19 de janeiro de 2025

Motorista que atropelou e matou Marina Harkot alega estar com dengue e Justiça suspende júri popular marcado para esta quinta

Julgamento de José Maria da Costa Júnior deveria ocorrer nesta quinta (20) em SP. Por causa da doença do réu, juíza escolherá nova data para júri do empresário. Ele é acusado de beber, dirigir em alta velocidade, atropelar, fugir e matar a ciclista em 2020. Homem responde crime em liberdade. Motorista José Maria fugiu após atropelar e matar a ciclista Marina Harkot em São Paulo
Reprodução/Arquivo pessoal
A Justiça de São Paulo suspendeu o julgamento do motorista acusado de beber, dirigir em alta velocidade, atropelar, fugir e matar a ciclista e socióloga Marina Kohler Harkot em 8 de novembro de 2020. O empresário José Maria da Costa Júnior alegou, por meio de sua defesa, que está com dengue desde terça-feira (18).
O júri popular do caso estava marcado para esta quinta-feira (20) no Fórum Criminal da Barra Funda, na Zona Oeste da capital. Mas “ciente da impossibilidade de comparecimento do réu por questões de saúde”, escreveu nesta quarta-feira (19) a juíza Marcela Raia de Sant’Anna, da 5ª Vara do Júri, o julgamento não ocorrerá.
A magistrada vai escolher nesta quinta qual será a nova data do júri. O réu responde em liberdade. O advogado dele, José Miguel da Silva Júnior, informou à Justiça que seu cliente terá de ficar em repouso por seis dias após ter sido diagnosticado com dengue num hospital em Socorro, interior paulista, onde ele mora.
“Além do mais, conforme atesta a receita médica […] o quadro clínico do acusado o impossibilita de estar presente no julgamento”, alegou a defesa do motorista.
“Coincidentemente ou não ele é diagnosticado com dengue na véspera do julgamento”, disse o promotor Rodolfo Morais à reportagem. Ele é o representante do Ministério Público (MP) responsável por acusar José Maria por homicídio por dolo eventual, quando se assume risco de matar. O motorista também é acusado de dirigir sob efeito de álcool e fugir do local sem prestar socorro à vítima.
Marina tinha 28 anos e estava pedalando de bicicleta quando foi atingida pelo Hyundai Tucson dirigido pelo empresário José Maria da Costa Júnior, atualmente com 35. O caso foi filmado por câmeras de segurança (veja abaixo) e repercutiu na imprensa e nas redes sociais, dando origem a protestos de quem usa a bicicleta como meio de transporte.
‘A falta dela é todo dia’, diz mãe, que espera há 2 anos julgamento de motorista
A data do julgamento foi marcada na semana passada pela juíza Marcela Raia de Sant’ Anna, da 5ª Vara do Júri. O júri será realizado no Plenário 3 do Fórum Criminal da Barra Funda, também na Zona Oeste. E deverá durar dois dias, segundo a magistrada.
Defesa de réu quer suspender júri
Câmera registra carro que atropelou ciclista na Zona Oeste de SP em alta velocidade
“Eu já arrolei as minhas testemunhas, mas só que tem um recurso pendente no STJ [Superior Tribunal de Justiça], em Brasília, no qual peço que a reclassificação do crime de homicídio por dolo eventual para homicídio culposo, sem intenção de matar”, disse nesta segunda-feira (23) ao g1 o advogado José Miguel da Silva Júnior, que defende o motorista.
O advogado também disse que irá entrar com um pedido de liminar no Tribunal de Justiça de São Paulo (TJ-SP) pedindo que o júri do caso, marcado para junho de 2024, seja suspenso temporariamente até que o recurso no STJ seja julgado.
Ele chegou a fazer o mesmo pedido de reclassificação do homicídio para o TJ em 2022. Mas os desembargadores não concordaram e mantiveram o caso como homicídio por dolo eventual. Com a negativa, José Miguel recorreu ao Superior Tribunal de Justiça.
Marina Harkot: TJ-SP mantém decisão de levar motorista a júri popular por homicídio por dolo eventual
Crimes dolosos contra a vida são julgados em júri popular: sete jurados escolhidos pela acusação e defesa votam e decidem se condenam ou absolvem os réus. A defesa queria a mudança para seu cliente não ir a julgamento popular. Além disso, em caso de condenação, as penas para motoristas acusados de homicídio por dolo eventual podem chegar a 20 anos de prisão em regime fechado.
Nos homicídios culposos na direção de veículos, os réus são julgados por um juiz ou juíza singular e as penas costumam ser de 2 a 4 anos de reclusão, podendo ser também em regime aberto.
Segundo o advogado, a Polícia Civil, que investigou o caso, não apresentou laudos periciais que comprovem que José Maria bebeu ou dirigia em alta velocidade quando atropelou Marina.
Seu cliente alega não parou o veículo para socorrer a vítima porque achou se tratar de um assalto. De acordo com a defesa, a ciclista ainda pedalava fora da ciclovia e também não usava equipamentos de segurança. José Maria não foi encontrado pela reportagem para comentar o assunto.
Advogada e família da vítima
Paulo Garreta Harkot e Maria Claudia Kohler, pais de Marina Harkot, visitam local onde filha foi atropelada e morta por motorista embriagado que fugiu em 8 de novembro de 2021
Denis Ferreira Netto/@denisfotos/Divulgação
“É demorado, mas a família segue agora com menos angústia. Conforme já era esperado o réu vai ser submetido ao Tribunal do Júri porque é um crime doloso contra a vida”, disse a advogada Priscila Pamela Santos, que defende os interesses da família de Marina, sobre a decisão da Justiça de marcar o júri do caso para junho de 2024.
“Acreditamos que esse julgamento é muito importante para que seja dada a visibilidade necessária e punição aos sinistros deste tipo: morte de ciclistas por motoristas bêbados e em alta velocidade. A responsabilização desses crimes precisa ser efetiva e com penas justas. Tirar a vida de qualquer pessoa não é uma normalidade. Todos têm direito de se locomover nas cidades como desejarem e o maior, no caso um carro, tem que proteger o menor, no caso o ciclista”, disse a bióloga Maria Claudia Kohler, mãe de Marina Harkot.
“A vida da minha filha é muito valiosa, uma pessoa jovem que contribuía com pesquisas e muitos temas importantes na nossa sociedade. Ela ainda teria uma vida plena pela frente, com sonhos e projetos que foram abruptamente interrompidos. Por isso a importância deste julgamento. Devemos mobilizar a sociedade e educar os os motoristas. Esse caso é mais um das dezenas que ocorrem no Brasil diariamente. Queremos justiça para todos aqueles que tiveram suas vidas interrompidas. E por isso não vamos desistir e vamos sim seguir nessa luta”, completou Claudia, como é conhecida.
Aos 59 anos, ela e o marido, o oceanógrafo Paulo Garreta Harkot, de 63 anos, pai de Marina, decidiram tornar os desejos de sua filha seus sonhos também. O jornalista Felipe Burato, de 41 anos, viúvo de Marina, também participa do projeto Pedale como Marina.
Além de buscarem justiça e pedirem a condenação do atropelador que matou a ciclista, eles têm participado de atos, palestras e buscado conscientizar as pessoas da necessidade de educação e regras para a convivência pacífica entre bicicletas e veículos motorizados no trânsito.
De acordo com o Observatório da Impunidade no Trânsito (OIT), que surgiu do movimento Pedale como Marina, em 2020, quando Marina foi atropelada, 33 ciclistas morreram atropeladas naquele ano na capital paulista. E até agosto de 2023, já eram 21 mortes nas mesmas circunstâncias.
Amigos de réu foram omissos
Motorista José Maria da Costa Júnior fugiu após atropelar e matar a ciclista Marina Harkot com seu Hyundiai Tucson em São Paulo; no detalhe, o vidro estilhaçado pelo impacto
Reprodução/Câmera de segurança/TV Globo e Arquivo pessoal
Os amigos do motorista José Maria, que estavam de carona no carro do empresário quando Marina foi atingida pelo veículo, serão ouvidos como testemunhas no julgamento do caso.
A estudante Isabela Serafim e o auxiliar de escrevente de cartório Guilherme Dias da Mota, ambos de 22 anos, respondiam a outro processo: por omissão. Eles não prestaram socorro à vítima quando ela foi atropelada. Os dois respondiam ao crime em liberdade.
Mas como Isabela e Guilherme aceitaram a proposta de transação penal feita em março deste ano pelo Ministério Público, eles não serão mais responsabilizados criminalmente. Para isso aceitaram pagar, cada um, pouco mais de R$ 6 mil ao Fundo Municipal da Criança e do Adolescente (Fumcad). Desse modo o processo contra eles foi arquivado.
O g1 não conseguiu localizar as defesas de Isabela e Guilherme para comentarem o assunto até a última atualização desta reportagem.
Motorista bebeu, dizem testemunhas
Claudia e Paulo Harkot, pais de Marina, homenageiam em 2021 a filha [foto atrás deles] no local onde ela foi atropelada e morta em São Paulo
Kleber Tomaz/g1
Quando falaram no 14º Distrito Policial, em Pinheiros, Isabela e Guilherme disseram que José Maria havia tomado bebida alcoólica no bar e depois dirigiu. Os dois, no entanto, alegaram que não viram o atropelamento.
Segundo a Polícia Civil, José Maria tomou bebida alcoólica momentos antes de dirigir seu carro e atropelar Marina. Vídeos de um bar registram que ele estava bebendo (veja foto abaixo). A comanda do estabelecimento informa que o motorista tomou uísque.
De acordo com o Ministério Público, o réu ingeriu bebida alcoólica e dirigiu seu Hyundai Tucson em alta velocidade quando atingiu a ciclista. Dentro do veículo, levava os amigos Isabela e Guilherme. Marina foi atingida pelas costas quando voltava de bicicleta sozinha para casa pela Avenida Paulo VI, em Pinheiros. Segundo a família, ela morreu no local.
No detalhe: José Maria aparece em bar na Zona Oeste de São Paulo momentos antes de atropelar e matar Marina Harkot
Reprodução/Câmera de segurança

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