Sexto disco solo do cantor e compositor do Recife tem alta voltagem poética e traz as vozes de Chico César, Martins, Marcelo Falcão, Ylana e Zé Renato. Lula Queiroga lança o sexto álbum solo, ‘Capibaribum’, na sexta-feira, 5 de abril, com dez composições autorais
Sidarta / Divulgação
Capa do álbum ‘Capibaribum’, de Lula Queiroga
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Resenha de álbum
Título: Capibaribum
Artista: Lula Queiroga
Edição: Luni Produções
Cotação: ★ ★ ★ ★
♪ “ […] É o rio que passa na minha aldeia / Passeia e desenha a cidade / […] / O rio que corre no veio do tempo / Deságua na eternidade”.
Os versos de Capibaribum – parceria de Lula Queiroga com Yuri Queiroga que batiza o sexto álbum solo de Lula em enérgica gravação feita com a adesão vocal de Chico César – ambienta o disco que chega ao mundo na sexta-feira, 5 de abril, com dez músicas autorais de alta voltagem poética e sonora.
Em Capibaribum, Lula Queiroga – cantor e compositor nascido no Recife (PE) há 64 anos – ergue pontes para soar o universal ao mesmo tempo em que permanece mergulhado no Capibaribe, rio que banha o estado de Pernambuco, aldeia e alma do artista revelado há 41 anos em álbum, Baque solto (1983), assinado com Lenine.
Parceiro de Queiroga em músicas como A ponte (1997), oportunamente reconstruída no álbum Capibaribum em gravação com Marcelo Falcão e a guitarra de JR Tostoi que exemplifica a potência da produção musical orquestrada por Yuri Queiroga com Lula, Lenine conseguiu ir além da aldeia a partir da década de 1990 e virou nome nacional.
Já a voz de Lula Queiroga – cuja relevante discografia solo foi iniciada há 23 anos com o álbum Aboiando a vaca mecânica (2001) – tem ecoado somente em nichos antenados da música brasileira do século XXI. De todo modo, Capibaribum reitera para a eternidade a relevância da obra do artista.
“Capibaribum é um mergulho no rio ancestral, no rio mitológico que desenha na minha cidade um trajeto sinuoso. É um álbum híbrido, cheio de riquezas rítmicas onde a água, a gravidade, o amor e o tempo são temas que se entrelaçam nas canções”, conceitua Lula Queiroga.
As riquezas rítmicas mencionadas pelo artista estão enraizadas nas tradições musicais da nação nordestina. Se o xote Cerca viva (Lula Queiroga e Yuri Queiroga) remói a dor de amor perdido, mas com a esperança do perdão, como explicita verso da letra cantada pelo artista com Bruna Alimonda, a regravação do maracatu Piaba de ouro (Lula Queiroga e Erasto Vasconcelos, 1994) tem baque inebriante e o canto vivaz de Ylana Queiroga.
Já a máscula gravação da música-título abre o álbum Capibaribum com a impressão de que se ouve um disco de Lenine, mas essa incômoda sensação se dilui ao longo das outras nove faixas.
Entre a urgência claustrofóbica de Ela é o tempo (Lula Queiroga e Yuri Queiroga) – canção de versos como “Aonde isso vai não sei / Tô preso no tempo / E não sei sair / […] / Aonde isso vai não sei / As horas não deixam / Ninguém dormir” – e a alegria serelepe do Forró do nevoeiro (Lula Queiroga), este turbinado com a embolada da dupla Caju & Castanha, o álbum Capibaribum mergulha no lirismo da balada Passagem secreta (Lula Queiroga), faixa em que a voz do convidado Zé Renato parece fazer jus ao adjetivo “aquática” cunhado há décadas por Hermínio Bello de Carvalho.
Há também beleza no mergulho na delicadeza da canção Sobreviventes (Lula Queiroga, 2013), lançada por Lia Sabugosa há 11 anos e ora gravada pelo dono da música em duo com o conterrâneo Martins, artista que emergiu de águas recifenses nos últimos anos e vem sendo descoberto além das fronteiras de Pernambuco.
Esse tempo de delicadeza é insinuado na introdução de A curva da luz (Lula Queiroga e Yuri Queiroga), música dos versos “Amor é o antidestino / Que expõe o coração / À curva da luz”, mas logo se dilui com o som potente que banha boa parte das faixas de Capibaribum, álbum que capta e expõe tensões e perturbações mentais do tempo presente, como exemplifica Hora do pesadelo (Lucky Luciano, Yuri Queiroga e Lula Queiroga), cuja letra destaca os versos “Eu ando tendo pesadelos estranhos / Tudo parece tão real / Como naqueles filmes de apocalipse / Só que não muda de canal”.
Primeiro álbum de Lula Queiroga desde Aumenta o sonho (2017), Capibaribum corre na mesma direção dos discos anteriores do artista, mostrando a unidade e coerência da obra. Lula Queiroga canta e compõe como se todo dia fosse o fim do mundo.
Imagem do encarte da edição em CD do sexto álbum solo de Lula Queiroga, ‘Capibaribum’
Direção de arte de Mateus Alves e Guilherme Queiroga