Termo indica que moradores estão sempre com risco de ter de deixar unidades onde moram. IBGE mapeou 22 favelas no município, que se concentram às margens do Córrego Itanguá, entre as zonas norte e oeste, formando um ‘cinturão’ de malocas que abriga 8.484 pessoas. Moradores de favelas vivem insegurança fundiária, em Sorocaba (SP)
Marcel Scinocca/g1
Mais de 12 mil pessoas vivem em pelo menos 22 favelas de Sorocaba (SP), segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). A maior parte dos locais não contam com qualquer estrutura. Especialistas ouvidos pelo g1 explicam que as pessoas que vivem nessas áreas da cidade, quase sempre, estão em uma condição de insegurança fundiária. Mas o que significa o termo?
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O termo aponta que, muito mais do que as probabilidades de problemas que o proprietário de um imóvel regularizado está sujeito, quem mora em uma favela, além de não ter qualquer estrutura, também corre o risco de ter de deixar o local a qualquer momento, por exemplo, por força de uma determinação judicial.
“Essas pessoa que vivem nessas comunidades, grande parte tem insegurança fundiária. Elas não são proprietárias. Elas têm essa insegurança e a moradia é uma questão muito importante para a reprodução da vida social. Inclusive os programas de construção de moradias populares são ordenamentos da própria Nações Unidas”, comenta a pesquisadora e socióloga Érica Regina Silva.
Os moradores da favela Santa Rosa, entre os bairros Novo Horizonte e Nova Sorocaba, são exemplo de quem vive em insegurança fundiária. O local é um loteamento que foi embargado pela Prefeitura de Sorocaba. Em 2018, a área, já com asfalto na parte das ruas, começou a ser invadida e o caso é discutido na Justiça.
Uma situação parecida também acontece com um loteamento irregular entre os bairros Santa Luiza e Sorocaba Park, na região do Vitória Régia. Os problemas começaram no local em 2015. O local chegou a ter decreto de utilidade pública, mas sem consenso sobre os valores. O caso também foi discutido na Justiça quando, inclusive, houve a retenção de valores dos cofres públicos municipais.
Outros pontos apresentados pela socióloga sobre as favelas de Sorocaba, incluindo no Ipanema Ville, também na zona norte da cidade, é que elas estão, muitas vezes, em área de proteção ambiental, ao lado de matas ou de córregos.
Ainda conforme Erica, a falta de política habitacional eficaz leva à esta situação e, quando não se não tem esse tipo de política, tem favela.
“O primeiro ponto que é importante destacar é que a moradia é um direito social fundamental. Enfim, ela está lá na Constituição Federal de 1988. Ainda nessa mesma constituição consta que o município, assim como o estado e a União, têm por função criar programas de moradia.”
Favela entre os bairros Sorocaba Park e Santa Luíza, na zona norte de Sorocaba (SP)
Marcel Scinocca/g1
“Em nosso município, já há quase uma década, não temos a entrega de casas populares para retirar moradores de assentamentos e comunidades como as pessoas do Jardim Santa Rosa, que estão desprovidas do abastecimento de água de redes gerais, sem rede de esgoto, sem energia elétrica, sem coleta de lixo, entre outros serviços essenciais.”
A socióloga ainda diz que, junto a moradias, é preciso ter, por exemplo, escolas e unidades de saúde. Como bom ou mal exemplo, Erica cita os residentes Carandá e Altos de Ipanema, cujas unidades foram entregues em 2017, mas não havia nenhuma unidade de saúde e escolar.
Erica também lembra a diferença entre as tratativas sobre moradia. Para ela, as cidades precisam de política de urbanização, “que significa organizar a distribuição do solo para pessoas que precisam morar e são parte da força produtiva”, e também políticas públicas de moradia, “com o intuito de retirar essa população de áreas de preservação”.
Erica Regina, socióloga e pesquisadora da Universidade Federal de São Carlos, diz que mudança na legislação influenciaram na quantidade de candidatos ao Legislativo
Arquivo Pessoal
Insegurança fundiária e cidade informal
Mais de 12 mil pessoas vivem nas favelas de Sorocaba (SP)
Marcel Scinocca/g1
O professor e pesquisador Felipe Comitre, que já realizou estudos sobre as favelas de Sorocaba, diz que quase todas as pessoas que vivem em favelas estão inseridas no contexto da insegurança fundiária.
“A questão dessa insegurança fundiária é, via de regra, uma tônica das favelas, porque falta documentação. Normalmente estão em áreas irregulares, onde a gente tem o que eles chamam de ‘cidade informal’. O regime de construção não segue todas as normas da engenharia, até porque é uma outra realidade habitacional.”
Conforme ele, são exceções os processos de regularização fundiária contemplados nessas favelas. “O que acontece, via de regra, é após anos de luta por melhores condições de habitação, os moradores também conseguirem as posses de suas casas.”
Felipe relembra também de um caso específico de Sorocaba, da década de 1990, e fala sobre a diferença entre remoção e remanejamento.
“Foi, por exemplo, o que aconteceu na criação do Habiteto [bairro na zona norte de Sorocaba]. Havia favelas espalhadas pelo território de Sorocaba, nesse caso, sem a regularização fundiária. Eles foram removidos e jogados lá no Habiteto. Isso em 1998, com o discurso que eles teriam melhores condições de vida, eles podiam morar numa casa de alvenaria, o que na prática, a gente sabe que demorou muito, porque no início foi uma verdadeira transferência de barraco”, diz.
“Se eles, os moradores, não têm posse, se eles não têm nenhum documento que os associa àquela área, aquele terreno, eles podem ser vítimas desses processos tão comuns que são os de remanejamento. Eu prefiro falar remoção, porque remanejamento pressupõe o que você vai tirar de um local e pôr em outro, mas normalmente essas políticas são de remoção de favelas e abandonam aí esses moradores à própria sorte em novas áreas que são mais periféricas e com piores condições”, completa.
Professor e pesquisador Felipe Comitre fala sobre favelas de Sorocaba (SP)
Arquivo Pessoal
O que diz a prefeitura
Questionada, a Prefeitura de Sorocaba reiterou que as áreas levantadas pelo IBGE foram mapeadas no início da gestão em 2021, “sendo que muitas delas estavam em processo de reintegração de posse, tratando-se de ocupação de áreas particulares”.
“Obtendo o princípio da equidade social, a prefeitura passou a atuar como agente conciliador nos casos e vem trabalhando com os proprietários para contrapartidas, acordos judiciais e resoluções para não haver desalojamentos em massa. Nessas áreas, poucos são os problemas de enchente ou proximidades com mananciais, não sendo emergencial a remoção.”
Conforme o IBGE, Sorocaba (SP) tem várias favelas às margens de córrego, caracterizando um ‘cinturão’
Marcel Scinocca/g1
A prefeitura afirma também que, de 2021 a 2024, não houve aumento ou novos casos de ocupações em áreas públicas em decorrência da ampliação de ações fiscalizatórias.
Ainda segundo o Executivo, a Sehab criou o programa Casa Nova Sorocaba “para aumentar a oferta de unidades para financiamento com grandes descontos, visando famílias que oneram sua renda com altos aluguéis e vivem com instabilidade na moradia”. Em quatro anos, o programa ainda não distribuiu nenhuma casa em Sorocaba.
A prefeitura também alega que a Sehab mapeou as Zonas de Interesse Social para incentivar lotes populares e que a reforma de casas insalubres nas áreas de regularização fundiária foi inserida no orçamento 2025.
Favelas de Sorocaba
Segundo o IBGE, mais de 12,4 mil pessoas que vivem em favelas espalhadas por Sorocaba. Os dados fazem parte do Censo 2022, e foram divulgados pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) no último dia 8.
O IBGE mapeou 22 favelas no município (veja mapa abaixo). Em 2010, no entanto, essas comunidades não apareciam no Censo, embora elas já tomassem forma naquela época.
É considerada favela uma área com moradias juridicamente irregulares e que atendam a ao menos um dos critérios abaixo:
Ausência de serviços públicos;
Edificações que não seguem padrões urbanísticos definidos pelo poder público;
Ocupação em área restrita.
Os dados do IBGE mostram ainda que as malocas se concentram às margens do Córrego Itanguá, entre as zonas norte e oeste, formando um “cinturão” de favelas que abriga 8.484 pessoas. Os bairros que compõem o complexo são:
Jacutinga;
Jardim Kauany;
Lopes de Oliveira/Jardim Marly;
Wanel Ville V;
Itapemirim;
Vitória Ville;
Jardim Aeroporto;
Nova Esperança III;
Jardim Baronesa e
Vila Barão.
Sem escolas e hospitais, mais de 12 mil pessoas vivem nas favelas de Sorocaba
Ainda conforme o IBGE, nenhuma das 22 favelas possui creches ou escolas de ensino fundamental e médio, com exceção do bairro Nova Esperança III.
Nenhuma das favelas conta com unidade de saúde. Por outro lado, conforme os dados, as favelas de Sorocaba contavam com 331 estabelecimentos para outras finalidades, incluindo 32 igrejas – pouco menos de 10% do total.
Veja o mapa das favelas em Sorocaba:
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