Sentença determina pagamento de R$ 80 mil de indenização por danos morais. A família da vítima disse que vai recorrer. A ação da Polícia Civil na comunidade foi considerada a mais letal em operações da polícia no Rio. VÍDEO: Moradores relatam cenas de terror no Jacarezinho
A Justiça do Rio condenou o Estado do Rio de Janeiro a pagar uma indenização de R$ 80 mil por danos morais à mãe de Márcio da Silva Bezerra, um dos 28 mortos na operação policial na Favela do Jacarezinho, na zona Norte do Rio, em 6 de maio de 2021. A ação é considerada a mais letal em operações da polícia no Rio.
Na sentença, a juíza Neusa Leite, da 14ª Vara de Fazenda Pública do Rio, destaca entendimentos do Tribunal de Justiça do Rio e do Supremo Tribunal Federal de que, em casos de mortes durante operações policiais, quando a perícia é inconclusiva sobre a origem do tiro, é possível a condenação do poder público a indenizar parentes da vítima por danos morais e materiais.
Na ação, a mãe da vítima afirma que, naquela manhã, Márcio saiu de casa às 6h30 para comprar frutas no mercado, para iniciar mais um dia de trabalho como feirante. E que no percurso até a saída da favela, ele foi alvejado por disparos de arma de fogo.
A mãe de Márcio alegou que os disparos vieram da direção dos policiais que realizavam a operação. Segundo ela, conforme foto tirada por moradores da comunidade, Márcio estava caído no chão já baleado e sem portar arma de fogo. Disse ainda que o corpo de Márcio foi levado em um veículo blindado da polícia junto com diversos outros corpos para o hospital, aonde já chegou morto.
Protesto no Jacarezinho após operação policial que deixou 25 mortos
Reuters/Ricardo Moraes
A juíza, no entanto, indeferiu os pedidos de indenização por danos morais decorrentes de suposto tratamento dado do corpo de Márcio, e da suposta violação ao direito dos familiares à adequada investigação pela morte.
“(…) não consta nos autos qualquer prova a fim de corroborar com as alegações da parte autora, razão pela qual não merece acolhimento o pedido”, escreveu a magistrada.
O advogado da mãe de Márcio, João Tancredo, disse que “vai recorrer da sentença para aumentar a indenização e buscar indenização pela alteração do local do crime pelos policiais e pelo tratamento brutal do corpo de Márcio”.
Investigação criminal foi arquivada
Na esfera criminal, a investigação sobre as circunstâncias da morte de Márcio foi arquivada pelo Ministério Público do Rio. No relatório final do caso, os promotores da força-tarefa criada para apuração das mortes no Jacarezinho escreveram que “o fato ocorreu em via pública, mas testemunhas da morte não foram localizadas. Não foi feita perícia no local do fato, no dia da operação policial. Os exames cadavéricos das vítimas Marcio da Silva Bezerra e Rodrigo Paula de Barros não revelam qualquer evidência típica de execução”.
Os corpos de Márcio e Rodrigo foram localizados na Avenida Guanabara, conhecida como Rua do Valão.
Policiais civis durante a operação no Jacarezinho, Zona Norte do Rio, na manhã desta quinta-feira (6)
Ricardo Moraes/Reuters
Em depoimento à Polícia Civil logo após a operação no Jacarezinho, dois policiais civis disseram que ao chegarem à Rua do Valão, foram recebidos a tiros por traficantes, e reagiram. E que, em seguida, avistaram dois homens caídos no chão, sendo um com uma pistola, e o outro com uma submetralhadora.
Os policiais afirmaram ainda que socorreram os homens ao hospital, e que apresentaram as armas apreendidas com os feridos na delegacia.
Na conclusão da investigação, os promotores escreveram que “não foi apurado qualquer elemento de convicção capaz de indicar que a morte das vítimas não tenha ocorrido na forma mencionada pelos Policiais Civis, quando prestaram depoimento no Inquérito Policial, ao apresentarem a ocorrência policial”.