Suspeita é que Ligiane ainda esteja fora do país. Defesa diz que solicitou a oitiva dela à polícia e chamou pedido de prisão de ‘prematuro’. Ligiane Marinho de Ávila, investigada pela Polícia Civil por suspeita de desviar verbas de pesquisa da Unicamp
Reprodução/EPTV
O Ministério Público Estadual (MP-SP) pediu à Justiça a prisão preventiva e a quebra de sigilo bancário da ex-funcionária da Unicamp, Ligiane Marinho de Ávila, suspeita de desvios milionários de verbas destinadas para pesquisas no Instituto de Biologia (IB) da Unicamp.
A funcionária foi demitida em janeiro da Fundação de Desenvolvimento da Unicamp (Funcamp), onde era responsável por auxiliar os pesquisadores na gestão das verbas, quando as suspeitas vieram à tona. Desde então, é investigada pela Polícia Civil de Campinas e pelo MP-SP.
Os pedidos da Promotoria foram feitos na sexta-feira (30) após o delegado do caso indiciar a ex-funcionária por peculato, que é o crime de desvio de dinheiro público para proveito próprio. Durante o inquérito, Ligiane não foi encontrada pelos investigadores nos endereços dela no Brasil para prestar esclarecimentos.
Entenda suspeita de desvio milionário de verbas de pesquisa da Fapesp na Unicamp
A Promotoria de Justiça afirma no pedido que a decretação da prisão de Ligiane é necessária uma vez que ela, ao sair do país, buscou se ocultar para não responder pelos fatos pelos quais foi indiciada. O caso agora será analisado pela Justiça de Campinas.
À Polícia Civil, o advogado da suspeita pediu depoimento por videoconferência admitindo que ela está fora do país e não tem previsão de voltar ao Brasil. O g1 apurou, com fontes na Polícia Federal, que ela havia deixado o Brasil no dia 19 de fevereiro deste ano em um voo de Campinas (SP) para Orly, na França.
Ao g1, o advogado Rafael de Azevedo, que defende Ligiane, disse que por diversas vezes solicitou a oitiva da sua cliente, “todavia, não fora notificada para apresentar sua versão , assim não conseguiu esclarecer sobre os fatos”.
“Noutro giro, a solicitação do Ministério Público, no sentir da defesa é totalmente prematuro, pois a mesma jamais se eximiu da responsabilidade de apresentar sua versão, ressaltasse não fora oportunizada pela autoridade policial”, diz a nota da defesa.
Uma auditoria da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp) detectou cerca R$ 5 milhões em transferências à suspeita e apura o valor que de fato foi extraviado. Já a Unicamp constatou que, do dinheiro movimentado pela ex-funcionária, cerca de R$ 3 milhões foram extraviados das pesquisas.
Cobrança dos professores
Instituto de Biologia da Unicamp
Reprodução/EPTV
A Fapesp está cobrando de professores do Instituto de Biologia (IB) da Unicamp as verbas desviadas de pesquisas.
Mas se a suspeita é uma ex-funcionária da universidade, por que os professores estão sendo cobrados?
A Fapesp entende que era de responsabilidade dos professores (que também atuam como pesquisadores) monitorar o uso dos recursos uma vez que as verbas foram, do ponto de vista legal, concedidas pessoalmente a eles. Por isso, está cobrando deles o ressarcimento aos cofres públicos.
“Qualquer pagamento/transferência de valores oriundos desta Fundação apenas poderia ter sido realizado mediante senha do cartão BB Pesquisa, o que sugere que, no mínimo, teria havido negligência por parte dos pesquisadores quanto à obrigação de guarda desse código secreto”, disse a Fundação ao MP-SP.
Decisões da Justiça
Diante da cobrança de restituição dos valores, os professores do IB ingressaram com ações na Justiça alegando que a responsabilidade pelo reembolso é da Unicamp, uma vez que foi a universidade que colocou Ligiane dentro do instituto para operacionalizar a contratação de serviços e compras para as pesquisas.
Os processos foram sorteados para diversas varas da Justiça e correm sob sigilo a pedido do advogado dos pesquisadores, mas o g1 apurou que os juízes de Campinas têm emitido decisões divergentes.
Nos processos sorteados para a 1ª Vara da Fazenda Pública, o juiz tem concedido liminar aos pesquisadores suspendendo a obrigatoriedade dos reembolsos até o fim das investigações.
Já os juízes da 3ª e 4ª Varas da Fazenda Pública entenderam de forma diferente e negaram os pedidos de liminar dos pesquisadores e, com isso, autorizaram a cobrança dos valores desviados. Para esses magistrados, a responsabilidade pela verba era do pesquisador.
O que diz a defesa do pesquisadores?
Os advogados que representam os professores da Unicamp confirmaram que eles foram notificados a devolver os valores desviados “sob pena de bloqueio dos projetos em andamento”. Segundo eles, isso “afetaria as pesquisas em desenvolvimento no IB, além de bloquear a bolsa dos inúmeros estudantes pesquisadores”.
“Como os professores não são responsáveis pelo desvio, foi necessário recorrer ao Poder Judiciário, até mesmo para garantir a pesquisa e as bolsas dos alunos pesquisadores”, explicou a defesa dos professores.
“Destacamos que os pesquisadores sempre tiveram postura ativa para a solução do problema, descobriram os desvios, reportaram à autoridade policial, que instaurou inquérito policial com base na denúncia, e notificaram a Unicamp e a Fapesp para providências”, disseram os advogados.
O que diz a Fapesp?
Ao g1, a Fapesp informou que está recorrendo das decisões que suspenderam as cobranças de ressarcimento. “No que diz respeito a todos os pesquisadores envolvidos na questão, a Fundação continuará tomando as providências em juízo e seguirá cumprindo sua função em defesa do patrimônio público”, disse em nota.
O que diz a Unicamp?
Procurada, a Unicamp se limitou a dizer que “os fatos estão sendo objeto de apuração final, de forma criteriosa, em Sindicância Administrativa”. Diz ainda que “adotará todas as providências que se mostrarem cabíveis após sua conclusão”.
Verbas de 36 pesquisadores
Segundo a Fapesp, os R$ 5 milhões saíram de 75 destinações de verbas a 36 pesquisadores do IB diretamente para a ex-funcionária. O valor aferido foi informado pela Fundação ao Ministério Público Estadual (MP-SP), que investiga o caso no âmbito cível e criminal.
O trabalho de auditoria, no entanto, ainda não foi concluído pela Fapesp, que agora apura qual valor, desses R$ 5 milhões, foi efetivamente extraviado dos pesquisadores. Isso porque, Ligiane era a responsável por operacionalizar o pagamento de serviços e compras no IB e, em alguns casos, fazia a transferência para a própria conta para “agilizar o trabalho”.
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