27 de dezembro de 2024

Justiça condena pastores de São Luís por fazerem culto em frente a terreiro de candomblé

A decisão da Justiça veio após os membros das igrejas realizarem um “protesto”, em abril de 2022, em frente a terreiro de matriz africana como tentativa de evangelização dos praticantes do candomblé, que faziam parte da comunidade. Membros da Casa Fanti-Ashanti observam culto realizado por um grupo pentecostal na Rua Militar, em São Luís
Reprodução/Redes Sociais
A Justiça do Maranhão condenou os líderes religiosos das igrejas evangélicas Pentecostal Jeová Nissi e Igreja Ministério de Gideões a pagarem uma multa de R$ 5 mil por danos morais coletivos.
Além disso, a decisão também determina que os religiosos se abstenham de promover manifestações que ameacem ou perturbem a prática de religiões de matriz africana no Maranhão. A Justiça impôs, ainda, multa de R$2.000 por qualquer nova tentativa de perturbação.
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Candomblecistas denunciam ‘intolerância religiosa’ após culto de pentecostais em São Luís
A decisão da Justiça, divulgada nesta sexta-feira (28), veio após os membros das igrejas, sob liderança de Flávia Maria Ferreira dos Santos, Charles Douglas Santos Lima e Marco Antônio Ferreira, realizarem um “protesto”, em abril de 2022, em frente à Casa Fanti Ashanti, terreiro de matriz africana, em São Luís. O ato tinha como tentativa a evangelização dos praticantes do candomblé, que faziam parte da comunidade (Veja vídeo acima).
Durante o ato, os membros das igrejas faziam uma marcha pelos 12 anos de aniversário da comunidade. A programação previa caminhada com orações ao ar livre pelo bairro, com parada final em frente a Igreja Pentecostal Jeová Nissi, na Rua Militar.
Entretanto, no mesmo dia, os integrantes do terreiro estavam se preparando para uma festividade tradicional dedicada ao orixá Ogum, quando foram surpreendidos pelos protestos.
Versão do envolvidos
Os membros da Casa Fanti Ashanti, que fica no bairro Cruzeiro do Anil e funciona há mais de 64 anos, afirmam que os membros das igrejas cometeram o crime de intolerância religiosa. No ato evangelístico, os evangélicos levaram caixas de sons, faixas com dizeres bíblicos e distribuíram panfletos com palavras de ordem contra a religião de matriz africana.
De acordo com uma Ação Civil Pública ajuizada pela Defensoria Pública do Estado do Maranhão, os manifestantes gritavam palavras como “vamos expulsar os demônios” e “a palavra de Deus não pode parar”, em referência às práticas religiosas da Casa. Alguns evangélicos chegaram a subir na calçada do terreiro para distribuir panfletos com mensagens que diziam “Jesus te ama”.
Na época, a Casa Fanti-Ashanti emitiu uma nota de repúdio (veja no fim da reportagem a nota na íntegra) pelo ato das igrejas. A casa afirma ainda que sentiu sua liberdade de culto ser desrespeitada.
O pastor do Ministério Gideões, Charles Douglas, contrapôs a versão da comunidade do terreiro, alegando que não houve ofensas em nenhum momento à Casa Fanti-Ashanti, mas somente os membros da igreja participando do culto ao ar livre, em frente a outra igreja, também pentecostal, voltado a eles mesmos.
“Nós completamos 12 anos de ministério e todo ano fazemos uma marcha para Cristo declarando que o Senhor é a nossa bandeira. Nós percorremos todos os bairros, Cruzeiro do Anil, Isabel Cafeteira. Em locais estratégicos, nós parávamos, evangelizávamos, pregávamos o evangelho de Deus, e o último ponto que paramos foi em frente a uma igreja evangélica. Era o último ponto de parada para fazer o último clamor voltado para o nosso ministério, para encerrar a marcha!”, afirmou.
Veja, na íntegra, a nota da Casa Fanti-Ashanti:
“A Casa Fanti-Ashanti, na pessoa da Ialorixá Mãe Kabeca de Xangô, vem a público esclarecer que no dia 24 de abril, por volta das 17h, um grupo de pessoas de designação evangélica parou em frente ao terreiro e realizou gestos e atitudes desrespeitosas e ofensivas contra a religiosidade de matriz africana e seus membros, conforme vídeos que circularam amplamente nas redes sociais. Ao tempo em que repudiamos as condutas discriminatórias praticadas, enfatizamos que todas as medidas cabíveis referentes a este caso estão sendo providenciadas, para que atos sejam coibidos e seus autores responsabilizados. Exigimos o respeito ao nosso direito fundamental à liberdade de culto e de crença, ao pluralismo e à diversidade religiosa. Agradecemos as inúmeras manifestações de apoio e solidariedade dirigidas à mãe Kabeca e a toda comunidade Ashantiense, por diversos setores e segmentos da sociedade e reafirmamos o firme propósito de dar continuidade aos ritos e celebrações ancestrais que a casa realiza há 64 anos, contribuindo com o fortalecimento das expressões religiosas afrobrasileiras e com a cultura maranhense de forma geral”.

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