Grupo foi alvo da ‘Operação Salus et Dignitas’, que desbaratou várias redes criminosas na região da Cracolândia no início de agosto. Os denunciados usavam a comunidade para guardar e vender entorpecentes, captação de sinais de rádios das policiais e prática os tribunais do crime. Favela do Moinho, localizada na região do Bom Retiro, Centro de São Paulo.
Reprodução/TV Globo
O Ministério Público de São Paulo (MP-SP) denunciou nesta segunda-feira (19) mais onze pessoas por crimes de organização criminosa, tráfico de drogas, violação de comunicação radioelétrica e lavagem de capitais logadas à facção criminosa Primeiro Comando da Capital (PCC).
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Os acusados tinham como base de suas atividades ilícitas a Favela do Moinho e já tinham sido presos durante a megaoperação Operação Salus et Dignitas, que desbaratou várias redes criminosas na região da Cracolândia, Centro da capital paulista.
Segundo os promotores do Grupo de Atuação Especial de Combate ao Crime Organizado (GAECO), os denunciados usavam a Favela do Moinho para guardar e vender entorpecentes, dissimulando a origem de recursos obtidos com o tráfico, captando sinais de rádios transmissores das forças policiais e colocando em prática os tribunais do crime dentro da comunidade.
Entre as empresas usadas pelo esquema criminoso com o objetivo de lavar dinheiro do tráfico estavam um hotel, um restaurante, uma concessionária de automóveis e um ferro-velho da mesma região da Luz, onde fica a chamada Cracolândia.
Na semana passada, os promotores do GAECO já tinham oferecido duas denúncias também no âmbito da Operação Salus et Dignitas, imputando a outras nove pessoas a prática de crimes como organização criminosa, comércio ilegal de arma de fogo e concussão, o chamado crime praticado por funcionário público contra a administração estatal.
Entre os denunciados estão guardas civis metropolitanos e ex-GCMs acusados de montar uma milícia na região central, oferecendo serviços de segurança para comerciantes em troca de dinheiro.
Investigação da favela
Viatura policial sobre passarela da Favela do Moinho, na região central de São Paulo
Anselmo Caparica/TV Globo
A Favela do Moinho, comunidade localizada ao lado de linha da Companhia Paulista de Trens Metropolitanos (CPTM), na região central de São Paulo, abrigava a base de inteligência do PCC, equipada com detector de radiofrequência para ouvir as conversas operacionais da PM.
Segundo o Ministério Público, além de conseguirem informações antecipadas sobre operações policiais, o equipamento permitia que os criminosos controlassem a comunidade e punissem membros moradores e até membros da facção que descumprissem regras internas.
O local também era usado como depósito de armas e drogas do crime organizado.
Milícia na GCM
Forças de segurança realizam nesta terça-feira (6) uma operação na Cracolândia, região conhecida pela venda e pelo consumo de drogas no Centro de São Paulo.
A ação tem como alvo três guardas-civis metropolitanos e um ex-agente da Guarda Civil Metropolitana (GCM) suspeitos de integrarem uma milícia e dois traficantes de drogas investigados por venda de armas.
A investigação apura se a milícia da qual os agentes e o ex-agente da GCM são suspeitos de fazer parte tem extorquido dinheiro de comerciantes da região. Além disso, o casal de traficantes que estaria praticando venda ilegal de armas (leia mais abaixo).
A Operação Salus et Dignitas, iniciada por volta das 9h, é realizada em conjunto por Ministério Público (MP), Receita Federal, Polícia Militar (PM), Polícia Civil, Polícia Federal (PF) e Ministério do Trabalho e Emprego.
Promotores e policiais saíram às ruas para tentar cumprir sete mandados de prisão. Além dos guardas, do ex-guarda civil e dos traficantes, há um funcionário de uma empresa como alvo.
Chefe de facção preso
Até às 9h40, um dos alvos havia sido preso pelas forças de segurança. Trata-se de Leonardo Moja, o “Léo do Moinho”.
Ele é apontado como um dos chefes da facção criminosa Primeiro Comando da Capital (PCC) na Favela do Moinho, na região da Cracolândia. Em 2021 ele já havia sido preso pela polícia em Praia Grande, litoral paulista, por suspeita de homicídios, mas foi solto depois.
A operação pretende cumprir 117 mandados de busca e apreensão na capital paulista em endereços ligados aos investigados. A Justiça também expediu 46 de sequestro e bloqueio de bens e suspensão de atividade econômica de 44 prédios comerciais.
“Além da perda da licença, os imóveis serão lacrados pelas autoridades municipais para garantir que a atividade ilícita não volte a acontecer no local”, informa nota da Secretaria da Segurança Pública (SSP).
Como funcionava o esquema
MP e polícia fazem operação na Cracolândia para prender GCMs acusados de participar de milícia
Em um ano de investigação, promotores do Grupo de Atuação Especial de Combate ao Crime Organizado (Gaeco) do MP e policiais identificaram que a quadrilha se dividia em cinco grupos de atuação na Cracolândia:
Ferros-velhos: empresários são suspeitos de explorar mão-de-obra de dependentes químicos. Os usuários furtavam fios de energia da rede pública, deixando semáforos e postes sem luz, e trocavam o cobre presente neles por drogas. Nesses locais foram encontrados crianças e adolescentes participando desse comércio irregular;
Milícia de GCMs: GCMs, policiais militares e policiais são suspeitos de se articularem numa milícia para extorquir dinheiro de comerciantes em troca de proteção. De acordo com a investigação, o grupo chegou a conseguir cerca de R$ 6 milhões em propina no período de quase um ano;
Receptação de celulares: comerciantes libaneses são suspeitos de montarem um esquema de receptação de celulares roubados e furtados e depois revender as peças. Os celulares eram levados a eles por grupos criminosos como as ‘gangues da bicicleta’ (que usam as bikes para fugir depois de roubar e furtar telefones de pedestres);
Hotéis e hospedarias: rede de hotéis e hospedarias mantida pelo Primeiro Comando da Capital (PCC) que servem para armazenar drogas e abrigam até “tribunais do crime” (julgamentos internos da facção criminosa feitos por seus membros). Além disso, dentro deles acontecia a exploração sexual de mulheres que eram obrigadas a se prostituir para comprar drogas. Há denúncias da presença de menores de 18 anos de idade sendo exploradas. Um dos imóveis é conhecido como ‘prédio do sexo’ onde ocorria a exploração da prostituição.
O que dizem governador e prefeito
Agentes das forças de segurança se reúnem para tratar de operação contra milícia de GCMs e traficantes do PCC
Divulgação
Em postagem nas redes sociais, o governador Tarcísio de Freitas (Republicanos), que acompanhou a ação de dentro de um dos helicópteros da PM, não comentou sobre o envolvimento de servidores públicos, que atuam como milicianos e têm relação com crime organizado e são os principais alvos da operação.
Disse, apenas, que ação visa “devolver o Centro às pessoas”.
O prefeito da cidade de São Paulo, Ricardo Nunes (MDB), não se manifestou na sua rede social até a última atualização desta reportagem.
Em nota, a prefeitura informou que, “seguindo uma determinação do Prefeito Ricardo Nunes, solicitou, em junho de 2023, ao Ministério Público a prisão preventiva do guarda civil metropolitano Elisson de Assis. O pedido constou de notícia-crime protocolada ao GAECO. O processo foi arquivado pelo Ministério Público em janeiro deste ano, mas a Prefeitura continuou apurando as denúncias envolvendo o agente. O processo de expulsão de Elisson de Assis está concluído”.
A nota também diz que “Antônio Carlos Amorim Oliveira e Renata Oliva de Freitas Scorsafava já foram afastados e o processo de expulsão está em andamento. Rubens Alexandre Bezerra foi expulso da corporação em 31/07/2019”.
A respeito da operação, a prefeitura afirmou que “participou, com o governo do Estado e o próprio Ministério Público Estadual, de todas as discussões sobre a operação deflagrada nesta terça-feira (06) na região central da cidade. Foram quatro reuniões realizadas nos últimos dias, sendo duas delas com a presença do prefeito Ricardo Nunes, ao lado do governador Tarcísio de Freitas.
Além disso, secretários estaduais e municipais estiveram reunidos para discutir a atuação dos órgãos participantes da operação. A Prefeitura conta com cerca de 500 agentes nas ruas hoje prestando apoio e atendimento nas áreas de segurança, assistência social e saúde, além das equipes responsáveis pela interdição de imóveis alvos da operação”.
‘Ecossistema’ de crimes
Ação das forças de segurança para combater milícia de GCMs e presença de traficantes na Cracolândia
Giba Bergamim/TV Globo
Os investigadores apontaram que foi possível “qualificar a região central de São Paulo como um ecossistema de atividades econômicas ilícitas, no qual as organizações criminosas concorreriam para que o Primeiro Comando da Capital (PCC) exerça poder de influência e controle sobre a ocupação e exploração do território.”
O objetivo da operação é desarticular esses esquemas criminosos, que, na visão dos promotores, contribuem para perpetuar o fluxo (grupo de dependentes químicos que usam crack nas ruas).
A decisão do juiz Leonardo Valente Barreiros, da 1ª Vara de Crimes Tributários, Organização Criminosa e Lavagem de Dinheiro, estabelece um habeas corpus coletivo (salvo conduto) em favor dos dependentes químicos durante a operação. Quem portar até 20 pedras de crack ou estiver em situação de miséria não poderá ser preso em flagrante. O juiz afirma que isso visa proteger a dignidade humana.
Viatura policial sobre passarela da Favela do Moinho, na região central de São Paulo
Anselmo Caparica/TV Globo