas.
O documento também aborda a relação contratual entre a Pousada Garoa e a FASC, detalhando que a fiscalização seria insuficiente e as normas de segurança seriam descumpridas. Confira alguns trechos dos depoimentos abaixo.
Polícia não identificou causador do incêndio
Testemunhas ouvidas pela polícia e destacadas no inquérito mencionaram a presença de um homem antes do incêndio, na faixa dos 40 anos e supostamente usando uma camiseta amarela. As pessoas ouvidas relatam que ele estaria tentando entrar no prédio.
A investigação analisou imagens de câmeras de monitoramento de locais próximos à pousada, tendo encontrado um homem com as características relatadas. Mesmo assim, o inquérito não encontrou relação dele com o incêndio, já que o mesmo havia sido visto muitas horas antes do início do fogo, além de não ter sido visto entrando na pousada.
Movimentação de homens do Corpo de Bombeiros e equipes de resgate diante da Pousada Garoa, localizada na Avenida Farrapos, no centro da cidade de Porto Alegre (RS)
Evandro Leal/Enquadrar/Estadão Conteúdo
Outra hipótese levantada pela Polícia é de um possível curto-circuito, já que as condições da fiação apresentavam muitos problemas. No relatório, o Instituto-Geral de Perícias (IGP) não chega a uma conclusão quanto as causas do incêndio, mas relata a precariedade da estrutura.
Ouvidos pela investigação, os bombeiros que atenderam a ocorrência explicaram que enfrentaram dificuldades devido à magnitude do fogo e à estrutura de madeira do prédio, além da falta de sinalização de emergência.
Incêndio em pousada de Porto Alegre
Reprodução/RBS TV
Confira alguns trechos da conclusão do inquérito
“Contudo, não foi possível determinar, de forma técnica e justificada, a causa do incêndio, em razão do elevado grau de destruição apresentado pelos escombros remanescentes do sinistro (…)
Não foi constatado quadro de disjuntores na área de dormitórios do 1º pavimento, estando, portanto, os circuitos elétricos deste ambiente sujeitos à proteção do disjuntor geral na caixa de medição do prédio (…)
Portanto, não é possível descartar como causa do incêndio em tela, a ocorrência de um evento termoelétrico, seja por curto-circuito ou por sobrecarga nas instalações elétricas (…)
Em suma, a morte das vítimas encontradas no local, bem como as lesões experimentadas pelas vítimas socorridas foi agravada pela ausência de efetiva rota de fuga no prédio, conforme amplamente exposto”
Relembre o caso
Um incêndio atingiu uma pousada e deixou 11 pessoas mortas, na região central de Porto Alegre, na madrugada do dia 26 de abril de 2024. O local abrigava pessoas em situação de vulnerabilidade social.
O incêndio ocorreu em uma das unidades da Pousada Garoa, na Avenida Farrapos, na região central de Porto Alegre. O prédio fica entre as ruas Barros Cassal e Garibaldi, a poucos metros da Estação Rodoviária.
O fogo começou por volta das 2h30 da madrugada de 26 de abril. O fogo se espalhou rapidamente pelos quartos da pousada. Para fugir das chamas, algumas pessoas se jogaram das janelas do segundo e do terceiro andar. Os bombeiros encontraram as 10 vítimas em cômodos da pensão. Uma 11ª pessoas morreu no hospital após ser socorrida.
Local da pousada que foi atingida por incêndio que matou pessoas em Porto Alegre
g1
VÍDEOS: Tudo sobre o RS

Mais Notícias