12 de outubro de 2024

Justiça revoga prisões de mais quatro investigados em operação contra fraudes bilionárias com fintechs

Na segunda, Denis Arruda Ribeiro, apontado como principal articulador do esquema, já havia recebido habeas corpus. Operação foi deflagrada no final de agosto e revelou esquema de lavagem de dinheiro com prejuízo de R$ 7,5 bilhões. Patrick Burret, CEO do Inovebanco, e José Rodrigues, fundador do T10 Bank
Reprodução
O Tribunal Regional Federal da 3ª Região (TRF-3) revogou a prisão preventiva de mais quatro empresários investigados na Operação Concierge, que apura fraudes bilionárias por meio de fintechs – bancos digitais não autorizados pelo Banco Central para operar no sistema financeiro internacional. Veja abaixo quem foi beneficiado.
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A decisão foi assinada pelo desembargador federal André Nekatschalow na quinta-feira (10). Na segunda (7), o tribunal, em São Paulo, revogou a prisão de Denis Arruda Ribeiro, apontado pela investigação da Polícia Federal como o principal articulador do sistema criado para a prática de lavagem de dinheiro.
A decisão do magistrado para revogar a prisão dos quatro investigados seguiu a mesma linha para o deferimento do habeas corpus de Denis. De acordo com o juiz, apesar de os suspeitos apresentarem funções diferentes dentro do suposto esquema, as prisões preventivas foram decretadas com base em “indícios de materialidade, sem oferecimento de denúncia”.
“Não se ignora a gravidade das condutas apuradas nas investigações policiais, entretanto, não há como superar que a fundamentação da decisão que decretou as prisões destacou por diversas vezes a existência apenas de indícios de materialidade dos delitos. (…) Entende-se que as prisões foram decretadas pela autoridade impetrada com a finalidade de cessar as atividades criminosas e garantir a ordem a pública, no entanto, o que se espera é que a investigação já esteja avançada para que as medidas mais extremas sejam requeridas e deferidas”, diz o texto da decisão.
Ao g1, a Polícia Federal afirmou que os alvarás de soltura ainda não haviam sido expedidos.
Quem teve a prisão revogada?
Aedi Cordeiro dos Santos: dono da JJA Assessoria Contábil, Aedi é apontado pela investigação como o responsável por arquitetar o esquema criminoso e utilizar as duas fintechs para movimentar milhões de reais.
Patrick Bezerra Burnett: presidente e fundador do InovePay, fintech investigada por gestão fraudulenta na Operação Concierge. Segundo a investigação, Aedi é contador de outras duas empresas em que Patrick figura como sócio.
José Rodrigues Costa: sócio-fundador de outra fintech investigada, o T10 bank, advogado no escritório Plácido & Rodrigues e suplente de deputado federal pelo PP, ele teria, segundo a investigação, utilizado laranjas para abrir a fintech.
Guilherme Guitte Concato
Denis Arruda Ribeiro, presidente do T10 bank, apontado pela investigação da Polícia Federal como o principal articulador do sistema criado para a prática de lavagem de dinheiro (já tinha tido a prisão revogada na segunda-feira).
O advogado de José Rodrigues, Ralph Tórtima Filho, afirmou ao g1 que entende como “acertada” a decisão do tribunal e, no curso de eventual ação penal, vai demonstrar que o T10 bank estava regular e nunca houve, por parte dos gestores, qualquer irregularidade.
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Operações suspeitas
A investigação aponta que as fintechs, com sede em Campinas (SP), fizeram transações suspeitas sem que os bancos notificassem os órgãos de controle. Além disso, diz que, ao não controlarem as transações de pessoas físicas, os bancos descumpriram regras do setor bancário e facilitaram o cometimento de crimes.
🔎 Fintech – combinação das palavras “financial” (finanças) e “technology” (tecnologia), em inglês – é o termo utilizado para descrever instituições que usam tecnologia para oferecer serviços e produtos digitais no mercado financeiro.
“As instituições financeiras oficiais (Banco Rendimento e Banco Bonsucesso) burlaram os regulamentos do Banco Central e autorizaram a utilização de suas contas bancárias como ‘contas bolsões’ por parte dessas instituições financeiras clandestinas, as quais, repita-se, movimentaram vultosa quantia de recursos criminosos, sem nenhum tipo de controle pelos órgãos competentes e até mesmo dificultando a análise por parte dos órgãos responsáveis pela persecução penal”, apontou o Ministério Público Federal (MPF).
Em nota, o banco BS2 (antigo Bonsucesso) disse nunca ter prestado serviços para o T10 Bank, e reforçou que forneceu às autoridades “documentos que comprovam que os serviços prestados para a i9Pay eram regulares e não tinham qualquer relação com as possíveis atividades ilícitas cometidas pela empresa e levantadas na operação Concierge”.
“Tanto é que o banco foi autorizado pela juíza do caso a efetuar pagamentos a estabelecimentos comerciais clientes da i9Pay, dias após a deflagração da operação. Isso também evidencia que o BS2 não opera com conta bolsão, e sim, contas individualizadas e monitoradas. Em outra evidência, o banco também forneceu às autoridades cópias de reportes que já haviam sido enviados ao Coaf antes da operação. Ao tomarmos conhecimento dos fatos levantados pela Concierge, os serviços para a i9Pay foram encerrados”, destacou.
A organização criminosa investigada pela Polícia Federal (PF) na Operação Concierge é suspeita de lavar dinheiro do tráfico de drogas e esconder valores para a UPBus, empresa de ônibus suspeita de envolvimento com o Primeiro Comando da Capital (PCC).
A operação
A Operação Concierge foi deflagrada na manhã do dia 28 de agosto. As 14 prisões foram feitas nas casas dos investigados em Campinas (SP), São Paulo (SP), Ilhabela (SP), Sorocaba (SP) e Americana (SP).
As apreensões ocorreram em vários estabelecimentos, incluindo lojas de veículos. A Justiça ainda autorizou o bloqueio de R$ 850 milhões em contas associadas à organização criminosa.
Sob escolta, carros de luxo apreendidos foram levados ao longo do dia para o pátio da PF em Campinas e para um estacionamento alugado pela corporação. São utilitários esportivos e carros esportivos de marcas, como Porsche, Land Rover, BMW, Volvo e Mercedes-Benz.
Ainda de acordo com a PF, os agentes também apreenderam joias, relógios e centenas de máquinas de cartão de crédito, além de documentos, celulares e computadores.
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Polícia Federal
Como funcionava o esquema?
As fintechs investigadas possuem uma conta-corrente como pessoa jurídica em um banco comercial tradicional. Essa conta é chamada de “bolsão” e permite fazer transações com o dinheiro de seus clientes de forma “invisível”, por ser praticamente impossível rastreá-las. Veja o exemplo abaixo:
A pessoa física “A” tem contas bloqueadas e quer se manter ativa no mercado financeiro, fazendo transações, recebendo e enviando valores. Ela, então, abre uma conta com a fintech e a controla por meio de um aplicativo;
Essa pessoa “A” faz uma transferência para a pessoa “B” por meio desse aplicativo;
A fintech, por sua vez, tem uma conta-corrente como pessoa jurídica em um banco comercial tradicional;
Quando transfere um valor para a pessoa “B” por meio da fintech, na verdade, a pessoa “A” está transferido para a conta jurídica que a fintech tem no banco comercial.
Como a pessoa “A” não tem vínculo com o banco comercial, seu nome não aparecerá no extrato, mas, sim, a fintech titular da conta. A transferência para a pessoa “B”, por sua vez, aparece no extrato tendo como origem a pessoa jurídica da fintech e não a pessoa “A”. Nesse esquema, a pessoa “A” fica invisível e pode manter seu patrimônio livre de restrições.
A investigação aponta que o volume de dinheiro movimentado a crédito pelas duas fintechs, entre 2020 e 2023, foi de R$ 3,5 bilhões, segundo a Polícia Federal.
‘Concierge’
Os investigados respondem por gestão fraudulenta de instituições financeiras, operação de instituição financeira não autorizada, evasão de divisas, lavagem de dinheiro, crimes contra a ordem tributária e organização criminosa.
O nome da operação, “Concierge”, é uma palavra francesa que denomina o profissional que atende necessidades específicas de clientes e faz alusão à oferta de serviços clandestinos para ocultação de capitais.
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