13 de novembro de 2024

Lutécio radioativo: entenda como remédio pode ajudar jovem com tumor raro que causou mudança na cor da pele


Sabrina Gomes tem um tumor no tórax que levou ao desenvolvimento da Síndrome de Cushing. Ambos os problemas causam dificuldades respiratórias, insuficiência renal, pressão alta, distúrbios metabólicos e podem até mesmo a mudar a tonalidade da pele. Ela lutava na Justiça para receber do estado medicação que custa R$ 32 mil. Jovem com tumor raro deixou a UTI e aguarda melhora para receber remédio
A jovem Sabrina Gomes, diagnosticada com um tumor raro que mudou a cor da pele dela, espera uma melhora no quadro de saúde para receber um remédio que pode ajudar no tratamento. A medicação é o lutécio radioativo. O g1 explica abaixo como funciona a medicação.
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💊 Lutécio radioativo: é um radiofármaco, remédio que possui elementos radioativos, usado em tratamento não convencional. É endovenoso, ou seja, aplicado diretamente na veia do paciente.
🧫 Efeito: a substância possui uma carga radioativa que consegue atacar as células do tumor.
💉 Como funciona: quando aplicado na veia, a medicação se fixa nas células cancerígenas, podendo destruir o tumor.
🦠 Absorção no corpo: as células que produzem hormônios (células de linhagem neuroendócrinas) podem captar e incorporar radiofármacos. O medicamento destrói essas células, o que pode causar uma diminuição do volume do tumor.
🔬 Exames: Antes de recomendar este tipo de medicamento, é realizado um exame para identificar se as células cancerígenas possuem “receptores” que permitiram que o radiofármaco – no caso, o lutécio – se acoplem a elas.
🧪 Dosagem: O tratamento com lutécio é feito com quatro aplicações, isto é, quatro doses, com um intervalo de seis semanas entre cada uma.
Espera por medicamento
Jovem com tumor raro notou mudança na cor da pele há quatro anos; entenda condição rara.
Arquivo pessoal
Sabrina foi diagnosticada com um timoma, um tumor raro no tórax, que levou ao desenvolvimento da Síndrome de Cushing. Juntos, os dois problemas provocaram a alteração da cor da pele, além de diversos outros problemas como hipertensão, dificuldades respiratórias, insuficiência renal e distúrbios metabólicos. Ela, inclusive, precisou abandonar os estudos após receber o diagnóstico para passar pelo tratamento.
No começo de novembro, Sabrina passou por duas cirurgias por problemas causados pelo tumor. Ela saiu da UTI na última sexta-feira (8) e foi transferida para o Instituto do Câncer do Ceará. Agora, ela é avaliada pela equipe médica para saber quando vai ter condições físicas de receber o lutécio radioativo. A aplicação da medicação exige uma melhora no quadro de saúde dela.
A família espera há meses receber da Secretaria de Saúde do Ceará (Sesa) o medicamento, que tem alto custo: em média R$ 32 mil, e ela precisa de quatro doses. (Veja resposta da secretaria mais abaixo)
A medicação é fabricada no Instituto de Pesquisas Energéticas e Nucleares (Ipen) em São Paulo. Contudo, o remédio tem um prazo de validade curto, que implica no processo de aplicação.
Cearense luta contra doença rara que altera a cor da pele
“Dizemos que não são produtos de prateleira, então não temos em estoque. São produzidos mediante encomenda, mediante uma demanda prévia. No caso específico do Dotatato Lutécio, esse radiofármaco tem um prazo de validade de dois dias”, explicou Elaine Bortoletti de Araújo, coordenadora da área de radiofarmácia do Ipen, em entrevista ao Fantástico.
“Então, dentro dessa condição de armazenamento dele, que a gente estabeleceu aqui, que é sob congelamento, esse produto se conserva por 48 horas, dois dias, e ele pode ser utilizado”, complementou Elaine.
Sabrina já passou por três quimioterapias, radioterapia e cinco cirurgias – a última foi realizada no último dia 2 de novembro para desobstruir a traqueia, que estava sendo comprimida pelo tumor, impedindo a jovem de comer e dificultando a respira2ção. Atualmente, o tumor localizado no tórax está com 17 centímetros.
A esperança da família é que, além de curar a doença, o tratamento permita a Sabrina retomar alguns de seus sonhos. A jovem quer voltar a estudar e cursar Medicina. Além disso, também quer viajar de avião e ir a shows de cantores como Bruno Mars.
“A Sabrina é um exemplo de superação, de resiliência. Resiliência resume a Sabrina, porque ela é uma pessoa muito, extremamente positiva”, descreveu Vanessa Ívina, prima da jovem.
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O tumor no tórax de Sabrina produz um hormônio chamado ACTH. Este hormônio já é naturalmente produzido pelo corpo humano para regular diversas funções do organismo. Mas, por conta do tumor, o organismo de Sabrina o produz em excesso.
Essa alta quantidade de ACTH fez com que as chamadas glândulas adrenais produzissem, também em excesso, o cortisol. O cortisol é responsável, entre outras coisas, por regular os níveis de açúcar no sangue e fortalecer o sistema imunológico.
O excesso de cortisol, porém, causa problemas como hipertensão arterial, acúmulo de gordura, fadiga, dificuldade de cicatrização, entre outros sintomas.
Foi este cenário do tumor produzindo ACTH, que levou à hiperprodução de cortisol, que fez a jovem desenvolver a Síndrome de Cushing.
“Não é todo tumor que produz hormônio. O mais comum é não produzir, por isso que são entidades raras”, explica a médica endocrinologista Ana Rosa Quidute, do Hospital Universitário Walter Cantídio (HUWC), que acompanha o caso de Sabrina.
Ela contou que, quando Sabrina começou a ser atendida no HUWC, o mais urgente foi estabilizar os níveis hormonais do organismo dela, que tinha desenvolvido a Síndrome de Cushing.
“Então, apesar dessa paciente ter um tumor, a gente tem que tratar rapidamente esse excesso hormonal, porque se você não trata o excesso hormonal, ele [paciente] morre primeiro do excesso hormonal que até do próprio tumor”, explicou.
As glândulas adrenais de Sabrina, estimuladas pelo ATCH em excesso, hiperestimulavam a produção de cortisol. Primeiro, a equipe tentou controlar a situação hormonal por meio da medicação. No entanto, com a piora do quadro, foi feita uma adrenalictomia, cirurgia para retirada das glândulas adrenais.
Sabrina Gomes, jovem do Ceará tem tumor e síndrome que fazem mudar cor da pele
Reprodução/Instragram e Reprodução/TV Verdes Mares
Mudança na cor de pele: entenda o que aconteceu
A retirada das glândulas, em 2022, resolveu os excessos de cortisol causado pela Síndrome de Cushing, mas o tumor continuou a crescer. A cirurgia, no entanto, gerou um efeito colateral – uma aceleração na mudança na cor da pele de Sabrina.
“Essa cirurgia deixou a minha pele muito mais escura, junto com o tumor, que produz um hormônio chamado ACTH. Então, esse hormônio mexeu com a cor da minha pele. Junto com o tumor, como ele está bem grande, a cada vez eu vou ficando mais escura”, explicou a própria Sabrina, em vídeo publicado nas redes sociais.
Entenda:
➡️ Após a retirada das glândulas adrenais, o tumor continuou a estimular a produção do hormônio ACTH
➡️ O ACTH tem a mesma origem e é produzido no mesmo processo que cria o hormônio MSH, que é responsável pela produção de melanina, uma proteína que dá cor à pele
➡️ Como o MSH e ACTH têm uma origem comum, os receptores das células acabam entendendo os dois como semelhantes
➡️ Com os níveis de ACTH altos por conta do tumor, o hormônio continuou a se acoplar com as células receptoras que produzem melanina, como se fosse MSH; já que os dois hormônios são “parecidos”, as células acopladas ao ACTH, pensando se tratar do MSH, aumentaram a produção de melanina
➡️ O corpo de Sabrina, com excesso de ACTH, começou a produzir melanina em excesso, levando à hiperpigmentação da pele, causando o escurecimento de áreas do corpo.
A equipe médica que acompanha Sabrina ainda não sabe se a condição da mudança da sua cor de pele é reversível. No entanto, para haver qualquer mudança no quadro clínico, é necessário que o tumor reduza de tamanho – o que dependeria do sucesso do tratamento com lutécio.
O que diz a secretaria
O coordenador de monitoramento, avaliação e controle do sistema de saúde da Sesa, Breno Novais, explicou que como o tratamento que Sabrina precisa não está no rol de tratamentos disponíveis no SUS, a secretaria precisou abrir um procedimento específico para comprar o remédio respeitando a legislação vigente.
“A gente abriu um processo de dispensa de licitação para atender de forma célere e segura a Sabrina. No primeiro processo que foi aberto, nenhuma unidade habilitada se cadastrou para a execução desse serviço. Nós fizemos nova comunicação com os serviços habilitados aqui do estado”, explicou Breno.
“Por tratar-se de um serviço, de uma medicação que não consta no rol do SUS, a Secretaria está seguindo todos os trâmites legais para a contratualização segura desse serviço, desse tratamento que a Sabrina tanto precisa”, completou o coordenador.
Na segunda vez que o processo foi aberto, o Instituto do Câncer do Ceará demonstrou interesse na contratação do serviço. Breno disse que, com a demonstração de interesse do ICC, a Secretaria seguiu com a contratação na sequência.
Veja a cronologia do caso de Sabrina
2015: Sabrina começou a sentir os primeiros sintomas do tumor aos 15 anos. Ela teve inchaço e manchas pretas pelo corpo ficou inchada, além de sentir ansiedade devido aos sintomas
2015-2017: Sabrina passou por duas cirurgias, ainda adolescente, para retirada do nódulo, enquanto ainda era paciente no Hospital Infantil Albert Sabin.
2018: Ao completar 18 anos, Sabrina passou a ser atendida no Hospital Universitário Walter Cantídio (HUWC), onde a equipe médica descobriu que o tumor havia levado a jovem a desenvolver Síndrome de Cushing
2020: A primeira vez que Sabrina notou o início do escurecimento na pele veio cerca de cinco anos após o diagnóstico. No entanto, a pele começou a escurecer de verdade (mas ainda em grau leve) no ano seguinte.
2022: Sabrina passou por uma cirurgia de retirada das glândulas adrenais, o que acelerou o processo de escurecimento da pele. A retirada das glândulas resolveu os excessos de cortisol, mas a livre circulação do ACTH causou a mudança severa no tom de pele
2024: Sabrina passou por radioterapia e por uma nova cirurgia para fazer dois procedimentos: drenar a água do pericárdio (membrana que envolve o coração) e alargar a traqueia, que está sendo comprimida pelo tumor.
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