26 de dezembro de 2024

Menos policiamento, reabastecimento de aviões e ‘narcogarimpo’: facções levam tráfico ao interior do PA

Dados oficiais mostram que estado aumentou apreensões de maconha e cocaína em cidades menores nos últimos 5 anos. Antes, as apreensões se concentravam na região metropolitana. Com 158 mil habitantes, Abaetetuba lidera apreensões em 2024, com 3,5 toneladas. Maior parte das apreensões de drogas ocorrem no interior do Pará
Facções criminosas, ligadas ao tráfico de drogas, têm buscado cada vez mais as cidades do interior do Pará e levado a mira da polícia mais para fora da região metropolitana de Belém nos últimos cinco anos.
É o que mostra os dados obtidos pelo g1, via Lei de Acesso à Informação, de todas as apreensões de maconha e cocaína no estado desde 2019.
Esses grupos de criminosos buscam formas para que as drogas circulem, se atrelando a crimes ambientais na Amazônia, como o “narcogarimpo” e as pistas de voo clandestinas, além de encontrarem menos policiamento.
Nos cinco primeiros meses de 2024, 92% das apreensões de drogas pela polícia ocorreram no interior do estado.
Foram no total 6,3 toneladas de maconha e cocaína encontradas, a grande maioria, em regiões onde também há presença de facções criminosas. Segundo o governo, o número de apreensões representa aumento de 66% em relação ao mesmo período de 2023.
O secretário de Segurança Pública do Pará, Ualame Machado, disse, em entrevista ao g1, que defende a maior integração entre as polícias do Estado e a Federal para combater o crime cada vez mais sem fronteiras.
“O Pará é o limite de combustível para uma aeronave com drogas que sai do Peru, da Colômbia ou da Venezuela para atravessar a Amazônia. Essa aeronave busca justamente áreas de garimpo para reabastecer e também fazer o escoamento. É nesse momento, por exemplo, que dezenas de quilos de droga são trocados por 1 kg de ouro ilegal”.
(à esquerda) Pista clandestina no Pará; (à direita) área de garimpo ilegal de minérios no Pará.
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Ele também explica como a polícia vem enfrentando a chamada “interiorização” do crime na Amazônia, atrelado aos crimes ambientais.
“Não aumentou o tráfico, mas melhorou a estratégia de combate, que é reavaliada a cada momento, justamente de acordo com as manobras que são feitas pela criminalidade”, afirma.
Dados do combate ao tráfico
A região metropolitana tem oito dos 144 municípios paraenses: a capital Belém, Ananindeua, Barcarena, Benevides, Castanhal, Marituba, Santa Bárbara do Pará e Santa Izabel do Pará. Nestas cidades foram apreendidos 518,9 quilos (8%) de drogas nas ações policiais em 2024. O restante foi todo no interior.
Os números presentes em boletins de ocorrência e procedimentos desde 2019 mostram, ainda, que:
as apreensões tiveram aumento em relação a 2019;
nestes anos, a quantidade apreendida na região metropolitana superou o interior apenas em 2020;
dez cidades somam 5.673,72 quilos de drogas apreendidas em 2024. Isto representa 89% das apreensões em todo o estado.
Veja os números nos gráficos abaixo:
Interiorização: o ‘nó’ na rede do tráfico
Especialista em segurança pública, Roberto Reis explica que o tráfico de drogas busca os municípios do interior da Amazônia por fatores como a baixa quantidade de população e o “papel estratégico que muitos desses municípios têm como ‘nós’ em uma rede para escoamento da droga”.
“Cidades identificadas como ‘nós’ na rede do tráfico ganham uma importância e passam a ter um papel maior nesse contexto das apreensões”.
Reis explica, ainda, que na Amazônia “quando há uma maior concentração da atuação policial numa determinada rota, o tráfico automaticamente se utiliza de tecnologias, até bastante avançadas, a fim de se desviar para outras rotas, menos policiadas e que não afetem tanto nos custos”.
Mais de três toneladas de drogas são apreendidas no Pará; é a maior apreensão por forças estaduais
Polícia Civil Pará/Divulgação
Abaetetuba, no nordeste do Pará, foi o município campeão de apreensões em 2024 com 3,5 toneladas e pode ser considerado como um “nó” na rede do tráfico.
A estratégia dos traficantes de passar pelo município, segundo o secretário Ualame, é chegar até Barcarena, onde está o “porto mais próximo dos EUA”: Vila do Conde.
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Abaeté, como a cidade de 158 mil habitantes é conhecida, deve receber nos próximos meses uma base de patrulhamento fluvial, semelhante à instalada no arquipélago do Marajó. Em Óbidos, no oeste do estado, uma base fluvial também está prevista para ser instalada.
Base Fluvial Antônio Lemos, em Breves, no Marajó – Pará.
Reprodução / Agência Pará
Cidades com presença de facções
O estudo “Cartografias da violência na Amazônia”, do Fórum Brasileiro de Segurança Pública (FBSP), divulgado em 2023, já havia apontado que ao menos 22 facções criminosas nacionais e estrangeiras atuam na Amazônia Legal, incluindo o Pará.
O levantamento mostrou a presença de facções em 178 das 772 cidades da Amazônia Legal (24,6%). E em 80 delas, há disputa entre facções.
Os municípios que costumam aparecer no ranking estadual com mais apreensões são também onde há mais presença de facções brasileiras – e algumas também até ligadas a facções de países vizinhos, como o Peru, Colômbia e Venezuela.
Entre as dez cidades com mais apreensões em 2024 no Pará, nove têm presença de facções criminosas e a exceção é Redenção.
E, entre as nove com presença de facções, três são áreas de disputas entre diferentes facções: Santarém, Itaituba e Altamira ; as outras seis são controladas pelo Comando Vermelho.
Cidades do Pará com mais drogas apreendida em 2024
Arte / g1
“Costumo dizer que segurança pública se faz com polícia, mas não só com ela. A estrutura dessas cidades do interior, muitas vezes, não são de policiamento, de saúde, de educação, por isso o tráfico vem buscando essas fragilidades. Mas nós estamos combatendo isso de forma integrada, com ações concluídas em grandes apreensões. Mas também, por exemplo, com as Usinas da Paz, uma ferramenta em que o governo oferece, além de oportunidades para a comunidade, uma maior aproximação da polícia com a sociedade”, afirma o secretário Ualame.
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