Prefeitura de Porto Alegre mapeou 300 pacientes com a doença, acompanhados em postos de saúde do município. Segundo dados do Ministério da Saúde, doença é mais comum – mas não exclusiva – na população negra. Responsável por dores agudas que começam nos primeiros meses de vida, a doença falciforme é uma enfermidade hereditária e genética e é mais comum – mas não exclusiva – entre a população negra.
📌Segundo o Ministério da Saúde, cerca de 8% da população negra do país foi diagnosticada pela doença em 2021.
📲 Acesse o canal do g1 RS no WhatsApp
Em Porto Alegre, cerca de 300 pessoas com a doença são acompanhadas, e a Associação Gaúcha de Doença Falciforme (Agafal) procura mais pacientes.
“Temos um grupo de monitoramento das pessoas que têm doença falciforme na cidade, pra saber como está a condição de saúde dessa pessoa e aí fazer um vínculo bem estabelecido entre usuário e serviço de saúde”, afirma Gisele Martins Gomes, coordenadora das Políticas de Saúde da População Negra em Porto Alegre.
Terapia genética é esperança contra doença ‘invisível’ que afeta dezenas de milhares de brasileiros
“Quando se inicia o processo de assistência, de qualificação dessa assistência, a gente verifica que essas pessoas não estavam circulando na atenção primária”, pondera a coordenadora.
📌Segundo uma pesquisa conjunta do Instituto de Estudos para Políticas de Saúde (IEPS) e do Instituto Çarê, 74,7% das internações, no Brasil, foram de negros, em um levantamento que analisou o período de 2012 a 2023.
A doença falciforme tem esse nome por uma alteração dos glóbulos vermelhos. Em vez de um formato circular, que circula fluidamente pelas veias, as células de quem tem a doença falciforme são como uma foice. Com mais dificuldade para percorrer o corpo, causam crises de dor e podem originar AVC, dificuldade respiratória, anemia e outras complicações.
Origem na África
A doença falciforme tem início, pelos relatos científicos, na África Subsariana, segundo Gisele. “E ali é o lugar onde as pessoas foram desenraizadas, foram escravizadas e trazidas pras Américas. E até hoje tem um impacto muito grande na população negra. Se não tratada, a pessoa tem uma expectativa de vida de 5 anos”, afirma.
Carla Regina da Rosa, de 47 anos, enfrentou a falta de apoio na infância. Relata que teve muitas crises de dores, e chegou a ter as duas pernas engessadas aos 9 anos.
Hoje, ela é vice-presidente da Associação Gaúcha de Doença Falciforme. A entidade se reúne todas as quintas-feiras, das 14h as 17h, em uma área cedida pelo Governo do Estado na Casa de Cultura Mário Quintana. A sala é a “CDE”, Centro de Desenvolvimento da Expressão, e fica no quinto andar do prédio histórico do centro da capital.
“Aqui temos palestras, falamos dos cuidados e fazemos artesanato, pra ajudar na renda das famílias. Eu queria ter essa sala cheia, mas é muito raro as pessoas irem nos postos de saúde pelas crises de dor. Vão direto pra UPA ou emergências. Essa é a dificuldade de captar as pessoas”, afirma, no espaço com apenas dois pacientes.
Esperança no transplante de medula
Miguel, de 2 anos, vai com a mãe nos encontros. Quando está sem dor, brinca e se diverte. Mas nem sempre é assim.
“É à base de morfina, medicamentos fortes. A gente já ficou 15 dias internado, de não conseguir tocar nele. De ele ficar dois, três dias sem poder pegar no colo, sem trocar roupa, devido às crises”, lembra Scheila Ribeiro da Costa, mãe do garoto.
Uma esperança para mudar esse quadro está no horizonte: ele aguarda a definição da data para o transplante de medula. O pai se mostrou compatível nos testes.
“A gente espera há muito tempo essa notícia, que é do transplante de medula óssea. Faz pouco tempo que tá vindo pra quem tem a doença. É uma grande esperança pra cura”, se emociona Scheila. Até a metade de dezembro, o transplante deve ser marcado, de acordo com a mãe.
“Será um novo aniversário, uma nova vida. E quando a medula pegar, a gente vai ter outro aniversário. Eu agradeço todo dia por ele ter me escolhido como mãe e eu ter aceitado. Porque ele é a minha luz, ele é a minha esperança e eu sou a esperança dele. Eu vivo por ele”.
Transfusão de sangue uma vez por mês
Filha de haitianos, nascida na capital gaúcha, Maria Vitória Dorisca, de 7 anos, precisa ir ao banco de sangue do Hospital de Clínicas de Porto Alegre mensalmente. No local, parte do sangue é substituído.
“É uma retirada de parte do sangue do paciente, pra tirar essa hemácia com formatinho de foice. E substituir ela por uma hemácia saudável. O sangue que ela recebeu continua normal, mas o sangue que ela mesmo produz, tem essa alteração. Então, ela precisa, permanentemente, fazer essas reposições”, explica a médica hemoterapeuta do banco de sangue do Hospital de Clínicas, Bianca Spindler.
A menina tem, de forma recorrente, quadros de anemia e desmaios.
“Às vezes, ela desmaia na escola. Eu chego lá, e as professoras já levaram pro hospital. E muita dor, sempre”, relata a mãe da menina, a auxiliar de serviços gerais Murielle Dorisca.
Os irmãos de Maria Vitória ficaram no Haiti. No Brasil, pai e mãe precisam faltar o trabalho para as consultas e procedimentos.
“Desde seis meses eu tô todo mês aqui. Às vezes ela é internada e é bem duro pra mim, porque eu não tenho parente aqui. É só eu e o pai dela. E eu trabalhando. Cada vez que eu tenho que trazer ela tem que perder pelo menos um, dois, três dias. E o atestado dela tem limite”, lamenta a mãe.
VÍDEOS: Tudo sobre o RS