Shirin Saraeian perdeu a visão após ser submetida a uma abdominoplastia e lipoescultura com o cirurgião Renato Tatagiba em 2021. Segundo a sentença, pena será substituída por duas restritivas de direitos e pagamento de 50 salários mínimos; médico também terá que indenizar paciente em R$ 300 mil. Paciente perde a visão após cirurgia e acusa médico
A Justiça condenou o cirurgião plástico Renato Tatagiba a 2 anos e 4 meses de prisão em regime inicial aberto após a paciente Shirin Saraeian, irariana naturalizada brasileira, perder a visão total do olho esquerdo e parcial do direito depois que foi submetida a uma abdominoplastia e lipoescultura em São Paulo. O caso foi revelado em setembro de 2021 pelo Fantástico (assista acima).
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A sentença é da última sexta-feira (17) e cabe recurso. Conforme a decisão da juíza Juliana Trajano de Freitas Barão, a pena de prisão em regime inicial aberto será substituída por duas restritivas de direitos, mais especificamente com prestação de serviços à comunidade ou a entidades públicas, pelo prazo da condenação, e também pela prestação pecuniária no pagamento de 50 salários mínimos.
Como o médico é réu primário e tem bons antecedentes, a juíza decidiu substituir a pena.
Ainda conforme a sentença, Tatagiba terá que indenizar a vítima em R$ 300 mil pelos danos causados após os procedimentos.
“Considerando a extensão do dano, a gravidade dos fatos, as condições econômicas do réu, mostra-se razoável a fixação a título de indenização pelos danos causados à vítima no importe de R$ 300 mil a ser devidamente atualizado, observando se o disposto no art. 45, § 1º, do CP”, disse a juíza.
Em nota, a defesa de Tatagiba informou ao g1 que discorda da condenação e entrará com recurso.
“A defesa técnica do dr. Renato Tatagiba informa que discorda veementemente da decisão judicial proferida. Dentro do prazo legal, será oportunamente interposto o recurso cabível, o qual consideramos possuir grandes chances de sucesso, com base em sólidos fundamentos jurídicos. Reforçamos nossa confiança no sistema Judiciário e seguimos à disposição para eventuais esclarecimentos”, afirmou o advogado Celso Papaleo.
Em nota, a defesa de Shirin comentou sobre a condenação de Tatagiba ao g1.
“Diante de todas as provas, em especial as provas técnicas produzidas pelo IML e Cremesp, o Poder Judiciário atuou de forma acertada ao condenar criminalmente, mais uma vez, Renato Tatagiba por ter se furtado de sua responsabilidade médica. Resta saber, agora, se o Conselho de Medicina permitirá que ele continue fazendo novas vítimas, tendo em vista que esta não é primeira, e talvez não será a última vítima de Renato Tatagiba”, afirmou o advogado Rodrigo Martini.
Médico Renato Tatagiba foi condenado a 2 anos e 4 meses de prisão em regime aberto por cegueira de paciente após cirurgia plástica
Reprodução Instagram/TV Globo
Entenda o caso
Shirin Saraeian é irariana naturalizada brasileira. Consta nos autos do processo que ela conheceu o cirurgião plástico Renato Tatagiba através das redes sociais. Tatagiba acumula mais de 100 mil seguidores no seu perfil do Instagram.
Após uma consulta, ela contratou o profissional para a realização de abdominoplastia e lipoescultura em 30 de abril de 2021 no Hospital Saint Peter, Vila Clementino.
Abdominoplastia é um procedimento que retira excessos de gordura abdominal, com o objetivo de reduzir o excesso de pele e flacidez. Já lipoescultura, conhecida como lipoaspiração, atua na retirada do excesso de gordura em determinadas partes do corpo.
Após a apresentação de todos os exames pré-operatórios exigidos, Shirin relatou que fez os dois procedimentos cirúrgicos, que demoraram aproximadamente 2h30.
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Shirin ainda contou, conforme consta nos autos do processo, que ela começou a sentir tonturas e dificuldades para respirar, e sintomas de anemia assim que deixou o centro cirúrgico, mas recebeu alta no dia seguinte.
Segundo a paciente, dois dias depois da cirurgia, em 3 de maio de 2021, ela percebeu que estava perdendo a visão e entrou em contato com o médico.
O Fantástico teve acesso a áudios que revelaram que Shirin procurou o médico várias vezes no pós-operatório, quando começou a perder a visão. Porém, ele demorou a respondê-la (veja acima).
Em 4 de maio de 2021, já debilitada, ela foi internada na emergência do Hospital Edmundo Vasconcelos com classificação de risco como prioridade máxima. Ainda segundo consta nos autos, Shirin permaneceu internada com disgnóstico de anemia aguda pós-operatória.
Depois de receber bolsas de sangue, ela teve alta em 6 de maio com diagnóstico de cegueira total do olho direito e parcial do esquerdo.
Denúncia
Mensagens enviadas por paciente para médico após procedimento
Reprodução/Fantástico
Com a perda de visão, advogados de Shirin apresentaram ao Ministério Público de São Paulo um pedido de instauração de inquérito policial em 2021. Eles pediram investigação de “lesão corporal gravíssima praticada pelo médico Renato Tatagiba”.
“Absolutamente lamentável que um médico em um pós-cirúrgico não dê a atenção devida a uma paciente que relata estar ficando cega do modo que ela relatou. Com o desespero que ela relatou. É absolutamente lamentável”, afirmou na época o advogado de Shirin, Renato Martini.
O Fantástico teve acesso ao prontuário de Shirin. O documento indica que, no momento da alta, ela apresentava alterações importantes dos sinais vitais.
Além disso, a reportagem apurou que até 2021 o médico respondia na Justiça a 47 processos por erro médico em cinco estados: São Paulo, Rio de Janeiro, Espírito Santo, Minas Gerais e Bahia.
Mensagens enviadas por paciente para médico após procedimento
Reprodução/Fantástico
O que diz o médico
Em entrevista por telefone ao Fantástico, em 2021, Renato Tatagiba disse que seguiu todas as recomendações no momento de dar alta à paciente.
“Eu vou provar que eu agi exatamente dentro dos parâmetros normais, do que se preza a Sociedade Brasileira de Cirurgia Plástica e o Conselho Federal de Medicina. Tanto que os parâmetros estavam normais durante a alta.”
Nos autos do processo consta que o médico, ao prestar depoimento, afirmou que o que ocorreu foi “fatalidade rara”. Afirmou que, após a cirurgia, foi até o quarto da paciente, e ela não foi informou nenhum sintoma, dando alta no dia 1º de maio.
Alegou também que em 3 de maio tomou conhecimento da situação de Shirin e imediatamente comunicou sua assistente para acompanhá-la ao hospital.
Ressaltou que a vítima evoluiu para um quadro raro, mas que foram adotados todos os procedimentos pertinentes e, assim que foi informado sobre a queixa, acionou a equipe, já que não mora na capital paulista.
O médico ainda negou que demorou para responder às mensagens da paciente, segundo consta nos autos.