Medida do governo argentino foi criticada até por aliados de Milei. O nome do juiz federal Ariel Lijo é considerado amplamente controverso no país. O presidente da Argentina, Javier Milei, completou nesta semana seu primeiro ano de mandato
Mariana Greif/Reuters
O presidente da Argentina, Javier Milei, nomeou por decreto dois juízes para a Suprema Corte do país na terça-feira (25), o que abre uma nova crise para seu governo, já abalado pelo escândalo da criptomoeda $Libra.
Os nomeados para a mais poderosa corte do país são o juiz federal Ariel Lijo e o advogado Manuel García-Mansilla. A medida é polêmica porque a Constituição argentina dita que novos juízes da Suprema Corte devem ser aprovados pelo Senado, similar como ocorre no Brasil. Até aliados de Milei, como o ex-presidente Mauricio Macri, criticou o decreto de Milei.
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A Corte Suprema conta atualmente com três dos cinco juízes necessários, após a saída de dois integrantes em 2021 e 2024. Milei propôs os nomes de Lijo e García-Mansilla inicialmente em 2024, mas seus nomes ainda não foram discutidos pelo Senado.
O governo nomeou Lijo e García-Mansilla “em comissão”, ou seja, interinamente, até o fim do ano, e justificou a decisão sob o argumento de que o Senado “optou pelo silêncio” diante das indicações feitas por Milei. A vice-presidente argentina, Victoria Villarruel, preside o Senado.
No decreto, o governo ainda criticou o Senado e acusou o órgão de motivações políticas e descumprimento do processo legal: “A Câmara Alta deveria ter dado seu acordo aos candidatos propostos pelo Poder Executivo. De maneira nenhuma o Senado tem a condição de rejeitar o acordo dos candidatos propostos pelo presidente com base em preferências pessoais ou políticas dos senadores.”
O decreto de Milei ocorre em meio a um recesso do Congresso argentino, que volta apenas no sábado (1º). De acordo com a Constituição, nesse intervalo, o Poder Executivo pode nomear juízes da Corte em comissão, até “o fim da próxima Legislatura”.
O nome de Ariel Lijo é considerado amplamente controverso na Argentina. Parlamentares e autoridades questionaram a idoneidade do juiz federal Lijo, que foi acusado de conspiração, lavagem de dinheiro e enriquecimento ilícito, e foi alvo de mais violações éticas do que quase qualquer outro juiz na história de sua corte.
Lijo é criticado por não levar para frente 13 processos de corrupção, muitos envolvendo políticos de alto escalão. Segundo levantamento da ONG Associação Civil pela Igualdade e a Justiça (ACIJ), alguns deles estão abertos há mais de dez anos.
A Suprema Corte analisará o pedido de licença de Lijo de seu cargo como juiz federal, e o governo argentino pressiona para que isso aconteça ainda nesta semana, para que Lijo possa assumir até sábado, quando Milei discursará na Assembleia Legislativa argentina.
A Human Rights Watch criticou a ação de Milei como “um dos ataques mais graves contra a independência da Suprema Corte na Argentina desde o retorno da democracia.”
“O presidente Milei não pode fingir que pode escapar dos mecanismos institucionais simplesmente porque não obteve os votos necessários no Senado para nomear seus candidatos”, disse Juanita Goebertus, diretora para as Américas da organização com sede em Nova York.
As nomeações, feitas dias antes do Congresso retomar suas atividades após o recesso de verão, são temporárias – os mandatos dos juízes expiram no final da próxima sessão do Congresso, em 30 de novembro. Depois disso, Lijo e García-Mansilla precisarão obter aprovação do Senado para permanecer no cargo.
No entanto, os críticos questionaram o que consideraram uma estratégia implacável para lotar a mais alta corte com aliados leais, dizendo que um presidente tem poder limitado para fazer nomeações judiciais durante um recesso do Congresso.
“Os decretos são para uso restrito e não podem ser usados como uma simples alternativa aos procedimentos regulares previstos pela constituição”, disse o advogado constitucionalista Andrés Gil Domínguez.
Quando são usados para outros fins, ele acrescentou, “a ordem constitucional e os direitos do povo estão em sério perigo.”